sábado, janeiro 30, 2010
quarta-feira, janeiro 27, 2010
[aos 5 minutos]
24% Serviço Nacional de Saúde
19% Segurança Social
17% Juros Dívida Pública
9% Pensões
7% Autarquias
4%Contribuições
18% Despesas
______________
98% é diferente de 100%
eh pá... não sei porquê, mas sinto-me down. tenho de ir ouvir qualquer coisa mexida.
terça-feira, janeiro 26, 2010
segunda-feira, janeiro 25, 2010
[conversa ouvida no comboio]
...
- o meu miúdo amanhã num bai à iscola.
- tá doente, o catraio?
- náão bai ao dótor.
- intão, mas tá doente ou náão, mulher?
- bai ser óprado ós...
- ós olhos? num sabia que bia mal.
- náão. bai ser oprado aos... grões.
- hã?
- lá in baixo... tu sabes
sexta-feira, janeiro 22, 2010
Raul Seixas (o equivalente brasileiro ao nosso António Variações, ou vice-versa), aqui sem Paulo Doelho, felizmente:
Enquanto você
Se esforça pra ser
Um sujeito normal
E fazer tudo igual...
Eu do meu lado
Aprendendo a ser louco
Maluco total
Na loucura real...
Controlando
A minha maluquez
Misturada
Com minha lucidez...
Vou ficar
Ficar com certeza
Maluco beleza
Eu vou ficar
Ficar com certeza
Maluco beleza...
E esse caminho
Que eu mesmo escolhi
É tão fácil seguir
Por não ter onde ir...
Controlando
A minha maluquez
Misturada
Com minha lucidez
Eeeeeeeeuu!...
Controlando
A minha maluquez
Misturada
Com minha lucidez
Vou ficar
Ficar com certeza
Maluco beleza
Eu vou ficar
Ficar com certeza
Maluco beleza
Eu vou ficar
Ficar com toda certeza
Maluco, maluco beleza...
(Maluco Beleza, Raul Seixas)
- sim?
- boa tarde. eu estou a falar da XXX.
- sim.
- queria saber como se chama.
- está-me a telefonar da minha operadora para perguntar como é que me chamo?
- sim por favor.
- então... não sabe o meu nome? vocês não têm isso nas vossas bases de dados?
-... ah... é que... o seu número foi marcado à mão...
- à mão?
- chama-se YYYYY?
- sim, entre outros.
- obrigada
[e desligou o telemóvel. não fosse eu conhecer-me muito bem e saber que nem estou para pitonisa para me pôr aqui a adivinhar, nem para femme fatale e isto seria coisa de mulher enciumada]
hipócrates
antes e depois ou como desta ninguém se lembrou. Nem o próprio Chagall. Acho que nunca postei nada sobre o Chagall, mas isso deve ser porque não admiro substancialmente a obra dele. Estava à procura de imagens para ilustrar o "carteiro" sobre as limitações do Sabbath original que os judeus se impunham quando vi que esta imagem era muito parecida com
The Sabbath Rest
esta. Quer dizer, por acaso foi ao contrário. Esta é que era parecida com a de cima. "Ora porquê", foi o que pensei. "Porque é que o Chagall pinta tantas cenas que se relacionam com o judaísmo?", pensei eu, como se isso interessasse a alguém, o que não quer obrigatoriamente dizer que a coisa não era interessante. É interessante partindo do princípio que não sabia nada de Chagall. Muito bem: era judeu, nasceu numa família russa de origem judaica, tímido e gago, o que não é nada auspicioso. Em 1910 quando pinta este quadro já estava em Paris e parece que a mãe nunca lhe impôs limites à sua paixão pela arte, o que era uma raridade no seu tempo e tendo em conta a vida modesta que a família levava. Incentivou-o a entrar na escola de arte de São Petersburgo. Em Paris foi muito influenciado pelo Cubismo e pelas cores fortes do Expressionismo, pelo Orfismo de Delaunay, mas parece, pelo que li, que Chagall e Malevitch não se davam muito bem. Malevitch não lhe perdoava o figurativismo que era totalmente oposto aos princípios do Suprematismo e Chagall não lhe perdoava... que ele não o perdoasse. Quando vejo os quadros de Chagall (que confundo sempre com Matisse), lembro-me do Brueghel que dizia: pinta a tua aldeia e pintarás