quarta-feira, março 31, 2010

- não vai mais vinho para essa mesa -

isto há dias em que uma pessoa não devia ir trabalhar. em que uma pessoa não devia pensar "sou tão incompetente", apesar de ter a certeza que todos pensam isso.

- o carteiro -
nem sei se já sabem disto ou não, mas a Elle Espanha de Abril dedica algumas páginas à conjugação - improvável - entre os nossos personagens favoritos da Disney e a moda. Nesta edição podemos ver nas ilustrações de Ulrich Schröder, um ilustrador alemão que trabalha para a Disney, o Lobão (acho que é ele) a fazer de Karl Lagerfeld, o Mickey e o Pateta a vestir a pele de Stefano e Domenico da dupla Dolce and Gabbana, a Margarida como Donatella Versace e o pato Donald como Galliano e Gaultier. Há mais imagens...




- o carteiro -


sábado, março 27, 2010

- back to black -

"If only we could pull out our brain and use only our eyes." - Picasso

sexta-feira, março 26, 2010

- o carteiro -
não suba o sapateiro acima da chinela ou neste caso, não suba o arquitecto acima dos alicerces (caro AM, todo o respeito).
Não posso dizer que estes exemplos são completamente mal sucedidos, pois em alguns casos é provável que exista nas peças a estabilidade e conforto necessários ao uso. Mas em outros, tanto no que ao uso concerne como relativamente à estética, quer-me parecer que os sapatos ficam aquém. Quem começou com a moda, se bem me lembro, foi a arquitecta Zaha Hadid para a marca brasileira Melissa (aqueles sapatos de plástico que toda a gente usou em criança) e depois para a Lacoste. Curiosamente, e apesar do prestígio da Lacoste, a arquitecta fez uso integral de borracha para construir umas botas cujo cano se enrola à volta da perna. Com uma tecnologia própria para cortar metais, de nome Direct Metal Laser Sintering, é muito provável que as botas de Zahid custem muito mais do que umas botas sem marca e, segundo a fotografia, abriguem bem menos. Pode ser que estas botas sejam apenas um estudo, nunca saiam da loja e sirvam somente como experiências da arquitecta relativamente a outros materiais e formas, mas que as botas são feias, lá isso são.
Outro par que também deixa alguma coisa a desejar, pelo menos na minha opinião é Rem D. Koolhaas/United Nude. Koolhass desenhou para a marca United Nude, já há algum tempo uns sapatos cujo salto era como o pé de uma cadeira de escritório. Mas agora a parceria voltou com Möbius que, segundo o nome, devem ter sido inspirados na fita de Moebius (aquela que fica ao contrário). A ideia, o conceito está engraçado, mas o sapato no final não deixa de ser uma tamanca um bocadinho sirigaita e arregaçada. Pode ser um bom princípio para um edifício, como uma brincadeira, mas não é para um bom (e quando digo bom não estou a esquecer o bonito) sapato.


Há outros dois exemplos que merecem nota embora não se saiba muito bem se são usáveis ou não. Um deles, e aquele que mais dúvidas deixa, é o sapato Mojito de Julian Hakes. Hakes não trabalhou em colaboração com nenhuma marca, mas vendo pela obra de arte que o sapato se tornou, é bem provável que seja chamado para trabalhar para a casa Laboutin. Não posso negar que gosto. Não sei se é prático ou não, mas que é bonito, lá isso é. Tendo em conta que este tipo de sapatos não são para usar nos terrenos arenosos da Capadócia – assim como os sapatos de tacão alto deveriam ter um espaço próprio revestido a passerelle para os tacões não se enfiarem entre as pedrinhas da calçada portuguesa – acho que podem ser estáveis o suficiente para uma entrega de prémios. Desconfio muito da estabilidade dos sapatos (não há nada que os prenda ao pé) e da sua capacidade de não “chinelar”, mas dou o benefício da dúvida.


Por fim, temos uns bonitos Tea Petrovic que foram buscar a sua forma à arquitectura. Esta Bósnia foi buscar inspiração aos projectos de Santiago Calatrava e criou uma linha que não deve ter passado ainda da maquete, mas já nada na internet, o que não é mau para uma estudante de design. Há muito das coberturas, pontes e pilares de Calatrava nos sapatos de Tea Petrovic, embora a rapariga diga que os sapatos são mais uma experiência do que um objecto de uso quotidiano em si.

quarta-feira, março 24, 2010

- original soundtrack -


raio de música mais bonita

Looking out the door i see the rain fall upon the funeral mourners
Parading in a wake of sad relations as their shoes fill up with water
And maybe i'm too young to keep good love from going wrong
But tonight you're on my mind so you never know

When i'm broken down and hungry for your love with no way to feed it
Where are you tonight, child you know how much i need it
Too young to hold on and too old to just break free and run

Sometimes a man gets carried away, when he feels like he should be having his fun
And much too blind to see the damage he's done
Sometimes a man must awake to find that really, he has no-one

So i'll wait for you... and i'll burn
Will I ever see your sweet return
Oh will I ever learn

Oh lover, you should've come over
'Cause it's not too late

Lonely is the room, the bed is made, the open window lets the rain in
Burning in the corner is the only one who dreams he had you with him
My body turns and yearns for a sleep that will never come

It's never over, my kingdom for a kiss upon her shoulder
It's never over, all my riches for her smiles when i slept so soft against her
It's never over, all my blood for the sweetness of her laughter
It's never over, she's the tear that hangs inside my soul forever

Well maybe i'm just too young
To keep good love from going wrong

Oh... lover, you should've come over
'Cause it's not too late

Well I feel too young to hold on
And i'm much too old to break free and run
Too deaf, dumb, and blind to see the damage i've done
Sweet lover, you should've come over
Oh, love well i'm waiting for you

Lover, you should've come over
'Cause it's not too late

(Lover, you should've come over, Jeff Buckley)


- não vai mais vinho para essa mesa -

O cúmulo da tensão baixa é tomar um duche de água quente e adormecer no chuveiro.
- ars longa, vita brevis -
hipócrates

