quarta-feira, setembro 23, 2009
antes e depois ou como os filmes do Hitchcock, vistos cinco vezes, ainda têm mais coisas para contar, ou como já não é a primeira vez que falo dos filmes dele (principalmente "A mulher que viveu duas vezes" e a "Chamada para a Morte") ou como isto não é tudo porque a obra continua actual e porque podemos analisá-la ao nível dos sapatos, da semelhança entre planos inovadores daquele tempo e os planos da Comunicação Social, ao nível das jóias, da influência sobre os pintores e dos pintores (principalmente Dali em "Spellbpound" - com quem Hitchcock se incompatibilizou - e Magritte) e muito mais. Já não é a primeira vez que a Mattel faz uma Barbie para coleccionador com uma temática como a Barbie Mary Poppins ou a Barbie Grease. A razão para ter postado este "antes e depois" e não outro (tenho um caderninho de anteses e depoiseses) prende-se com uma leitura que estava a fazer um dia destes. O livro falava de uma tríade na cinematografia de Alfred Hitchcock que contemplava por esta ordem os filmes "Intriga Internacional", "Psico" e "Os Pássaros". Neste último, o primeiro ataque de um pássaro dá-se quando Melanie, depois de ter vindo da pequena doca frente à casa do seu amante (depois de ter deixado lá dentro dois pássaros engaiolados para a filha deste), regressa a Bodega Bay no mesmo barco a motor. Ela contempla-o de cada vez mais perto e não se apercebe, assim como cada um de nós, devido ao plano em que a cena foi filmada (ver aqui aos 06m e 04s), da aproximação de um pássaro, do lado esquerdo do ecrã, que desce até à sua cabeça e a bica. Ora este plano lembra de imediato um outro, bem mais trágico e que corrobora a expressão "a vida imita a arte": o das primeira imagens do segundo avião a atingir o World Trade Centre a 11 de Setembro de 2001, imagens essas captadas quase do chão, como um quadro barroco cuja perspectiva se expressa "di sotto in su", "de baixo para cima". Vemos como a entrada no plano do avião vindo da esquerda, surpreende a pessoa que está cá em baixo e é tão rápido que quase só em câmara lenta (ver aqui) percebemos do que se trata.
Pois o livro referia que o embate dos aviões com as torres sujava completamente a paisagem de Nova Iorque e que a relação com estes três filmes de Hitchcock se explicava a nível iconográfico. Primeiro, em "Intriga Internacional" o avião (como um pássaro gigantesco) ataca Cary Grant numa estrada junto a um campo de milho em Midwest (05m e 43s). Depois, em Psycho vemos como o quarto de Norman Bates está cheio de pássaros embalsamados (02m e 56s), que representam o meio-termo entre o avião (o pássaro grande ou muitos pássaros) para o que se passa em "The Birds", o ataque de um pássaro ou de vários pássaros vivos.
Alfred Hitchcock
The Birds
1963
Mattel
Barbie, The Birds
2008
Sombra virtual – a sombra acessória de um ponto, cujo único propósito é servir de denominador comum entre duas sombras reais projectadas em planos de projecção diferentes. Uma sombra real projectada no PHP e uma sombra real projectada no PFP não podem ser unidas. Usa-se a sombra virtual para encontrar o ponto de charneira, a “plataforma de entendimento” entre duas sombras.
Estes dois conceitos do desenho e da Geometria Descritiva, embora difíceis de compreender sem recurso à folha, ao aristo e ao lápis são o paradigma daquilo que hoje constitui a forma como a maior parte das pessoas vive as aplicações ciberculturais.
Antes de avançar neste post devo dizer que:
- Sou a pessoa mais suspeita para falar deste assunto pois vivo no medo constante de não ser fisicamente aquilo que esperam de mim.