o mundo". Parece-me verdade: os quadros de Chagall estão repletos de figuras que parecem vindas directamente de uma lenda regional, que contam histórias típicas. Contam histórias da Rússia, do gueto, onde Chagall, como judeu viveu enquanto permaneceu na Rússia ou até do judaísmo hassídico. E com todas estas influências Chagall criou um estilo de uma pessoa só, não totalmente descritivo pois os seus quadros contam momentos, não descrevem o que os antecedeu, e criou as bases para o Surrealismo. Enquanto a pintura de Samuel Hirszenberg se chama Sabbath Rest, Chagall chamou-lhe apenas Sabbath, como se o descanso fosse sinónimo de Sábado e por isso, desnecessária a sua menção. Atente-se também na cena que muito deve a The Cafe Terrace on the Place du Fórum de Van Gogh na escolha das cores e no significado do tempo. Aqui as cores têm um papel muito importante, ou não fosse Chagall um expressionista extremamente influenciado, como vimos, pelas histórias da sua cultura e religião. Por isso as cores conferem ao quadro a dimensão espiritual que ele possui. Vejamos que há um foco luminoso (formado pelo candeeiro e pelas velas que se encontram em cima da mesa) que faz com que toda a cena se concentre ali, não obstante a presença de outras pessoas. O centro da sala com a mesa está destacada a vermelho e amarelo, cores quentes, enquanto o relógio na parede, a personagem mais à direita e a janela possuem cores que nos afastam desses pontos. Mas o que importa para Chagall são as personagens que se encontram à mesa a descansar, a orar ou simplesmente obrigadas a repousar por ser Sábado, e é nelas que está o espiritual do quadro. Nelas e no único objecto presente no quadro: o relógio que marca o tempo físico e o tempo psicológico, como se a sala estivesse toda em silêncio a ver passar o seu dia dedicado ao Senhor.
Samuel Hirszenberg por seu lado estava fixado na história dos judeus no mundo, sempre vistos como aqueles que deveriam ficar à parte e com os quais nenhuma religião se devia misturar. Os católicos, a meu ver misturaram-se mais com os muçulmanos pelo menos durante a divisão da Igreja em Católica do Ocidente e do Oriente do que com os judeus que, quer-me parecer faziam sombra à palavra do Deus católico. Era um pintor académico e a pintura que hoje mostramos não pode ser propriamente uma referência no mundo artístico: não tem profundidade, não tem tessitura. É o que o título diz: o típico Sabbath com mais velhos a descansar, os assim-assim a olhar e os doentes a "doentar" como mandava o Mizrá.
Marc Chagall
1910
hipócrates
em vez de fazermos aqui um top 10 das exposições de 2009 ou da década passada (já passou ou ainda vai passar?), o Belogue apresenta as exposições que você não vai querer perder (não querer perder, mas vai perder porque a vida está cara) neste ano de 2010 que já começou, mas que ainda é brindado com um "Bom ano" e com as Janeiras. Cá estão elas:
Por fim, a exposição homónima de Felix Gonzalez-Torres, Specific Objects without Specific Form, estará patente no WIELS Contemporary Art Centre em Bruxelas até 25 de Abril. Felix Gonzalez-Torres não foi muito conhecido e para além disso teve vida e obra breves. Os seus trabalhos essencialmente conceptuais são no entanto conhecidos: uma vela deixada para os visitantes dos museus, fotografias que mostram uma cama e duas almofadas, luzes brancas de Natal pela rua fora... Talvez o título da exposição diga mais sobre ela do que a própria: Objectos específicos sem uma forma específica, mas para já fica a garantia desta exposição ter um carácter itinerante e interactivo. Não é uma exposição terminada pois nos diferentes países um artista completará a mostra.