diz-me o que comes e eu digo-te de que tela vens:
um grupo de professores americanos que procurava estudar a obesidade naquele país recorreu a obras relativas à Última Ceia por parte de 52 artistas e datadas de 1000 a 2000. Descobriram que ao longo dos tempos a arte foi acompanhando uma tendência que a sociedade já seguia – ou vice-versa – de comer mais do que aquilo que achava que ingeria na realidade. Os dois professores analisaram as pinturas mais famosas dos últimos mil anos relativas à Última Ceia e descobriram, através do tamanho e número de pratos na mesa, do pão e do tipo e quantidade de comida, bem como das cabeças dos apóstolos. O que o estudo revelou foi que ao longo do tempo, como seria de esperar, o tamanho da cabeça dos apóstolos não sofreu alterações, mas o tamanho e quantidade da alimentação e dos pratos em si, sim. O estudo também mostrou que ao longo de mil anos de pintura o número de entradas colocadas em frente a Jesus aumentou cerca de 70% e o número de pães, 23% e o tamanho dos pratos foi incrementado cerca de 66%. Segundo este trabalho o grande momento de viragem deu-se com a Última Ceia de Leonardo da Vinci que é tida como um banquete epicurista, uma vez que até aí as pinturas relativas a esta passagem bíblica eram mais frugais na quantidade e na variedade. Depois, e vemos isso com Tintoretto
já no Maneirismo, a ceia mais conhecida da religião foi tendendo mais para casamento cigano do que para jantar derradeiro.
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@ last, my symbol has come along…
Isto é o que se chama um ovo columbismo! O MoMA adicionou à sua colecçãode arquitectura e design o símbolo @ que é usado por milhões de pessoas, todos os dias em todo o mundo. Apesar de existir há muito tempo – o MoMA diz que pelo menos desde o século VI o @ é associado por nós à Internet e aos tempos de hoje e apesar de fazer parte do nosso dia-a-dia é uma “obra de arte”(?). Por mais que nos custe a acreditar, este símbolo pode ser considerado uma obra de arte uma vez que, como símbolo não faz alusão a uma ideia em concreto, mas algo abstracto e depois porque para as diferentes civilizações, ao longo dos tempos, teve um significado diferente. Para os russos, por exemplo, o @ já simbolizou um cão, enquanto para os finlandeses era o equivalente a um gato. O director do MoMA referiu que esta inclusão do símbolo nas citadas colecções é um “acto de design”, uma vez que, juntamente com as iniciais “www” o @ é como uma manta que cobre todo o universo comunicacional actual e como tal, pode ser visto como uma forma da sociedade se expressar e interagir. No entanto, não se preocupem porque o símbolo continua a ser de todos; a inclusão por parte do MoMA não implica a sua custódia.
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o leão afónico
A Metro Goldwyn Mayer ruge pela última vez, num caso que até faz lembrar um clube de futebol que recentemente foi a eleições sem nenhuma lista candidata. Na MGM nenhuma das empresas interessadas nos estúdios de cinema está disposta a dar os 4000 milhões de dólares pedidos para adquiri-los. Até agora nenhuma das ofertas se aproximou sequer de metade do valor pedido e necessário aos proprietários actuais para fazer face às dívidas bancárias. E se tal não acontecer nos próximos dias pelo menos até 31 de Março, vindo dos compradores que já se mostraram interessados ou de outros, então a MGM tal como a conhecemos desaparecerá. Os estúdios que nos deram “E tudo o vento levou”, “Feiticeiro de Oz” e muitos outros podem assim declarar bancarrota o que deixará a empresa nas mãos dos seus credores e resultará, inevitavelmente, na venda de peças como os direitos da saga James Bond e aquela que foi a última produção MGM, “Fame”.
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- ars longa, vita brevis -
hipócrates

Olá. Apetecia-me dizer qualquer coisa mais substancial.
Olá outra vez. Não consigo começar este post. O cursor pisca e não sei o que dizer. Volto amanhã.
Olá. Tanto “antes” como “depois” e ainda mais depois as pessoas acreditaram em demónios. Cá para nós, que ninguém nos leia, os demónios são uma criação teológica para substanciar e creditar a obra demiúrgica. Como alguém dizia no “Cinema Paraíso”: a minha infelicidade torna-se maior sobre pano de fundo da felicidade do outro. Deus é infinitamente bondoso e compassivo quando comparado com o diabo, embora não o fosse se por exemplo o comparássemos com Job (“ter uma paciência de Job”, diz-se). Apesar destes antes e depois não serem muito espaçados no tempo, nota-se uma linguagem comum e acima de tudo, um elemento comum. Depois do demónio com corpo de mulher, depois do demónio com corpo de personagem mitológica, surge o demónio com trompa de elefante. Tanto no antes, de 1480 como no depois de 1506, Santo António está a ser tentado por um grupo de demónios e apesar dos mesmos terem formas assustadoras entre o antropomórfico e o zoomórfico, um deles - que se repete nas duas situações – apresenta trompa de elefante, o que é raro embora não seja propriamente uma surpresa. A gravura de Schongauer ilustra através dos vários demónios, a grande variedade de proveniências demoníacas, bem como as suas contradições. Todos eles têm corpos informes, de difícil delimitação e noção entre princípio e fim, são leves embora em muitos deles não se note a presença de asas. Quando falamos de contradições na representação falamos das suas associações pouco óbvias como a forma de pássaro, os quadrúpedes, a forma de peixe, o humanóide. Cranach tomou como exemplo a representação feita por Schongaeur e acrescentou-lhe, para além daqueles seres híbridos, crustáceos e insectos. E tal como na gravura do primeiro autor, também em Cranach é quase impossível distinguir onde começa e onde acaba o corpo demoníaco, pois apenas discernimos uma massa infernal, mas não os elementos em separado. Para além disso o momento em que o santo é atacado – mais até do que tentado – ocorre no ar Cranach foi mais feliz nessa tentativa de levitação do que Schongauer, pois este estreita a paisagem e não deixa que o olho faça a contraposição. Cranach, que tinha desenvolvido o gosto pela representação da paisagem graças a Dürer, esteve menos interessado na geometria e simetria da obra do que o seu antecessor. Existe uma outra versão da tentação de Schongauer atribuída a Miguel Ângelo. Nestes dois últimos o demónio tem corpo de peixe, braços humanos e trompa de elefante, enquanto em Cranach o corpo parece humano e a trompa, novamente de elefante. Estas representações eram comuns nesta época, mas também o eram na arte oriental. Exemplos disso são os diabos chineses segundo Li Long-mien de quem não arranjei imagens. Parece que o Musée Guimet as tem, mas não disponibiliza on line. Bou inbestigáááár:

Schongauer
Tentação de Santo António (pormenor)
1480



Schongauer
Tentação de Santo António (pormenor)
1480


Miguel Ângelo (?)
Tentação de Santo António
1488
Kimbell Art Museum



Miguel Ângelo (?)
Tentação de Santo António (pormenor)
1488
Kimbell Art Museum


Lucas Cranach
The Temptation of Saint Anthony
1506
British Museum, Londres


Lucas Cranach
The Temptation of Saint Anthony (pormenor)
1506
British Museum, Londres
- não vai mais vinho para essa mesa -
- o carteiro -
apeteceu-me
- o carteiro -