A razão pela qual não concordo com o Facebook e porque o mesmo padece de vários “males”: é narcísico, viciante e ilusório. É narcísico porque necessita da aprovação do outro, do comentário alheio. Como os diálogos se fazem a dois, é sempre obrigatória a presença de outro. Quando esse outro não aparece experiencia-se a sensação de desilusão, de abandono, de ausência de um feed-back. Parte-se, com o objectivo de provocar esse feed-back, para as observações de cariz intimista e pessoal que criam quase sempre a piedade alheia. E embora não se procure a piedade, à falta de melhor, toma-se esta esmola como algo positivo (voluntário e sincero) criando-se assim um ciclo vicioso. Funciona esta auto-estima in vitro ao mesmo nível das endorfinas, só que tomada em doses para mamute.
A quem argumenta que o mesmo se passa, ou pode passar nos blogs (falo da minha experiência apenas. Nunca tive Hi5, Orkut ou conta de Messenger), a verdade é que isto se passa numa aplicação que supostamente serve para “fazer amigos” ou recuperar “amizades perdidas” pelo tempo. Que tipo de intimidade podemos estabelecer com amigos com quem não temos contacto desde a saída de circulação do escudo e, ainda mais, com amigos acabadinhos de fazer, daqueles que ainda estão quentinhos? E para os amigos que estão apenas distantes fisicamente? Onde está o postal, a carta, o telemóvel e, por muito que me custe chegar a este degrau na enumeração, a impessoalidade do mail? Há uma facilidade falaciosa em falar com aquele que não conhecemos, ou com o que acabamos de conhecer, em detrimento daquele que nos está no sangue ou na memória. É ou não verdade que preferimos a legitimação do desconhecido do que a do conhecido? A reprovação do desconhecido em detrimento da legitimação do conhecido? A coibição de qualquer um deles ao marcar do número de telemóvel de um amigo que mora a poucos quilómetros de nós?
O Facebook facilita um certo facticismo gestual que cria a ilusão de vida real ao fazer com que os intervenientes, com a esperança do elogio do outro, o elogiem de volta. Assim observa-se um diálogo óbvio que consiste na troca de encómios, como requer a falsa conversação. No dia-a-dia, quando um desconhecido que espera connosco pelo comboio nos vê tiritar de frio diz: “hoje está mais frio, não é?”, é óbvio que iremos responder qualquer coisa como “é, arrefeceu muito.” Há um código instituído desde tempos imemoriais que faz com que este diálogo vago e feito de factos do conhecimento geral subsista no tempo. Não cria amizades, mas permite fazer a manutenção das normas vigentes que sendo um aborrecimento ou não, dão-nos a possibilidade de viver em sociedade de uma forma saudável. Já no Facebook nota-se por parte de muitos utilizadores que na troca de palavras com os amigos antigos e reencontrados, ou com os amigos novos e desconhecidos, faz-se o percurso inverso. Há um grau de conhecimento mútuo (ou presume-se que esse grau exista e todo o diálogo é orientado nesse sentido) e por consequência a troca de confidências e elogios factuais, que podem ser dirigidos em específico àquela pessoa ou não, e levam à ilusão de cumplicidade. Assim é possível ter no Facebook 400 amigos absolutamente desconhecidos, só pelo prazer do acumular, pela necessidade de reconhecimento geral e por salvaguarda de possíveis candidatos a carpideiras caso se mostre necessário, e na gare do comboio nenhuma resposta à mini provocação “está mais frio”.
Aceito todas as críticas, caso exista alguma, e respondo pelas minhas palavras. Reconheço que a reserva em me mostrar, em me encontrar na vida real com alguns dos que aparecem aqui, se deve à minha insegurança e que por isso o meu exemplo pode não ser entendido como concordante com o acima escrito. Mas a razão para não ter 400 amigos e apenas 5 é porque só tenho capacidade para retribuir com o máximo de honestidade a estes cinco. Desculpem o tom duro.