já vimos aqui como por vezes, dentro de um quadro há outro ou outros quadros. Hogarth, Velásquez e um outro cujo nome não me recordo, mas que sei que é muito importante (vou ver se me lembro). Mas o que não vimos, e ainda não tinha conseguido notar que isso poderia ser uma tendência, foi a presença de quadros nos grandes romances ingleses e franceses. O Belogue já tinha falado da presença de Vermeer em Proust, mas relendo umas partes notamos que para além de Vermeer, cuja selecção no contexto da obra coincide com o momento da morte de Bergotte, Proust fala de muitos outros autores como Botticelli (Cenas da vida de Moisés) quando descreve Odete de Crécy, Whistler (Vista de Trouville) quando descreve o seu quarto em Balbec e Manet (A Bunch of Asparagus) quando Proust fala de um serão em casa dos Guermantes, uma família aristocrática. Nessa altura a senhora de Guermantes que apreciava o local onde habitava, mas desdenhava as obras de arte e a decoração para se mostrar uma mulher de espírito e para que os outros valorizassem a sua casa referiu-se em tom depreciativo a uma das obras que estava na parede. Era o quadro a Bunch of Asparagus de Elstir (o pintor das relações de todos) que, segundo ela, havia imitado de Manet. Na realidade, Proust desenvolve uma história dentro da história e da História, uma vez que o quadro foi de facto pintado originalmente por Manet, mas a inspiração de trazê-lo até ao livro, até ao terceiro volume da Recherche foi o facto (penso eu) de uma das personagens da obra de Proust, Charles Ephrussi ter de facto existido. Este Charles Ephrussi foi um crítico de arte daquele tempo e, diz-se, a pessoa que posou para o Dejeuner sur l’herbe. Foi também a pessoa (não a personagem porque este relato não surge no livro, mas na História) que ao ver o quadro de Manet gostou tanto dele que deu ao pintor mais 200 francos para além dos 800 pedidos. Manet acabou por vender-lhe o quadro e pintou um outro de um só espargo, que vemos aqui e que ele fez acompanhar de um bilhete dizendo mais ou menos isto : «Faltava um espargo do molho que levou ».
Edouard Manet
1880
Wallraf-Richartz Museum, Colónia
Manet
Bunch of Asparagus
1880
Wallraf-Richartz Museum
Correggio
The Adoration of the Child
1518-20
Galleria degli Uffizi, Florença
“The horses of both guests were brought forth; and they mounted, in order to depart in company. The host and hostess stood in the doorway, to see them depart. The landlord proffered a stirrup-cup to the elder guest, while the landlady offered Peveril a glass from her own peculiar bottle. For this purpose, she mounted on the horse-block, with flask and glass in hand; so that it was easy for the departing guest, although on horse-back, to return the courtesy in the most approved manner, namely, by throwing his arm over his landlady's shoulder, and saluting her at parting.”
terça-feira, janeiro 19, 2010
segunda-feira, janeiro 18, 2010
e por ele andava louca,
pra ser sua mulher
um diiiiiia... (livra, Mónica Sintra!)
afinal havia outra
uma família, um lar uma caaaasa (no Afeganistão)
eu era afinal de contas
o photoshop das horas vagas (chuiff, chuiff)]
sexta-feira, janeiro 15, 2010
I feel you
Your sun it shines
I feel you
Within my mind
You take me there
You take me where
The kingdom comes
You take me to
And lead me through
Babylon
This is the morning of our love
It's just the dawning of our love
I feel you
Your heart it sings
I feel you
The joy it brings
Where heaven waits
Those golden gates
And back again
You take me to
And lead me through
Oblivion
This is the morning of our love
It's just the dawning of our love
I feel you
Your precious soul
And I am whole
I feel you
Your rising sun
My kingdom comes
I feel you
Each move you make
I feel you
Each breath you take
Where angels sing
And spread their wings
My love's on high
You take me home
To glory's throne
By and by
This is the morning of our love
It's just the dawning of our love
(I Feel You, Depeche Mode)
[No comboio a fazer de conta que não estava a ouvir a conversa ao telemóvel do senhor que estava à minha frente:]
-És tu?
-…
-Quem és tu?
-…
-Eu bi que tu tinhas amándado uma mensage e fiquei assim co’a pulga atrás d’órelha?
-…
-E cumé que sabias o meu nunbro de télemobe?
-…
-E a gente póde-se incontrar?
-…
-Pode ser hoje? Mas eu num sei onde moras. Cumé queu sei qués tu?
-…
- Cume que sabes isso de mim?
-…
- Ai num digas isso queu inté fico inbergonhádo!
-…
- Num me chames fofo queu fico inbergonhado. É berdade que sou! E tu és bonita?
-…
- Intão bou aí ter agora.
-…
- Tába no cumboio, mas bou sair aqui e bou apanhar outro prá’i. Espera por mim. Fofinha!