Van Gogh
Fifteen Sunflowers in a Vase
1888
National Gallery, London

Quando a minha idade era outra que não esta, uma questão mantinha o meu pensamento em constante sobressalto: a impossibilidade das relações amorosas. O que era a “faísca”? O sexo, o amor, a pornografia, o visceralismo e a ginecologia eram a mesma coisa? Era possível gostar de duas pessoas ao mesmo tempo de formas iguais? Havia formas mais nobres de gostar do que outras? Havia algum código de conduta? Como é que se seduzia alguém? O sexo era um fim ou um meio? Namorar era um substantivo ou um verbo? Como é que se namorava? Namorar. As pessoas pareciam-me movidas mais pelas circunstâncias do que por elas. Tocavam-se na rua, davam as mãos, olhavam bem uma para a outra. Para quê? O que é que isso significava? Teria eu alguma coisa no meio dos dentes? Procurava não olhar nos olhos e parecia-me mais lógico que um homem me batesse porque não estava a proceder conforme o determinado pelo grande livro das relações (que se não existe, devia existir), do que beijar, dar a mão ou olhar. O que queria dizer dar a mão? Eu sentia como uma mentira os ditos e os feitos. Como poderia um homem dizer que gostava de mim? Quais os mecanismos que nele operavam essa "sensação de sentimento"? Só podia ser um mau homem, uma pessoa não potável para dizer uma coisa tão insultuosa à minha inteligência. E se gostava – sentimento que ele naturalmente confundia com um outro – era porque eu tinha feito alguma coisa de errado. E se não tinha feito, ía fazer. Não que eu quisesse violência ou as restantes tendências, mas era tão mais fácil ser violenta, descarada e fria do que ser normal. A normal era uma folha em branco. Era ridículo procrastinar a incorruptibilidade do meu corpo pois a minha mente, repleta de confusão entre aquilo que eu era e aquilo que os outros viam em mim (incluindo o ginecologista), já me tinha corrompido há muito. Não que pensasse muito em sexo. Eu nem sequer sabia se devíamos dizer “ter sexo” ou “fazer sexo”. O “ter” era mais simpático, o “fazer” mais verdadeiro. Pensava muito no quão atrasada estava face aos outros; face às piadas, face aos livros, aos filmes, à família, às estatísticas e ao ginecologista que olhava para dentro de mim com olhar trocista. Pensava no ridículo que seria encarar alguém e dizer-lhe a verdade. Pensava nas velhas de Goya onde mulheres com seios caídos se insinuam a rapazes. Pensava n' A Pianista no chão, de camisa de noite quando ele lhe disse que não adiantava ela e o seu corpo ridículo tentarem aproximar-se dele. Tal e qual. Pensava no terror de baixar a guarda. Aliás… O que era "baixar a guarda" para quem nunca se tinha apaixonado e ao primeiro sinal de tal bateu em retirada porque não conseguia dissecar o que sentia? (tanta linguagem bélica!). E estava tão certa que do outro lado não estava ninguém ao mesmo nível que preferi chorar durante três anos em todos os compartimentos de comboio, em todas as repartições públicas e fazer cerca de 2 conjuntivites por ano do que voltar atrás e pedinchar atenção, mesmo que fosse daquela atenção pela qual uma mulher já pode pagar.
Assexuada, incapaz de suscitar num homem um interesse mínimo. Desajeitada, risível, triste na minha inviolabilidade, feia, geneticamente errada, um resquício pós-apocalítico de um vómito mal parido. Beleza interior, dizem.
“Eu queria ser mulher para excitar quem me olhasse,
Eu queria ser mulher pra me poder recusar…” (Mário de Sá-Carneiro)

terça-feira, março 16, 2010

- original soundtrack -

[obrigada à sugestão anónima]

Guess it's just another dream
That's slipping away
Each time that I fall asleep
It seems Im just drifting away
Just as you have touched my heart
Babe I wake up and were apart, yeah
And it's slipping away

Here comes just another day
That's drifting away
Every time I draw a breath
Its dying away
First the sun and then the moon
One of them will be around soon
Slipping away
Slipping away
Drifting away
Slipping away

Just as you have touched my heart
I wake up babe and were apart
It seems were slipping away
Slipping away
Slipping away

All I want is ecstacy
But I aint getting much
Just getting off on misery
It seems Ive lost my touch

Well it's just another song
But it's slipping away
Well we didn't sing it long
Cos it's fading away
First the sun and then the moon
One of them will be round soon
Slipping away
Slipping away
Slipping away

(Slipping Away, Rolling Stones)
- ars longa, vita brevis -
hipócrates

o antes e depois de hoje não é muito evidente, mas é bem fundamentado, valha-nos isso. O antes mostra-nos uma divindade budista, um demónio mais concretamente de nome Mâra. Este demónio tem inúmeras interpretações consoante as associações que podemos fazer com o seu nome e nem sempre, tal como acontece no Ocidente, os demónios são necessariamente maus. No geral, Mâra é o demónio que tentou Buda, tal como no Cristianismo Santo Antão foi tentado e Cristo também. No caso de Buda a tentação foi a visão de uma bela moçoila. Não que o Budismo a associe aos pecados da carne, mas sim à distracção e à preguiça; ao descuido da alma em detrimento do corpo (que não deixa de ir dar no mesmo). Mas como vimos – vimos não, eu disse – Mâra nem sempre teve esta conotação negativa pois chegou mesmo a ser apenas uma espécie de advogado do diabo e alguns diálogos mais antigos entre Mâra e Buda revelam mesmo conversas bem-humoradas. Nesta imagem (que foi cortada) vemos Mara a tentar Buda graças à multiplicidade de braços. As divindades asiáticas geralmente têm vários braços, uma imagem que pretende reforçar duas ideias. Por um lado os vários braços indicam-nos que Mâra e outros são super humanos e têm um poder que supera o nosso. Por outro mostram-nos como conseguem fazer várias actividades ao mesmo tempo. Shiva por exemplo – que é uma divindade associada à morte – consegue com os seus múltiplos braços degolar um homem, estrangular outro e incendiar uma aldeia, por exemplo.

E pensarão vocês, e muito bem, o que tem a Mara a ver com a "Nossa Senhora". Parece que nada e que a analogia formal é forçada, mas a verdade é que a arte e a mitologia oriental fez mais pelas alegorias góticas do que todos os textos bíblicos, todos os apocalipses e lendas fantásticas. Vou tentar, ao longo de alguns “antes e depois” mostrar isso, embora seja difícil conseguir as imagens. Os cristão chegaram até ao conhecimento destas imagens através de Marco Pólo e depois pelos textos de Isidoro de Sevilha. Marco Pólo descreveu as divindades da ilha Zipangri e mais tarde o relato das mesmas chegou até aos vários povos do mundo através dos viajantes. Obviamente que com deuses destes os orientais eram vistos como povos anormais que adoravam deuses anormais. Mas no Decameron Boccaccio necessita de descrever a imagem da Fortuna descreve-a como se um deus oriental se tratasse: tem cem mãos e outros tantos braços para retirar dos homens os bens terrenos e levar os humanos deste mundo. Neste caso que mostra a Fortuna num Decameron feito para Eduardo IV de Inglaterra, a Fortuna tem seis braços. Lembremo-nos que esta imagem não é a imagem da Virgem, mas sim uma ilustração de um dos contos de Boccaccio, que este utilizou para criar um novo paradigma existencial. Durante a Peste Negra vários jovens refugiam-se fora de Florença e passam os dias a contar as suas histórias. Algumas delas são histórias de vida do próprio Boccaccio e introduzem uma nova realidade: as mulheres a conviver no mesmo espaço que os homens e, ao contarem as suas experiências em ambiente fechado, a separarem o público privado, algo que até aí não existia. A Fortuna assim representada tem uma razão de ser, pois representa, ao contrário do Destino ou do Fado não é intrínseca ao homem e pode ser adquirida segundo os seus desejos. Esta ideia de que a Beleza, a Sorte e o Amor não dependem da condição com que se nasceu, mas sim da capacidade de cada um de nós para alcança-las está também na fundação de uma nova classe social, burguesa, que ascende ao poder político pela força do trabalho e não pela filiação. A Fortuna é a capacidade de cada um de se oferecer e negar bens não necessariamente materiais.

