terça-feira, maio 28, 2019

não quero nada disto. 

quinta-feira, maio 23, 2019

- original soundtrack -

caso alguém tivesse dúvidas. 
leiam e ouçam agora; agradeçam no final. não têm de quê.

Oh, pedaço de mim
Oh, metade afastada de mim
Leva o teu olhar
Que a saudade é o pior tormento
É pior do que o esquecimento
É pior do que se entrevar

Oh, pedaço de mim
Oh, metade exilada de mim
Leva os teus sinais
Que a saudade dói como um barco
Que aos poucos descreve um arco
E evita atracar no cais

Oh, pedaço de mim
Oh, metade arrancada de mim
Leva o vulto teu
Que a saudade é o revés de um parto
A saudade é arrumar o quarto
Do filho que já morreu

Oh, pedaço de mim
Oh, metade amputada de mim
Leva o que há de ti
Que a saudade dói latejada
É assim como uma fisgada
No membro que já perdi

Oh, pedaço de mim
Oh, metade adorada de mim
Lava os olhos meus
Que a saudade é o pior castigo
E eu não quero levar comigo
A mortalha do amor
Adeus 

(Pedaço de mim, Chico Buarque e Zizi Possi)

terça-feira, maio 21, 2019

- o carteiro -


segunda-feira, maio 20, 2019

isto não é vida

terça-feira, maio 14, 2019

- o carteiro -

eu, esta semana (tooooda a semana)


segunda-feira, maio 13, 2019

- original soundtrack -


(Lord Knows, Best, Dirty Beaches)


Título: Os Pássaros
Ano: 2019
Intérprete: gaivotas e mais gaivotas
Realizador: não posso dizer
Cenário: não é cenário, é mesmo a vista da varanda
- o carteiro -

as linhas da beleza

em 2004 o Man Booker Prize foi atribuído a um livro cujo título é "A Linha da Beleza". Por ser uma excelente leitura, não vou divulgar muito. Direi apenas que o personagem principal (Nick Guest - o "Guest" não é casual), funda com um dos seus amantes uma revista dedicada à Arte, Arquitectura, Literatura… de nome Ogee. Ogee (não confundir com orgy, embora também pudesse ser tal é a quantidade de cenas de sexo e consumo de drogas no referido livro. A propósito, o autor está em Portugal no/na LEV) é também o nome da "curva da beleza", ou da "linha da beleza" enunciada por Hogarth no seu livro "A análise da beleza". Tratava-se de um tratado que pretendia compilar as várias concepções do gosto. Hogarth foi ridicularizado, mas muito resumidamente o que Hogarth diz é que há "uma linha específica a que adequadamente podemos chamar de linha da beleza". Em 1753, neste seu livro, Hogarth refere que a linha perfeita, a linha da beleza, é uma linha ligeiramente curva e que a sua construção parte de qualquer coisa como isto: uma linha diagonal e duas horizontais na extremidade. Na ligação entre a diagonal e as horizontais, desenha-se uma pequena curva, como que boleando as arestas. A linha não é um "S" tradicional, mas um "S" alongado.



Esta curva, que Hogarth considera o paradigma da beleza está presente nos arcos canopiais, nas ogivas - daí o nome ogee - do gótico, embora estivesse presente já antes, na arquitectura clássica (nas cornijas).  No caso dos arcos ogivais, a "linha da beleza" surge em confronto:
No entanto, as cornijas clássicas, como sabemos não são estanques; ou seja, o que define a ordem arquitectónica é tudo, da base ao capitel. E as cornijas têm as suas variações. Basta ver aqui. Este ponto é para mim importante, uma vez que esta "linha da beleza" não é sempre a mesma. Para Hogarth, é um "s" alongado, maneirista, enquanto que para o gótico é mais sinuosa. Eu acho que uma e outra não são a mesma coisa. Basta ver o auto-retrato do artista com o seu cão e reparar na "linha da beleza" no canto inferior esquerdo.  Hogarth não iria pintá-la e designá-la assim que desejasse que esta linha da beleza fosse mais rechonchuda:





















William Hogarth
The Painter and His Pug
1745
Tate Britain, Londres





 A caligrafia usa muito esta linha da beleza. Atente-se, por exemplo no seguinte:















Em quase todas estas letras manuscritas encontramos a "linha da beleza", aquela serpetinata de que Hogarth falava e que os gregos já conheciam e praticavam, mais na escultura do que na arquitectura (quer-me parecer) sob a forma de contraposto, e que o Renascimento transformou.






