Diz-se que este quadro não é da autoria de Friedrich pois nesta época a técnica que mais utilizava era o desenho a sépia e que por isso este pode não ser um quadro dele, mas de um estudante. Quero crer que não existiam naquele tempo duas pessoas com ideias que dessem tantos arrepios na espinha e que por isso, bastava um Friedrich, mas a tese se non è vero, è ben trovato!
E um dia, ao passear virtualmente pelos lugares de eleição, encontrei os trabalhos de Peter Callesen que merecia, não um, não dois, não três estalos e um mortal encarpado à retaguarda, mas duas facadas nas mãos para aprender a não humilhar os pobres assim. Ide lá pastorinhos, ide, e fiquei como eu, perplexa perante as maravilhas do senhor (Peter).
Caspar David Friedrich
Wreck in the Sea of Ice
1798
Kunsthalle, Hamburgo
Peter Callesen
Eismeer
2006
Este é o dia que o Senhor fez (áléluia, áááléluuuuia) ou "mais vale uma mão inchada que uma enxada na mão":
Este é um post de elogio ao descanso por isso já sabem, se estiverem cansados... não leiam. Estava eu "cácomigo" quando ouvi uma história sobre as proibições de trabalhar ao Sábado. Sei que os adventistas descansam ao Sábado, mas quem não descansa ao Sábado também não fica proibido de trabalhar. Ou seja, o descanso divino dado aos mortais, pensava eu, era uma opção, uma oferenda. Quem quisesse descansava, quem não quisesse, descansava. Mas por aquilo que li, quando a lei foi concebida o povo judeu levantou muitas dúvidas sobre o que podia ser considerado descanso e aquilo que era trabalho, uma vez mesmo o que fosse uma actividade de relaxamento, como um banho, implicava trabalho, como aquecer a água.
Tudo começou nos Génesis quando Deus, depois de criar as plantas, o Dia e a Noite, a Água e a Terra, o homem e a mulher, descansou (E abençoou Deus o dia sétimo, e o santificou; porque nele descansou de toda a sua obra que Deus criara e fizera). E como é que descansava Deus? Depois de um trabalho destes deve ter sido um grande descanso! Ou será que Deus, por temer a ociosidade foi comedido no seu descanso. Na comunidade judaica o descanso divino levantou muitas dúvidas até porque esta não é a única passagem bíblica onde se fala do Sábado e do descanso. No Êxodo voltamos a encontrar-lhe duas referências: E ele disse-lhes: Isto é o que o SENHOR tem dito: Amanhã é repouso, o santo sábado do SENHOR; o que quiserdes cozer no forno, cozei-o, e o que quiserdes cozer em água, cozei-o em água; e tudo o que sobejar, guardai para vós até amanhã(Êxodo 16; 23) e Seis dias se trabalhará, porém o sétimo dia é o sábado do descanso, santo ao SENHOR; qualquer que no dia do sábado fizer algum trabalho, certamente morrerá. E mais tarde, no Deuteronómio (5; 14) encontramos isto: "Mas o sétimo dia é o sábado do SENHOR teu Deus; não farás nenhum trabalho nele, nem tu, nem teu filho, nem tua filha, nem o teu servo, nem a tua serva, nem o teu boi, nem o teu jumento, nem animal algum teu, nem o estrangeiro que está dentro de tuas portas; para que o teu servo e a tua serva descansem como tu". Como vemos, para além de ser proibido aos homens trabalhar, também era proibido fazer os animais trabalharem e todos os que trabalhassem seriam castigados. Tudo isto começou devido a alguns atropelamentos ao Sábado enquanto dia de descanso que os judeus não respeitaram principalmente durante o exílio como vemos em Ezequiel: Mas a casa de Israel se rebelou contra mim no deserto, não andando nos meus estatutos, e rejeitando os meus juízos, os quais, cumprindo-os, o homem viverá por eles; e profanaram grandemente os meus sábados; e eu disse que derramaria sobre eles o meu furor no deserto, para os consumir, até que profetas como Ezequiel começaram a manifestar-se contra esta nova forma de viver a religião. Era até comum, antes do período da Restauração, não se respeitar quer dia, quer noite de Sábado e coube aos profetas, através da palavra, restabelecer a ordem das coisas como nos conta Neemias (13; 15 a 22).