The subjugation of Mâra
Século X
Musée Guimet, Paris



Laurent du Premerfait (tradução)
Fortuna
1480
- não vai mais vinho para essa mesa -

[no supermercado à procura de óleo de amêndoas doces na secção de produtos de higiene, um casal com uma filha de 6 ou 7 anos aprecia desodorizantes. A filha desloca-se até aos preservativos e coloca uma embalagem no carrinho de compras dos pais. Demorei-me um pouco mais para ver no que ia dar]
- Mãe, vou levar isto, está bem?
- O que é isso Bianca?
- É para mim.
- Mostra. Ó Bianca, pousa já isto onde estava!
- Ó mãe! Mas tu prometeste que eu podia levar chocolate.
- Isto não é chocolate!
- É é. Diz aqui: "sabor a chocolate", que eu li. Também tinha ali de morango, mas eu gosto mais de chocolate! Posso levar mãe?!
- ars longa, vita brevis -
hipócrates


- a arte magoa
- a arte cansa
- a arte representa (-me)
- o carteiro -

"quem com ferros mata, com ferros morre":

Comprei este livrinho com muito esforço (não porque ele tivesse sido caro, mas porque o mandaram vir de Cascos de Rolha) e senti de imediato uma simpatia pelo escritor. Dizem que morreu virgem e não sei se isso influenciou a escrita, mas o que é certo é que este livro é pouco católico, ao contrário da ideia de morrer virgem. Nele Unamuno fala, entre outras coisas, da importância da palavra dita, do som, no cristianismo, algo que eu acho já ter falado aqui. Lembremo-nos que Deus destrói duas cidades através do som: Jericó através do som da trombeta e Babel pela fala.
Mas Unamuno diz que todo o Cristianismo está fundado na língua, na fala e não na escrita, apesar de hoje a Bíblia ser o pilar sobre o qual assenta o Cristianismo. Ali apenas encontramos uma passagem em que Cristo está a escrever: no capítulo 8, versículo 6 do Evangelho da São João (Isto diziam eles, tentando-o, para que tivessem de que o acusar. Mas Jesus, inclinando-se, escrevia com o dedo na terra.) quando os fariseus lhe apresentam a mulher pecadora. Ele inclina-se e escreve na terra com o dedo, letras que o vento apagou. Talvez isto tenha uma razão de ser. Quanto mais preso estivesse à letra, mais escalpelizado o cristianismo poderia ser, mais sujeito a análise estava. É assim que começa o protestantismo que mais não faz que analisar os desvios da Igreja à palavra escrita. Outra contradição que a existência da Bíblia provoca é o facto de ser uma memória para gerações futuras que, no imediato não tinham capacidade para entendê-la, assim como é o livro que faz a apologia do amor pelos mais desprotegidos, sendo que esses desprotegidos, pagãos (pagesianus) eram os homens do campo, as pessoas que não sabiam ler nem escrever. Eram portanto as pessoas da palavra dita e não da palavra escrita. Mesmo São Paulo, o evangelista que tornou a palavra dita em palavra escrita, quando foi levado para os céus disse que ouviu “palavras indizíveis” (Foi arrebatado ao paraíso; e ouviu palavras inefáveis, que ao homem não é lícito falar.) 2 Coríntios, capítulo 12, versículo 4.

Este acto de ouvir é um acto muito feminino: Maria ouviu o anjo, Sara teve um filho porque Deus lhe disse, Raab, a prostituta salvou-se pela audição.(Hebreus, capítulo 11, versículo 31) E mesmo o eunuco de Candace acreditou no que ouviu vindo da boca de Isaías (Actos dos Apóstolos, capítulo 8, versículo 27). Apesar disto, apesar do Cristianismo desaguar nas mulheres, começa sempre na entidade masculina, no Homem. Por exemplo, o Homem não vem da mulher, a mulher é que vem do Homem (1 Coríntios 11, 9). No entanto Maria, mãe de Cristo não nasceu de uma costela de Cristo pois se assim fosse não daria à luz Cristo. Sei que estas contradições parecem irrelevantes até porque o Antigo Testamento e o Novo relatam acontecimentos diferentes, mas na palavra dita deveria existir a mesma coerência do que na palavra escrita. Quando morre, a última pessoa que Ele vê (foi visto por Ele em 1 Coríntios 15, 8) é Paulo. (E por derradeiro de todos me apareceu também a mim, como a um abortivo). O texto não diz que Paulo vê Cristo, mas é visto por Ele. Mais uma vez a palavra é enganosa pois como morreu, Cristo não tinha possibilidade de dizer quem tinha visto. E quando ressuscita Maria Madalena foi a primeira pessoa a quem Cristo apareceu (Marcos 16, 9); ou seja, não foi Maria Madalena que foi em busca de Cristo, mas ao contrário. E para além disso Cristo foi visto por Pedro e ouvido por Maria Madalena isto no momento do reconhecimento. Quer isto dizer que quando aparece a Pedro, Pedro reconhece-O, mas quando aparece a Madalena ela não O reconhece. Só quando Ele diz “Maria” é que ela respondeu “Rabonni” (mestre) (João 20, 16). Quando Maria Madalena ia para tocá-Lo Ele disse-lhe “não me toques” pois à mulher bastava ouvir para a acreditar – a fé feminina ouve-se – enquanto aos homens como Tomé era necessário tocar para se certificar. E pronto, é assim.
estou a precisar de algo na minha vida, e não é Ferrero Rocher

sábado, março 13, 2010

- back to black -

"Have no fear of perfection — you'll never reach it." - Salvator Dali
[isto é que me chateia]

quinta-feira, março 11, 2010

- não vai mais vinho para essa mesa -

o verdadeiro artista é aquele que diz, sem querer, Bienal Zava em vez de Zeinal Bava. (e não consigo atinar com o nome do tipo!)
há outro artista, que não é verdadeiro nem bom, mas tem um "je ne sais quoi" (talvez no bigode, talvez na letra) que nos fala ao coração. vale a pena ouvir

quarta-feira, março 10, 2010

- o carteiro -

fraquinho, fraquinho
- original soundtrack -



esta música tira uma pessoa do sério


In the beginning, when life was simple
We were at each other night and day
You were so sensual and so inventive
We said we’d stick together come what may


In the beginning, you were so brutal
You turned the heat on in the afternoon
Get so excited, get so addicted
You had me eating from your golden spoon


Now I don’t wanna spoil the party
I know it goes against the grain
As the plane touched down I got movies of you
Running through my fevered brain


I really love my sweet thing, I can’t give her up
I really love my sweet thing, I can’t give her up
I really love my sweet thing, I can’t give her up