E agora que temos um corpo nu acima, voltamos a Nick Guest e à "linha da beleza". Para Nick Guest a linha da beleza poderia ser vista no fundo das costas dos seus amantes, naquele preciso ponto em que a coluna revela uma nádega:
"O seu coração desatou a martelar quando chegou à curva ao fundo das costas; tentou dar às suas carícias um tom de massagem, um toque de método, quando as suas mãos se abeiraram da curva ascendente das nádegas de Toby, da cintura baixa e lassa do seu calção de banho".
(HOLLINGHURST, Alan. "A Linha da Beleza". Porto: Asa Editores, 2004. pág. 369)




A mim, não sei porquê, faz-me lembrar isto:
















Man Ray
Ingre's Violin
1924

quarta-feira, maio 08, 2019

- original soundtrack -

Rex, e não é o cão-polícia

sexta-feira, maio 03, 2019

- o carteiro -


quarta-feira, maio 01, 2019

- original soundtrack -















(…)
I never said I was deep, but I am profoundly shallow
My lack of knowledge is vast, and my horizons are narrow
I never said I was big, I never said that I was clever
And if you're waitin' to find what's goin' on in my mind
You could be waitin' forever, forever and ever
(…)

(I never said I was deep, Jarvis Cocker)
- o carteiro -

paz, pão, habitação, saúde, educação

de uns já falei (pão e saúde), de outros não. Acrescentaria "trabalho", mas nem vale a pena falar disso. Falo por isso da habitação. Depois de deixar a casa dos meus pais - nem sempre de forma definitiva pois os "tempos foram de coruja", vivi em várias casas e com gente muito diferente. A minha primeira casa era muito fria e partilhada entre mim, a Rita, a Jenny e a Paula e o Miguel que eram um casal de namorados. A Paula trabalhava à noite num bar e o Miguel… bom, ninguém sabia de que é que o Miguel vivia. Era um militante activo da Juventude Comunista, tão activo que trazia para a cozinha, quando nas noites de Inverno se cozinhava de anorak e se jantava de anorak, discussões sobre a superioridade moral do comunismo. A Jenny que era filha de imigrantes na Venezuela não se deixava ficar. O tipo por vezes perdia um bocado o "fio à meada" pois estava, frequentemente, sob o efeito de grandes "brocas". Um dia cheguei à cozinha e ele tinha transformado aquilo numa fábrica de "sabonetes". Só pensava na polícia. Como é que eu ia dizer à polícia que não sabia que no sótão da casa que habitava havia uma estufa de canábis e que tudo ali, não obstante os espanta-espíritos e o tye dye,  não cheirava a ganza, mas a incenso? É que nem disfarçava: logo à entrada havia um vaso! O Miguel devia estar sempre, mas mesmo sempre sob a influência do próprio produto. Devia ser para aperfeiçoá-lo. Um dia entrou no meu quarto, como um D. Sebastião envolto na sua própria nuvem de fumo, e disse: "sabes, o meu primo entrou aqui um dia destes e sentiu uma vibração estranha. tu tens algum segredo, alguma coisa que queiras que não se saiba?". respondi que sim, que tinha várias. várias coisas que não queria que nem ele nem o primo soubessem. porque uma pessoa tem de ter as suas coisas que não quer que ninguém, nem os primos de ninguém, saiba. Ele não ficou convencido e voltou à carga: "uma tragédia, um drama… uma tristeza". "Oh yeah" - "podes crer". Só me lembrava do Samba da Benção... Já me bastava ter de gramar com as sessões de musicais como o Moulin Rouge no computador da Rita. Não tinha coragem de lhe dizer que não gostava de musicais nem da Nicole Kidman… Nessa altura ía muito ao cinema. Papei "Dancer in the dark", "O Irreversível", "Habla com Ella"... Todas as quintas à noite. Trabalhava numa fábrica e dormia todo o fim-de-semana. Pelo menos tinha um…

Depois, não sei bem porquê, eu "mai-las" minha companheiras mudámos para outro apartamento não muito longe dali. Era um apartamento enorme, com uma ilha no centro do mesmo e na qual se localizava a cozinha. Era pois possível andarmos à volta da casa sem nos encontrarmos: "onde estás?", "estou na casa-de-banho", "na grande ou na pequena", "na pequena", "não saias daí". O meu quarto era o mais pequeno, mas tinha uma varanda que, segundo idealizei, seria para receber os amigos e tomar chá. Claro que isso nunca aconteceu. Limpar aquele apartamento era um suplício: uma tarefa a três e que demorava um dia. Porque nós éramos muito limpinhas. A senhoria era bastante faladora e era a Jenny, com a sua paciência de Job, quem lhe interpretava a caderneta da Caixa. Eram tantas rendas que a senhora, tal como o Miguel, também perdia o "fio à meada".
Foram tempos difíceis: a morte da Liliana, o Mestrado sem rumo e sem orientador, o final do estágio… até que cada uma seguiu a sua vida. A cidade deprimia-nos. Deixá-la deprimia ainda mais.