Samuel Hirszenberg
The Sabbath rest
1894
Os mesmos profetas conseguiram criar uma tendência generalizada na sociedade judaica que proibia e reprovava o trabalho nos Sábados. De uma visão que se pretendia apenas moral, foi possível criar um corpo teórico de proibições, variações e respectivos castigos para cada um dos trabalhos. O Mikrá fala do conceito de trabalho para os judeus. Aos Sábados, segundo o Mikrá os judeus não podiam: acender o fogo (mas também não podiam apagar ou avivar o fogo), tecer (e quando se diz tecer, diz-se tecer dois fios. A partir de dois fios - que é o mínimo - já não se podia tecer), preparar comida ou transportar objectos ou pessoas (ver aqui). Mas para alguns ortodoxos estas especificações não eram suficientes. Levantaram-se então questões como: curar aos Sábados era permitido, ou devia o médico deixar morrer? Mudar o assento de um sítio para o outro era transportar? E que se comia ao Sábado se não era possível cozinhar? Eis que surgiram as minudências. Cada uma daquelas 39 proibições da Mikrá tem sub-divisões. Por exemplo: era proibido escrever duas cartas, mas os judeus estavam autorizados a escrever uma por cada Sábado. Era possível carregar um objecto do peso de um figo, mais já era uma violação da lei. O que quer dizer que quando um doente ou um moribundo que necessitava dos cuidados de um médico era levado no seu leito até ao curandeiro, estava a ser transportado e por isso, a transgredir: "Então os judeus disseram àquele que tinha sido curado: É sábado, não te é lícito levar o leito". Também não era permitido que o médico fosse ter com o doente, como nos conta Lucas (6; 7), nem que ao mesmo fosse prescrito um medicamento na sexta se este medicamento apenas começasse a fazer efeito no Sábado. Não era permitido colher uma espiga que fosse (Marcos 2; 23-24), ou mesmo cozinhar. Por isso às sextas, antes do Sol se pôr os judeus preparavam o alimento para o Sábado.
As proibições eram de tal forma meticulosas que, da comida que não era pura ou judeus podiam apenas comer o equivalente a um azeitona. E chegou-se a este ridículo: uma pessoa podia comer o equivalente a meia azeitona, vomitar e comer novamente o equivalente a mais meia azeitona e isto constituía crime segundo o Mikrá. Tudo porque o paladar ao todo provou comida do tamanho de uma azeitona. A carga transportada, como vimos podia ser do peso equivalente a um figo. Mas se uma pessoa transportasse peso equivalente a meio figo, colocasse num local e depois o retirasse de lá, isso não constituía crime pois o corpo pegou sempre em "meio figo". Não era permitido levar nada de um local público para um local privado ou vice-versa. Mas para desespero vosso, não havia uma definição daquilo que era o público: o mar, um metro de terra ao lado de uma propriedade, um vale... Pior: o que podia acontecer a uma pessoa que transportasse um objecto com peso equivalente ao de meio figo de um local público para um privado (ou ao contrário), duas vezes? Estas duas acções combinadas eram crime? E por qual dos dois deveria o judeu ser condenado? Se um objecto que devia ser usado à frente caísse para trás, ninguém estava a incorrer em erro pois era a acção do vento que o determinava. Mas se o mesmo objecto caísse para a frente havia crime pois esse movimento era provocado pela acção humana. Se um judeu apanhasse a água da chuva, não estava a pecar, mas se apanhasse a água da chuva que caiu de uma caleira, então estava a pecar. Um professor não podia permitir aos seus alunos que lessem se ele próprio olhasse para o livro, o que me leva a pensar que isto é um exagero pois ninguém devia ter aulas ao Sábado.
As mulheres não podiam olhar-se ao espelho pois se vissem um cabelo branco sentiriam o impulso de tirá-lo, o que constituía falha. Mas os homens não podiam usar qualquer instrumento para ver pois isso era indigno (fosse em que dia fosse). Uma mulher podia andar na rua e em casa com cabelo falso, mas um homem não podia andar com um sapato sequer que tivesse sido confeccionado pela mão humana. Muito se discutia se a tira de uma sandália deveria ser arranjada ao Sábado. A resposta é não. Era apenas possível colocar lá o suficiente para conseguir caminhar com a sandália nesse Sábado. Tudo o resto era "melhorar" a sandália, implicava trabalho e movimentação e isso não era permitido.