In the beginning, when we were winning
I was your ever-present love-sick fool
You turned the heat off and left me standing
Freezing by your swimming pool


I can’t give it up
I can’t give it up
I can’t give it up
I can’t give it up


Now I don’t wanna spoil the party
I know it goes against the grain
As the plane touched down, and the midnight moon
Can’t just walk away


Really love my sweet thing, wanna’ lick it up
Really love my sweet thing, wanna’ lick it up
Really love my sweet thing, can’t give it up
Really love my sweet thing, can’t give it up


(Sweet Thing, Rolling Stones)
- não vai mais vinho para essa mesa -


[à mesa]
- Este pão é diferente...
- Sabes quem é que estava a atender os clientes na padaria?
- Não.
- A Vera!
- Quem é a Vera?
- Eh pá, aquela bimba que usa as unhas tão compridas que quase parecem tenazes.
- Sim, essa! Já a vi lá mais do que uma vez. O que tem?
- Dormiu com o patrão e agora é patroa.
- Dormiu com o patrão? Mas ele não era casado? Quer dizer... de facto uma coisa não impede a outra...
- Dormiu com ele para subir, para ser promovida.
- Ser promovida a quê? Subir de papo-seco a brioche?
- ars longa, vita brevis -
hipócrates

Antes e depois ou como não gosto muito deste depois ou como também a verdade é que não conhecia este depois. O antes do Ingres vem no seguimento da tradição Neoclássica e depois Romântica de um gosto pelo exotismo e pela raridade, um interesse por culturas diferentes para corroborar a ideia de que estávamos perante civilizações menores e que o homem civilizado tinha conseguido chegar até elas. Ingres pinta este harém baseando-se para isso nas cartas da senhora Mary Wortley Montague, esposa de um embaixador que descreve os banhos em Seraglio, Turquia, nos quais, pela descrição, deve ter sido autorizada a frequentar. Ingres copiou extractos das cartas e deverá ter sido através deles que pintou este e outros quadros dedicados ao orientalismo. Tanto aqui como nos referidos quadros há figuras que parecem estar na mesma posição, o que nos indica que Ingres terá copiado estas mulheres de uns quadros para os outros ou que as teria já em esboços. Isto não é especulação; por mais que se goste de Ingres, não esqueçamos – e isto é um facto – que ele não era um pintor muito dotado de imaginação. Talvez por isso se tenha distinguido no retrato e não nas pinturas que requeriam criatividade. Estas imagens relativas ao orientalismo são em grande parte retiradas das “turquerias” do século XVI, XVII e XVIII. O quadro foi entregue ao Princípe Napoleão, mas a imagens de tantos nus não agradou a Princesa Clotilde de Sabóia e por isso a obra foi devolvida a Ingres em troca de um retrato produzido pelo pintor. Mas Ingres não a deixou na sua forma original e até aos 84 anos de idade efectuou diversas alterações.
A obra, tal como outras, é muitas vezes o mote para pastiches de outros artistas pelas mais variadas razões: como forma de retratar vícios modernos, tragédias actuais (The raft of the medusa), temáticas de hoje… E o que se passa com este “depois” é isso. Não o conhecia e desconfiava um pouco das suas razões. A facilidade não me parece uma boa característica identificativa de uma obra desta ou daquela forma.

O autor é Anton Solomoukha que tentou nesta fotografia incorporar o pecado e a corrupção dos nossos dias no quotidiano com o recurso a uma obra conhecida e que na altura provocou algum escândalo (embora não fosse a expressão de um mundo corrompido e isto é que me aborrece pois o tipo pega na obra errada). Não penso que o recurso ao nu seja a melhor forma para expressar o tipo de corrupção vivido na nossa sociedade, nem os pecados do corpo são hoje os mais perniciosos, embora eu tenha de confessar que o nu, exposto de forma declarada e quase perversa me cause alguma estranheza. É isso que Anton Solomoukha faz aqui: usa esse nu depravado para nos aproximar, tanto quanto afastar da fotografia. Como ocidentais veneramos o nu, conferimos-lhe até o carácter de meio legítimo para atingir um fim. No entanto, não deixámos ainda de corar com o nu, não deixámos de o esconder e exposto, ele torna-se como uma relíquia que perde importância fora do relicário. Estas mulheres gastas, conhecidas, sem mistério, enfartadas já não são novidade nem motivo de interesse, mas apenas o espelho de uma civilização empanturrada e enjoada de tanto as consumir.

Ingres
The Turkish Bath
1862
Musée du Louvre, Paris



Anton Solomoukha

Bain Turc, Ingres

2007
- o carteiro -
"Exulto de alegria
no Senhooooor
E minh'alma rejubi-i-la
No-Meu-Deeeeus"
Há pouco tempo em conversa com uma pessoa descobri que a Virgem Maria não tinha sido sempre retratada, no que à Natividade diz respeito, da mesma forma. Talvez nada de importante para vocês, mas para mim, cuja felicidade se encontra nas viagens, na leitura de um bom livro de Inverno a ouvir a chuva lá fora, nas idas sozinha ao cinema e ao teatro e nas descobertas artísticas, isto é de grande importância. Por isso não me estraguem o momento.
A justificação para representações diferentes do mesmo momento da vida de uma personagem bíblica não fica apenas a dever-se aos gostos dos artistas, às limitações que lhes foram impostas pela Igreja ou devido ao gosto da época. Estas diferentes representações estão também ligadas à inexistência de uma história inequívoca da vida de Maria. Sabemos um pouco sobre a sua vida através daquilo que vem exposto na Bíblia, mas também sabemos que este livro basilar da religião católica é uma construção política e que por isso diversos evangelhos menos “úteis” foram deixados de fora da compilação. Alguns como o Proto-Evangelho de Tiago abordam mais em pormenor o contexto do nascimento de Cristo. Neste Evangelho apócrifo Tiago fala de forma mais específica, e ausente na Bíblia, de tudo o que antecedeu a Natividade. Esta escritura, longe de questionar a virgindade de Maria, acaba por corroborá-la devido à forma excepcional como ocorreu o nascimento de Cristo. Diz o Evangelho que sentindo o aproximar da hora, Maria pediu a José que se instalassem na gruta, primeiro lugar que viram minimamente potável para o “parto”. José deixa Maria ali (não sei se a pedido dela ou não, facto que poderia mudar muita coisa) e vai em busca de auxílio. Bate à porta de Geloma que se dirige para a gruta enquanto José procura outra mulher que os possa ajudar. Geloma segue o seu caminho envolta num halo, de tal forma, que à sua volta tudo se ilumina; José chega mais tarde acompanhado por Salomé. Mas nenhum deles entra na gruta. Aliás, Geloma nunca entrou na gruta pois quando lá chegou já Jesus tinha nascido. José convida-a a entrar e ao olhar para Maria Geloma exulta de alegria pois apesar de não ter visto a forma imaculada como Jesus veio ao mundo e não sabendo da sua história, exclama: “O dia é grande para mim, porque vi um espectáculo maravilhoso! Jamais imaginei ou ouvi falar de tal coisa! Uma virgem concebeu e mantém-se virgem!” Salomé não acredita e tal como Tomé pediu para tocar nas chagas de Cristo, Salomé pede para tocar no ventre de Maria. E mal o faz a sua mão começa a arder, acção do Senhor, por ela ter duvidado.