P.S. (salvo seja!) – Não considero o Twitter pois é um GPS para sub-16 com espelho incorporado.
terça-feira, setembro 22, 2009
sábado, setembro 19, 2009
quinta-feira, setembro 17, 2009
I turn sideways to the sun
keep my thoughts from everyone
It's a jungle, I'm a freak
Hear me talk, but never speak
So I'm stepping out of time
because breaking is a crime
And it may all be too late
but I've no passion for this hate
That's the price of love (that's the price of love)
Can you feel it (can you feel it)
If we could buy it now (that's the price of love)
how long would it last (that's the price of love)
And when this building is on fire
these flames can't burn any higher
I turn sideways to the sun
and in a moment I am gone
That's the price of love (that's the price of love)
Can you feel it (can you feel it)
If we could buy it now (that's the price of love)
how long would it last (that's the price of love)
...
(World, New Order)
Andreas Cellarius
Influência da Lua na procriação
Cosme Viardel
Charles Joseph Natoire
Boreas and Orinthyia
1741
Indianapolis Museum of Art
Ticiano
Danaë
1553
Hermitage, São Petersburgo
Triptych of Garden of Earthly Delights
1500
Museo del Prado, Madrid
A ideia que as crianças nascem das couves está relacionada com esta associação entre os frutos e os vegetais e a fertilidade, mas também com a falta de argumentos para explicar às pessoas - às crianças em especial - de onde é que elas nascem. Dizia-se que vêm de França transportadas pela cegonha. Aliás, os franceses utilizam muito os nomes dos vegetais como "mon chou" (minha couve) para se referirem a algo querido ou pequeno ou que amam. Por outro lado, embora essa seja uma realidade que nos é distante, para o paganismo a couve era utilizada para designar o órgão sexual feminino. Associam as duas coisas por causa do cheiro (eu nem sei o que dizer) e por causa do desenho da couve quando cortada.
hipócrates
antes e depois literário. Depois da lenda do Rei Salomão e da sua sabedoria que fez com que uma criança fosse poupada. Brecht repete a fórmula em "Círculo de Giz Caucasiano", cujo excerto apresento em inglês devido à impossibilidade de encontrá-lo em português. Esta peça para teatro de Brecht conta a história de uma mulher, servente, que fica a tomar conta de uma criança herdeira depois da mãe a ter abandonado. O papel de Salomão cabe aqui ao juíz Azdak. Mesmo que não leiam, sempre fica o post:
"Então vieram duas mulheres prostitutas ao rei, e se puseram perante ele. E disse-lhe uma das mulheres: Ah! senhor meu, eu e esta mulher moramos numa casa; e tive um filho, estando com ela naquela casa. E sucedeu que, ao terceiro dia, depois do meu parto, teve um filho também esta mulher; estávamos juntas; nenhum estranho estava conosco na casa; somente nós duas naquela casa. E de noite morreu o filho desta mulher, porquanto se deitara sobre ele. E levantou-se à meia noite, e tirou o meu filho do meu lado, enquanto dormia a tua serva, e o deitou no seu seio; e a seu filho morto deitou no meu seio. E, levantando-me eu pela manhã, para dar de mamar a meu filho, eis que estava morto; mas, atentando pela manhã para ele, eis que não era meu filho, que eu havia tido. Então disse à outra mulher: Não, mas o vivo é meu filho, e teu filho o morto. Porém esta disse: Não, por certo, o morto é teu filho, e meu filho o vivo. Assim falaram perante o rei. Então disse o rei: Esta diz: Este que vive é meu filho, e teu filho o morto; e esta outra diz: Não, por certo, o morto é teu filho e meu filho o vivo. Disse mais o rei: Trazei-me uma espada. E trouxeram uma espada diante do rei. E disse o rei: Dividi em duas partes o menino vivo; e dai metade a uma, e metade a outra. Mas a mulher, cujo filho era o vivo, falou ao rei (porque as suas entranhas se lhe enterneceram por seu filho), e disse: Ah! senhor meu, dai-lhe o menino vivo, e de modo nenhum o mateis. Porém a outra dizia: Nem teu nem meu seja; dividi-o. Então respondeu o rei, e disse: Dai a esta o menino vivo, e de maneira nenhuma o mateis, porque esta é sua mãe."