A dada altura as restrições não existiam para restabelecer a fé e a ordem espiritual - não há nelas nada de espiritual - mas apenas para regular um conjunto de minudências que, quando não cumpridas, permitiam aos vizinhos acusarem-se mutuamente.
em 1972 Geoffrey Hoyle achava que 2010 seria assim:
em 2010 achamos que o passado será assim:
e que tal viver o presente, hã?
quarta-feira, janeiro 13, 2010
segunda-feira, janeiro 11, 2010
Há uns anos, depois do 25 de Abril, quando Mário Soares era Primeiro-Ministro disse uma vez qualquer coisa como isto: é preciso salvar o nosso Nabeiro referindo-se, claro está a Rui Nabeiro, o empresário de Campomaior. Vivia-se um período em que a fuga aos impostos estava a ser posta a descoberto e muitos que passavam a sua mercadoria de forma ilegal viam-se ameaçados. Rui Nabeiro, ao que consta era um deles. Diz-se até que uma vez se denunciou propositadamente, dizendo que pela estrada X ia passar mercadoria ilegal, quando ao mesmo tempo, o grosso de todo o material estava a passar pela estrada Y.
Ora isto fez-me lembrar, não sei bem porquê, mas já digo, o caso Face Oculta. Godinho é o “elo mais fraco” da cadeia, se é que isto é cadeia porque também já ouvi falar em polvo. Era sabido que tinha enriquecido muito, mas muito mais do que aquilo que um negócio de sucata, por melhor gerido que fosse, poderia enriquecer. Era sabido também que tinha a conivência do poder local uma vez que não houve consequências do seu negócio de ananases. [Godinho pediu à Câmara um terreno para plantar ananás, terreno esse que lhe foi concedido. Uma vez na sua posse, a frente do terreno foi preenchida com ananases e na parte de trás Godinho enterrava sucata.] Também era sabido que não primava nem pelo bom gosto, nem pela inteligência: a casa junto da praia que adquiriu havia pertencido a um habitante de Ovar que cometeu o mesmo crime pelo qual Godinho está agora a ser acusado. Portanto, se a sociedade não te molda, as casas moldam-te. E sabe, quem já provou o robalo de Ovar, desculpem, o Pão-de-Ló de Ovar que o que Godinho oferece a Vara num parque de estacionamento, dentro de um saco de papel, não é nada mais que Pão-de-Ló que Godinho, por ser diabético, não pode comer.
Tendo o direito ao ónus da prova, Godinho é, até que se prove o contrário, inocente, tal como Vara. O espanto não está na negação das acusações ou nas minudências dos valores. Está na forma como as pessoas, principalmente os habitantes de Esmoriz de onde é natural, trataram Godinho e os que o acusavam: [O Fortuna de Carl Orff, maestro] um homem forjado na pobreza, no suor e no trabalho. Um exemplo. Um benemérito para o clube. Um homem disposto a ajudar quem pedia. A meu ver, um homem que dá uma infinitésima parte daquilo que tem, não é um benemérito. É um homem que… dá uma infinitésima parte daquilo que tem. Um benemérito, quando faz bem, ninguém sabe. Um benemérito não dá o que tem, dá o que não tem ou o que lhe faz falta. Por isso me espantou ver notícias como esta. E que também me entristece quando penso no estado em que se encontra a nossa estatuária urbana, entregue à opinião do povo moldado pelos periódicos e pelas parangonas. Ainda se pensa que não interessa que alguém seja corrupto desde que contribua sempre que lhe é pedido, vá à missinha, não esqueça a terra onde nasceu e beije a testa da mulher.
sábado, janeiro 09, 2010
"Art has to move you and design does not, unless it's a good design for a bus." -David Hockney
quinta-feira, janeiro 07, 2010
- Ei Ofélia! Tá-se?
- Tá tudo e vocês, onde vão?
- Vamos comprar gelados. Queres vir?
Frederic Bazille
Summer Scene
1869
Fogg Art Museum, Cambridge, Massachusetts
- Não. A água está boa. Vão lá, eu depois vou.
- Tens a certeza? Olha que vais ficar engelhadinha!
- Nã… A água está mesmo boa!
- Tá-se! Tamos no ir. Queres alguma coisa?
- Não. Tá-se bem.
- ...
Millais
Ophelia
1851-52
Tate Gallery, Londres
- Ei Ofélia!
- Diz! Ainda não foram? Já disse que não quero nada! Mas quem é que está aí?
- Sou eu.
- Desaparece miúdo.
- A água está boa, não está?
- Está, desaparece.
- Está quentinha, não está.