Esta passagem confirma a ideia enunciada mais tarde por Santo Agostinho que Maria foi “virgo ante partum, in partum, post partum” (virem antes, durante e depois do parto). Foi também por esta altura, mais precisamente em 431 que o Concílio Ecuménico de Éfeso declarou que Maria era não só a Mãe de Cristo (como pretendiam os puristas), mas também a Mãe de Deus uma vez que Deus tinha vindo à Terra sob a forma humana. Por isso ela passou a ser uma presença regular e com lugar de destaque nas cenas de Natividade. As representações artísticas da Natividade foram sendo alteradas ao longo do tempo, ditadas pelas leis religiosas que muitas vezes eram a leis do mecenato, e pelas novas descobertas. Na minha opinião foram vários os momentos que marcaram a forma como se retratou Nossa Senhora na Natividade. Até às disposições de Éfeso as representações artísticas, pelo menos as que chegaram até nós, mostravam a Virgem numa cama como uma parturiente normal às vezes auxiliada por Salomé, como podemos ver no fresco de Giotto.

Giotto di Bondone
No. 17 Scenes from the Life of Christ: 1. Nativity: Birth of Jesus
1304-06
Cappella Scrovegni (Arena Chapel), Pádua

Muitas destas obras (em murais ou mosaicos) até incluíam Maria dentro de um quarto, enquanto outras colocavam-na numa cama, mas esta dentro da gruta. Eis que com Éfeso mudou também a forma de retratar esta cena, mas não foi capaz de chegar a todo o Império. Aquando da divisão do Império cristão, no Oriente as representações de Maria aconchegando na cama o Menino permaneceram, mas no Ocidente esta forma de ver a Natividade foi-se tornando cada vez mais canónica. No Oriente, que tinha em conta Geloma e Salomé as duas mulheres surgem com mais frequência. Seguindo o escrito na Bíblia os artistas ocidentais retrataram Maria e José dentro da gruta com o Menino deitado nas palhas. Esta versão teve mais divulgação no Gótico e no Gótico Internacional. Irradiaram também Jesus de luz e criaram em seu redor um ambiente iluminado, algo que até está, a meu ver, relacionado com o Evangelho de Tiago. Mais tarde, com o Concílio de Trento aconteceu paradoxal. Por um lado incentivou-se a devoção Mariana e o culto dos santos como forma de chegar a todos os fiéis, o que se traduziu no reforço de imagens e personagens que não existem na bíblia (como os três reis magos que surgem na arte desde o século X), mas por outro as facções saídas da Reforma Protestante não acreditavam na virgindade de Maria o que fez com que nos países protestantes as cenas da Natividade fossem buscar um pouco das mesmas retratadas no Oriente.

Konrad von Soest
Nativity
1403
Parish church, Bad Wildungen



Matthias Grünewald
Concert of Angels and Nativity
c. 1515
Musée d'Unterlinden, Colmar
- carteiro -






segunda-feira, março 08, 2010

ti-nó-ni
ti-nó-ni

sábado, março 06, 2010

- back to black -

"I don't want to be interesting. I want to be good." - Ludwig Mies van der Rohe

terça-feira, março 02, 2010

- original soundtrack -



Anyone who's ever had a heart
Wouldn't turn around and break it
And anyone who's ever played a part
Wouldn't turn around and hate it

Sweet Jane, sweet Jane
Sweet, sweet Jane

You're waiting
For Jimmy down in the alley
Waiting there
For him to come back home
Waiting down on the corner
And thinking of ways
To get back home

Sweet Jane, sweet Jane
Sweet, sweet Jane

Anyone who's ever had a dream
Anyone who's ever played a part
Anyone who's ever been lonely
And anyone who's ever split apart

Sweet Jane, sweet Jane
Sweet, sweet Jane

Heavenly widened roses
Seem to whisper to me
When you smile
Heavenly widened roses
Seem to whisper to me
When you smile

La la la la, la la la,
Sweet Jane
Sweet, sweet Jane

(Sweet Jane, Cowboy Junkies)

- ars longa, vita brevis -
hipócrates



antes e depois ou "como estes posts já mudavam de título" ou "como já estive a pensar nisso, mas não me ocorreu nada melhor" ou como "não te ocorreu nada melhor, deixa-te de fitas e posta" ou "já vai", ou "ligeirinha, vamos embora", "chata", "chata és tu que não desenvolves", "irra, deixas-me postar?", "anda, estou à espera. tantos floreados para depois ter um post em que só duas ou três linhas servem", "é isso que tu achas?", "é, e é isso que tu também achas", "pois acho", "anda, posta", "ok. este antes e depois de hoje foi muito pensado. primeiro encontrei a imagem de baixo, da senhora que serviu de modelo de Rodin (caticha para o Rodin que foi um copião) para a escultura "o Beijo". Olhei para ela e disse: isto é a mistura entre qualquer coisa de Munch e qualquer coisa, não sei bem de quem, mas que não é Munch. Apontava para Fischl, mas fugiu-me a mão, no teclado, para o Freud e dei de caras com ela, a rapariga de roupão. Por isso, o depois de hoje é uma soma de dois antes, sendo que um deles é mesmo posterior ao depois. Mas vocês compreendem que é uma questão ideológica. O antes de Munch surge com o fim do historicismo (enunciado por Karl Popper) e que colocou um ponto final nas degenerescências da Arte Nova e revivalismos fin-de-sciécle que por essa altura surgiram. Munch, um dos muitos artistas a adoptar a linha livre e a organização em planos, bem como a passar para a pintura a apreensão que se vivia na sociedade da época. Munch era norueguês: o pai médico, tratava de pessoas pobres, a mãe morreu cedo, após a mãe, morreu-lhe uma irmã e uma outra enlouqueceu. Tudo isto levou com que Munch adoptasse num primeiro momento uma postura muito negativista e pessimista na sua pintura, postura essa que mudou quando a sua tendência depressiva foi curada numa clínica de Copenhaga. No entanto, isto faz-me lembrar o filme "Laranja Mecânica" onde o jovem Alex, submetido a um tratamento de choque, perdeu o livre-arbítrio e passou a fazer apenas o bem por condicionamento social, não por vontade própria. No final da sua vida, já curado, Munch produziu obras mais optimistas do que no início, mas nem por isso mais interessantes. Nesta obra que remete duplamente para a puberdade (da jovem e do próprio artista enquanto pintor), vemos por um lado a sua tendência precursora, não abandonando totalmente o figurativismo, mas deixando de parte o pormenor, e o seu lado mais negro. Este quadro é para mim marcante porque há nele qualquer coisa de fantasmagórico e assustador na rapariga. Mais tarde, quando estava para casar, Munch foi traído pela sua noiva e, se não pintou mulheres com esta aura negativa, deve ter pelo menos pensado em pintar.