Até que surgiram outras oportunidades. Dizem que há "tempos de águia e de coruja". Os "de águia" nunca foram realmente "de águia", mas dava para esticar as asas e praticar o voo um pouco. Fui viver com mais 4 raparigas: a Liliana, a outra Liliana, a Mónica e a Rita (outra Rita). As duas Lilianas dormiam no mesmo quarto, eram estudantes e gostavam daquela fanfarronada das tunas e das serenatas. Lembro-me que uma delas pedia várias vezes ao namorado, ainda que indirectamente, que este lhe fizesse uma serenata. Um dia ele apanhou uma piela e lá lhe fez a vontade! A rapariga - que foi a primeira pessoa que conheci com um brilhante no dente - chorou. Como chorou! Para ela, aquilo era o pináculo da existência. Quando a Mónica saiu, entrou a Magda. A Magda, para além de trabalhar, estava a escrever a tese de Mestrado em Relações Internacionais - se não me engano - sobre algo muito interessante (que agora não recordo). Mas havia nela algo estranho. No dia dos meus anos, após cantarmos os parabéns e soprarmos as velas, após cortarmos o bolo e no meio da conversa, falou-se de desilusões "del corazón". E a Magda quebra. Começa a chorar "baba e ranho" e à medida que vai revelando mais e mais pega na faca usada para cortar o bolo e agita-a no ar, com o muco a sair-lhe de uma narina, os olhos negros do eyeliner esborratado, as lágrimas em torrente e a saliva acumulada nos cantos da boca. Já estava a imaginar a notícia no Correio da Manhã: "Descoberta macabra em apartamento em X - 4 mulheres entre os 18 e os 25 anos foram assassinadas pela colega de casa que se apresentou nua, porém coberta de sangue,  na esquadra local. Os motivos da chacina são ainda desconhecidos das autoridades".(Não sei se o Correio da Manhã conseguiria fazer aquela piada do "nua, porém coberta". Quero acreditar que como homenagem póstuma, sim). O meu quarto era mais uma vez o mais pequeno e desta vez com duas particularidades: uma cama como a de Procusto (pequena em todos os sentidos, até para os meus padrões) e uma janela com uma frincha crónica. Fazia noventa piscinas três vezes por semana, entre às 21 e as 22h. Esse era o pináculo da minha existência por esses dias. Para quem não gosta de serenatas, não está mau como pináculo. 

Farta daquele ambiente académico, mais infantil que boémio, resolvi mudar. Eu e a Rita fomos então para outro apartamento muito jeitoso. O que gostava naquele apartamento era o silêncio: quando acordava à noite ("in the wee small hours of the morning") e ia até à varanda ver a cidade a dormir e pensar em… coisas. Uma espécie de pináculo. Cada um tem os seus. Por essa altura adicionei à natação, a corrida, ambas de manhã, entre as 7 e as 8h, mais coisa menos coisa. Para nadar preferia o silêncio e para correr a Beyonce. Quantas vezes não escapei a ser atropelada por ir a ouvir música pop... Conclusão: a pop pode matar. Às vezes eu e a Rita íamos dançar Lindy Hop e danças do mundo com um colega de trabalho dela. Outras vezes íamos só às compras, adquirir roupa que, no nosso pleno juízo, jamais compraríamos. Também íamos ao cinema, mas não concordávamos no que ver. Ficámo-nos por isso pelas compras de roupa. Nunca tive tanto por onde escolher. Tinha um trabalho de que gostava bastante, mas foi por essa altura que soube que o Rui tinha sido pai e isso deitou-me ao chão. Trabalhar passou a ser uma tarefa; dormir, o consolo. Quer dizer… não dormia no chão. Aliás, pela primeira vez em vários anos tinha uma cama grande, para rebolar para o lado fresco quando estava calor e ficar com a sensação de prosperidade nos outros dias do ano.

A vida voltou a dar voltas e quando me vi novamente em outra casa, estava sozinha e preocupada com o tapete da entrada que, sendo um IKEA (noblesse oblige. neste caso a nobreza é mais burguesia) não pode ser lavado. Por isso todos os dias dou comigo a fazer ginástica para entrar em casa sem pisar o tapete da entrada. Ou a enxotar gaivotas com um: "se eu não posso dormir mais, vocês também não". Ou a trocar as linhas do livro mesmo antes de adormecer. Um dia cheguei a casa e uma gaivota tinha entrado pela varanda. Senti-me a Tippi Hedren. Percebi o filme. Gosto da vista, a cama é grande e minha, não tenho vizinhos, nem televisão, nem sofá (so far). Um achado que, espero, não tenha de perder.