- Simmm…
- Pudera, eu fiz xixi!
terça-feira, janeiro 05, 2010
A long December, and there's reason to believe
Maybe this year will be better than the last
I can't remember the last thing that you said as you were leavin'
Now the days go by so fast
And it's one more day up in the canyon
And it's one more night in Hollywood
If you think that I could be forgiven....
I wish you would
The smell of hospitals in winter
And the feeling that its all a lot of oysters, but no pearls
All at once you look across a crowded room
To see the way that light attaches to a girl
And it's one more day up in the canyon
And it's one more night in Hollywood
If you think you might come to California...
I think you should
Drove up to Hillside Manor sometime after two a.m.
And talked a little while about the year
I guess the winter makes you laugh a little slower,
Makes you talk a little lower about the things you could not show her
And its been a long December, and there's reason to believe
Maybe this year will be better than the last
I can't remember all the times I tried to tell myself
To hold on to these moments as they pass
(...)
(A Long December, Counting Crows)
o meu nome é Beluga. Se eu podia viver sem o Belogue? Podia, mas não era a mesma coisa.
La Baie des Anges
1963
Steven Klein
Blame it on Rio
2009
Jacques Remy
La Baie des Anges
1963
Steven Klein
Blame it on Rio
2009
Van Gogh
Fifteen Sunflowers in a Vase
1888
National Gallery, Londres
“Vamos morar para Espinho, junto ao mar”. O meu bisavô voltava de mais um dos seus périplos laborais como maquinista da CP o que lhe permitia um conjunto de regalos da carne e do espírito, alguns conhecidos outros não. À frente na máquina conduzia os destinos dos passageiros adormecidos com os bilhetes embolsados, sandes de torresmos e tachinhos de batatas solteiras, que se aventuravam pelo país em busca de companhia para as ditas a partir de Vila Nova da Barquinha. O meu bisavô, que Nosso Senhor conserve sempre assim como nunca lembro pois não tive o prazer de com ele privar, houvera passado por Espinho e teria achado algum encanto à vivência junto ao mar e talvez relativizado o cheiro da maré baixa junto às pedras do paredão onde os mariscos botavam crescedura. Minha bisavó chorou: dois filhos deitados ao Mundo, vida posta na cidade, amigos, a rotina habituada, a vidinha da Igreja, os nomes e as visões… tudo isso em troca do mar sargacento de Espinho, como ela achava que iria ser. Já se imaginava Ofélia marafona a flutuar sem sopro de vida numa pequena poça de mar fora dos roteiros infantis, com a bênção de Cristo que muito penou e que não deixaria tal mulher sofrer tamanha dor, ela que sempre lhe limpou os pés da imagem pascal e que lhe ruminava um rosário diário enquanto desfiava as malhas do tricot…
Meu avô, de egrégia graça Afonso, foi instruído no mester de seu pai, que era carinhosamente tratado por “paizinho”, trabalhando de sol a sol nos caminhos de ferro portugueses, trabalho que só largou quando um dia, por obrigação governamental, teve de ceder lugar aos inexperientes face à inevitabilidade de algo chamado aposentação, que ele abominou até ao doloroso fim dos seus dias rematados por um cancro que lhe levou próstata, intestino e dignidade. A divisa aeróstata foi tomada como um insulto pela família dos “do ourives” (nome pelo qual era conhecida a família de minha bisavó, avó e mãe, até ao aparecimento das lojas de bijuterias), pois afinal o ofício carecia de experiência e muita preparação verbal somente dada com verdade de um pai para um filho. Tal como disse um dia a minha bisavó quando a minha mãe a confrontou com a chegada do Homem à Lua: “Ai menina, eles que brinquem lá em cima que um dia avariam tudo”. Conhecedora embora na ignorância do seu saber, minha bisavó, tratada pela família como “avozinha”, à semelhança das personagens masculinas de Dostoievsky, marcava assim o destino dos homens faltosos para com o devido respeito às normas sabiamente instituídas desde tempos imemoriais.