Munch
Puberty
1895
National Gallery, Oslo

O quadro de Freud presente na Tate Gallery tem algumas semelhanças com o de Munch pois Freud foi o grande perito em transmitir, através de retratos, a dor física ou psicológica de que todo o ser humano é portador (e digo isto, não porque vi escrito em algum lado, mas porque acredito). Apesar de retratar um momento supostamente feliz, uma vez que a retratada era a sua primeira mulher que por acaso estava grávida na altura, Freud fá-lo com uma grande melancolia que podemos ver no cão, nos tons pálidos do fundo e na quase ausência de expressão da modelo. Foi isto que fez com que alguns lhe chamassem o Ingres do Existencialismo, uma vez que os retratos de Freud muito deviam à majestade e impassibilidade dos de Ingres.

E chegamos ao fim da linha: Carmen, modelo de Rodin. Tenho pensado muito nela, na maneira como entrelaça as mãos no meio das pernas, no peito caído, no olhar a fitar-nos... Tenho pensado na velhice e na solidão. Não é a solidão do não estar acompanhado, é na solidão que nasce connosco (e que morre connosco) por mais acompanhados que possamos estar ao longo da vida. Mas como não vale a pensa pensar nisso... Alegria companheiros." "ai minha santa, cê hoji tá qui tá, né?":

Lucian Freud
Girl with a white dog
1951-1952
Tate Gallery, Londres


Carmen (modelo de Rodin para "O Beijo")
1937
- ars longa, vita brevis -
hipócrates

- Vénus!!! Tira já a mão daí! O que é que estás a fazer?

Miguel Ângelo
Creation of the Sun, Moon, and Plants (pormenor)
1511
Cappela Sistina, Vaticano

- Trancinhas e rastas!

Ticiano
The Venus of Urbino
1538
Galleria degli Uffizi, Florença
- o carteiro -
Sabemos que Bosch é o pintor dos escândalos da alma, que retrata como nenhum outro (excepto Caravaggio, mas em outro sentido), as minudências de que é feito o ser humano: a luxúria, a inveja, o pecado original, a podridão do corpo, as tentações… Mas quando não retrata estes temas, até nos parece que Bosch atinge alguma normalidade. Pois o que acontece… é que não. Bosch é sarcástico e perspicaz mesmo quando parece estar a fazer algo inofensivo.

Esta obra pertence a um conjunto de trabalhos precoces onde Bosch começa a aguçar o seu sentido crítico, optando no entanto por não o traduzir por monstros e criaturas grotescas. E para obra de início de carreira, Bosch teve muito trabalho, já que existem pelo menos cinco versões deste quadro. A cena é aparentemente normal como as que se passavam nas feiras da época: um conjunto de pessoas observa um mágico de rua, mas guarda em si uma crítica social pois é um aviso à crença geral de que apenas o Altíssimo tinha direito ao inexplicável. Vemos na cena uma mesa com vários objectos como uma varinha (mágica, presume-se), copos, pequenas esferas e um sapo. O segundo sapo, pelo que me parece está a sair da boca entreaberta do homem que está mais à frente. O sapo era um animal com uma simbologia simultaneamente negativa e positiva, consoante a cultura: para os egípcios era símbolo de ressurreição enquanto para os cristãos estava associado ao lixo, à lama, à heresia e ao pecado. Também se via o sapo como o animal que estava associado à alquimia. Talvez não estivesse directamente ligado à alquimia, mas a dissecação deste animal isso fizesse adivinhar.

Hieronymus Bosch
The Magician
1475-80
Musée Municipal, Saint-Germain-en-Laye

Atrás deste, um homem de lunetas e vestido com um hábito de monge puxa pela bolsa do protagonista, embora não se possa dizer se este homem é ou não cúmplice do provável mágico que preside a sessão. Como dito, existem cinco versões do quadro e existe igualmente um quadro que dá continuidade a esta cena do roubo da bolsa, o que não deixa de ser curioso porque acaba por ser aquilo que Bosch faz nos seus trípticos e porque se as várias versões revelam alguma insegurança, a continuidade mostra já estabilidade.

Mas temos de explicar o contexto da obra de Bosch. Na época a caça às bruxas tornava qualquer pessoa suspeita e mesmo aqueles que não o eram, nem suspeitos nem culpados, passavam a ser por denúncia de alguém que tentava sobreviver e assim amealhar algo graças à delação. Vivia-se em extrema promiscuidade e tudo se sabia; as cidades eram o receptáculo de todos os que tentavam a sorte: saltimbancos, mágicos, vendedores, jovens que abandonavam as suas aldeias, prostitutas, etc. É isso que o pintor mostra, embora não tenha colocado a cena dentro de uma feira, o que poderia ter distraído atenções. Assim permite-nos concentrar atenções no roubo da bolsa que é feito por uma personagem que está vestida com um hábito dominicano. No entanto, não tem a cabeça descoberta como os dominicanos e é isto que nos levanta a dúvida, já que esta espécie de turbante era típica da burguesia. A Ordem dominicana era uma das mais influentes daquele tempo e também por isso a que gerava mais polémica, pois os dominicanos estavam à cabeça da Inquisição. Por bula papal de Inocêncio VIII foi declarado que muitos homens e mulheres se haviam desviado do caminho de Deus e agora se juntavam em grupos com práticas menos próprias onde abundava o pecado da carne e a magia. Foi assim que começou a caça às bruxas com acusações a pessoas inocentes, muitas vezes para retirar atenções sobre o próprio denunciante e outras, para mostrar temor a Deus. Os dominicanos eram a polícia do Papa e da Inquisição embora, e como foi dito, a sua forma fervorosa de pregar e o conteúdo dos seus discurso fosse visto pelos habitantes dos Países Baixos (que depois se tornaram protestantes), como obsessivo e doentio. Não era uma Ordem levada muito a sério nem pelo povo nem pela justiça e daí a escolha de Bosh. Ao colocar o ladrão na posição de dominicano ele mostra que os dominicanos criavam os males de que se valia a Inquisição, dizendo por isso que de facto a bruxaria não existia – tese defendida também pelos humanistas da época – e que era uma criação dos próprios dominicanos para mostrar expediente ante o Papa.

Hieronymus Bosch
The Magician (pormenor)
1475-80
Musée Municipal, Saint-Germain-en-Laye


Como vimos, o frade puxa a bolsa de um homem com a boca aberta. Parece-nos um homem, até porque neste tipo de situações, são os homens quem se oferece para ver e ser cobaia. No entanto o suposto homem traz consigo uma chave amarrada à cintura, prática que era atribuída às mulheres e não aos homens. Aliás, segundo as regras da Inquisição as mulheres eram mais frívolas e vulneráveis que os homens e por isso estavam mais predispostas à acção do diabo. O diabo podia operar nelas transformações de compleição para atingir os seus fins. Digamos então que o homem frente à mesa e a quem é roubada a bolsa, não é um homem, mas uma mulher.

Hieronymus Bosch
The Magician (pormenor)
1475-80
Musée Municipal, Saint-Germain-en-Laye


Hieronymus Bosch
The Magician (pormenor)
1475-80
Musée Municipal, Saint-Germain-en-Laye


O mágico do outro lado da mesa não lhe toca, não toca na mulher e no entanto faz com que ela fique de boca aberta e com um sapo dentro da mesma, apenas com o olhar. Também segundo os dominicanos, o diabo conseguia influenciar as pessoas apenas com o olhar pois o seu olhar infectava o ar. O pintor introduz na personagem do mágico uma outra crítica social através do seu chapéu. Tal como vemos, o chapéu alto e negro é usado apenas pelo mágico, que diga-se, apesar da sua profissão, era um homem do povo como ou outros que ali estão retratados. Não era então um chapéu daquela classe social, mas sim da corte da Burgúndia, tendo-se mais tarde generalizado até à restante população sendo por isso usado pela burguesia abastada. Isto aconteceu no início do século XV; ou seja, era moda entre aqueles que faziam a moda, usar este tipo de chapéus. Mas como esta pintura data do final do século XV, isso quer dizer que por esta altura a moda do chapéu alto já não era apanágio dos ricos, mas apenas dos vagabundos que procuravam assim alcançar a moda e receber de volta algum respeito do povo. A crítica social presente na pintura é notória não por causa do chapéu, não porque um homem está a fazer-se passar por aquilo que não é, mas porque estabelece uma ligação com o hábito dominicano. Assim como os dominicanos introduziam o pecado e forçavam-no porque tiravam dividendos do mesmo, Bosch liga o poder político (a corte dos Habsburgo, fiel ao Papa e substituta da da Burgúndia), à corrupção pois quanto mais contribuísse para a glória papal, melhor seria a relação entre Igreja e Estado.

Hieronymus Bosch
The Magician (pormenor)
1475-80
Musée Municipal, Saint-Germain-en-Laye

O homem é de facto um mágico: de olhos pequeninos a hipnotizar a mulher, capaz de fazer o seu animal amestrado (um cão) saltar dentro do aro encostado à mesa, e possuidor de tanta inteligência quanto a coruja que traz à cintura. Há quem defenda que se trata de uma espécie de macaco e há quem diga que se trata de uma coruja e a mim parece que a segunda hipótese é a mais adequada à cena já que a coruja simboliza a inteligência e a sabedoria, mas também está conotada com a noite e com as trevas e por isso tem uma relação directa com a bruxaria. (Já desde a civilização Helénica que se pensava que as bruxas, não obstante todo o racionalismo dos gregos, tomavam a forma de corujas e de noite sugavam o sangue dos bebés. E lá estamos nós a ir para a “vampirada” outra vez. Deus nos livre e guarde!).
Hieronymus Bosch
The Magician (pormenor)
1475-80
Musée Municipal, Saint-Germain-en-Laye


Hieronymus Bosch
The Magician (pormenor)
1475-80
Musée Municipal, Saint-Germain-en-Laye

Este mágico, se não está ligado à Alquimia, uma vez que na Alquimia existem várias interpretações para o mesmo símbolo e estas podem até ser contraditórias, está pelo menos ligado à Astrologia, ou ao que deu início à Astrologia. Os planetas conhecidos foram relacionados com uma actividade e a Lua estava ligada precisamente a uma imagem como esta. Esta é que é igual à que existia, mas não deixa de ser curioso ver o mesmo tipo de mesa e os mesmos apetrechos. Aliás, esta imagem do mágico atrás da mesa a fazer os seus truques aparece igualmente numa carta de Tarot denominada “O Mago”, bem como o casal lá atrás – ele com a mão no peito dela, carta essa que se chama “Os amantes”.

- não vai mais vinho para essa mesa -


[na Intimissimi]
- Bom dia. Queria este modelo no n.32, por favor.
- Não temos. Este modelo nunca existiu no 32. Existe a partir do 34.
- A sério? Eu sempre levei o 32.
- Pois, diz aqui 32, mas este modelo é na realidade um 34. Sabe, é um modelo feito para pessoas com muito peito, tem uma forma que "achata" o peito, se assim quisermos dizer.
- Ahhhh... Isso explica muita coisa
- o carteiro -

[notícias do mundo da arte e assim]

- a coisa está preta e com uma leves pinceladas de cor de quando em quando
Segundo o WSJ os museus americanos viram aumentar o número de vistantes, mas diminir a receita. Segundo um estudo, não obstante a crise mundial, 57% dos museus americanos tiveram um aumento significativo de visitantes no ano de 2009. Os mais beneficiados foram os museus que fazem a divulgação científica e tecnológica, sendo que destes 81% declarou esse aumento. Já em relação aos chamados museus de arte, cerca de 50% também sentiu o crescimento no número de vistantes e todos eles dizem que o aumento se situa entre os 5 e os 20%. No entanto mais vistantes não significa necessariamente mais receitas. Os museus, para não perderem de vez visitas, acabaram por ter de cortar no preço das entradas e fazer campanhas especiais, alguns não aumentaram o preço dos bilhetes e cerca de 34% dos museus visados no estudo não cobrou sequer bilhetes. Tudo isto resultou em menos lucros e em cerca de 18% dos museus americanos em maus lençóis financeiros.
- ele há coisas... estúpidas
E há quem pague para ver isto... ou se calhar é de graça. Já imaginou um museu sobre algo que não se vê? Pois em Inglaterra imaginaram, e criaram, o museu do vácuo. Fica em Nottinghamshire e dedica-se ao estudo da higiene doméstica moderna. E o museu do OVNI? Fica em Istambul e tenta recriar o ambiente em que os OVNI's aparecem, mostra relatórios e documentários e é feito para quem acredita em vida extra terrestre. O Museu da Salcicha fica em Holzhausen, Alemanha e é dedicado à mesma, o Museu da Barata (é verdade!) no Texas mostra baratas mortas e vivas doadas por muitas pessoas, o Museu da Sanita fica em Nova Deli, na Índia e presume-se que mostre a história escatológica do mundo, o Museu da Tortura situa-se em Amesterdão no Red Light District e deve ser para quem gosta de acessórios s/m, o Museu da Lancheira fica em Columbus, Georgia, EUA e exibe mais de 1000 lancheiras e marmitas; segue-se o Museu do Esgoto em Paris e vá-se lá saber porquê, mostra até as fardas vestidas para tratar dos esgotos, o Museu do Cabelo fica na Turquia e eu nem quero pensar como aquilo será mórbido, o Museu da Mostarda situa-se no Wisconsin, o Museu da Roupa Interior das Celebridades fica em Bruxelas (e deve haver muita gente a desejar ter lá umas cuequinhas), o Museu do Míssil de Titânio fica no Arizona e o Museu do Lápis de Cor situa-se em Inglaterra. Para conferir aqui.
- curtas e boas
Julianne Moore na capa da T Magazine
Homenagem ao ido Alexander McQueen

segunda-feira, março 01, 2010

- o carteiro -
estive ali a ver um documentário sobre a Marilyn e não tive tempo de escrever. fica para amanhã.