Os haveres foram empacotados e cambiados para a salgada morada salpicada pelo rebentar das ondas junto aos palheiros. Meu avô pôs-se homem entre as suas idas e vindas ferroviárias e nos entremeios travou conhecimento com minha avô, uma senhora de carnes protuberantes que passou a desenhar jóias para os “do ourives” até que a maternidade e a obesidade lhe tivessem levado a vontade de se dedicar à imaginação, optando assim por uma existência mais doméstica mas nem por isso mais pacífica. Botou ao mundo dez filhos e entre os paridos, seis morreram para deixar espaço no Mundo à primogénita dos sobreviventes: minha mãe. Minha avó desmultiplicava-se em várias aias imaginadas para manter a descendência nutrida, sadia, obedecida e crescida rapidamente como porcos que se querem engordados e prontos a deixar de fazer despesa em casa do carrasco. O tempo havia-lhe moldado as carnes moles e quentes em músculo duro e ao cabo de uns pares de anos, aquilo que era doçura e languidez transformou-se em ordem, rispidez e uma certa tendência para a autoridade em doses sobrenaturais, autoridade essa que se traduzia pelo acentuar de uma ruga que lhe descia da aba do nariz bárbaro até ao lábio superior e que se afundava sempre que mostrava desagrado com o asseio do lar, a pauta escolar da eterna infância que trazia atracada às saias e ao destino e a ausência de meu avô preocupado com a lide das máquinas e os horários e os passageiros e o arranjo da linha e o salário emagrecido face à iminência das tecnologias. As do ourives deixaram o labor mercê de um primo que à guisa de uma dívida de jogo foi depauperando o tesouro familiar até o deixar chupado como um maracujá engavetado.
Minha mãe que nessa altura da vida era perfeitamente dispensável por minha avó uma vez que dava despesa e não houvera atingido a idade de andar à jorna e adivinhando-se entre as duas fêmeas um duelo de malfeitorias pelo estranho e inexplicável efeito “Bispo de Fell” foi recambiada para casa de minha bisavó o que se diga, em prol de uma prosa que faça justiça às partes, o melhor que poderia ter acontecido às mesmas. Pela primeira vez na sua ainda curta vida, minha mãe recebia os calores e as ternuras de um beijo voluntário, de um agrado do corpo, de uma satisfação dos desejos que minha avó lhe negara por maldade para com aquela que era o rosto da sua obrigação de parideira ou talvez por incapacidade de lida com a sua meninice. O rosto de minha bisavó confunde-se com a imagem da sua generosidade e da generosidade de meu bisavô. Este trazia das suas viagens às duas senhoras da casa marmelada em cubinhos, bolachas recheadas, pelica, sapatos com sola de couro, bacalhaus e outras mordomias que só dois tipos de pessoas poderiam adquirir; os contrabandistas e os membros ilustres da sociedade. Meu bisavô não se encontrava em nenhuma das categorias, mas fazia com prazer o gosto à lambarice da criança e da bela esposa, que lá isso, minha bisavó sempre foi mesmo nas rugas e maleitas e desabafos do corpo que a levaram. Partiu em Paz e com a certeza que não sendo exactamente um exemplo de santidade pela sua mortalidade, era aquilo que hoje se pode aproximar de uma personagem divina em toda a sua beleza. Deixou a minha mãe a recordação de uma travessa de arroz doce que fazia invariavelmente no dia dos seus anos e bordava a canela com as iniciais M.R., em homenagem à aniversariante.
Nóssa! Eu tô até um pôco sem jeito pá falá isso pá ocês, num sabe? Seu num falá bem, disculpa eu, mais é qui eu tô na saudádji dji ppostá e acho que já nem sei mais como fáiz.Os investigadores descobriram – ou acham que descobriram – a razão pela qual Van Gogh cortou a orelha. Ao que parece não foi por ciúmes de Gaughin. No quadro Still Life with Drawing Board, Pipe, Onions and Sealing-Wax
Vincent Van Gogh
Still Life with Drawing Board, Pipe, Onions and Sealing-Wax
1889
Kröller-Müller Museum, Holanda
o que acontece se o pessoal não pagar:
O Ministério da Cultura de Itália (chamam-se Assuntos para a Cultura) lançou uma campanha para sensibilizar as pessoas para a necessidade de pagarem a entrada no Coliseu (12 euros) ou para verem o David do Miguel Ângelo. Como diz o anúncio: "Si non lo visit, lo portiamo, via."
A Vanity Fair publica agora (que oportuno!) fotografias de Tiger Woods tiradas há algums tempo por Annie Leibovitz.
o que acontecia se as nossas séries preferidas fossem posters:
só faltava aqui o Allô Allô, o Angels in America, o Will and Grace, o Sexo e a Cidade, o...