(1 Reis 3, 16-27)
Azdak: Plaintiff and defendant! The court has listened to your case, and as come to no decision as to who the real mother of the child is. I as Judge have the duty of choosing a mother for the child. I'll make a test. Shauva, get a piece of chalk and draw a circle on the floor. Now place the child in the centre (criança sorri para a mãe adoptiva). Paintiff and defendant, stand near the circle, both of you. Now each of you take the child by a hand. The true mother is she who has the strenght to pull the child out of the circle towards herself.
hipócrates
A Single Man the Tom Ford (sim, o ex da Gucci), conta a história de um professor que após a morte do seu amante tenta levar uma vida normal contando para isso com a ajuda de uma amiga. Com Colin Firth e Julianne Moore (que já antes tinha feito de esposa de um homossexual em "Longe do Paraíso" e em 2010 fará dupla lésbica com Annette Bening). O filme já ganhou o Queer Lion para melhor filme gay. Let´s look at a trailer...
[2]
O semanário NME chega às bancas com treze capas diferentes, todas elas com fotografias dos Beatles. São 13zinhas, para coleccionador ver e para comemorar a chegada de mais um disco de homenagem à banda. Apressem-se porque só há 100o cópias.
Houston, tenho a informação de que já não há nenhuma...
A indústria da música põe a render a sua eterna galinha dos ovos de ouro. "Mailo" Elvis e o Jackson.
[3]
Não era bem isto que eu queria postar, mas cá vai o "poder do marketing"
[4]
Depois da "asfixia democrática" (MFL dixit) e da "eutanásia social" (Portas dixit), aconselho o BE a apropriar-se dos possíveis temas fracturantes que podem dar mais do que soundbytes na campanha. Podem dar, quando agrupados, maus bitaites:
- a pedofilia partidária comunicada pela CNE a propósito do caso do MMS
- aborto cultural ou procriação cultural presidencialmente assistida
- homicídio agrícola em primeiro grau
- agilização do divórcio entre o trabalho e o emprego
- violação educativa ("ya, estivestes a ver?)
Uma vez um portuguez à vez
tinha medo de ser alegre
e um portuguez de vez
vergonha de ser diferente
Ambos tinham inveja
de um terceiro portuguez
que era burguez
Ora o facto levou o primeiro
portuguez à loucura
e o segundo à estupidez
Ao saber disto um quarto
portuguez que ia a passar
mandou dizer que se sentia
imensamente feliz.
(Joaquim Castro Caldas, Parábola da pequenez)
quarta-feira, setembro 16, 2009
domingo, setembro 13, 2009
sexta-feira, setembro 11, 2009
Compare the best of their days
With the worst of your days
You won't win
With your standards so high
And your spirits so low
At least remember ...
This is you on a bad day, you on a pale day
Just do your best and don't ...
Don't worry, oh
The way you hang yourself is oh, so unfair
See the best of how they look
Against the worst of how you are
And again, you won't win
With your standards so high
And your spirits so low
At least remember ...
This is you on a drab day, you in a drab dress
Just do your best and don't ...
Don't worry, oh
The way you hang yourself is oh, so unfair
Just do your best and don't ...
Don't worry, oh
The way you watch yourself is oh, so unfair
Just do your best and don't ...
Don't worry, oh
The way you hang yourself is oh, so unfair
Just do your best and don't ...
Don't worry, oh
Do your best and don't ...
(Do your best and dont worry, Morrissey)
A Segunda Escola de Fontainebleau , entre 1530 e 1590 é claramente influenciada pelo estilo Maneirista, com as suas cores vibrantes, corpos sensuais e as formas alongadas. Uma das pinturas que representa bem este estilo é esta, a de Gabrielle d'Estrées e a sua irmã Julienne duquesa de Villars. As duas mulheres aparecem num "meio-nu"; ou seja, apenas despidas da cintura para cima, o que já nem era considerado escandaloso para a época. Nisso, a sociedade retrocedeu: há algum tempo atrás, uma exposição de Cranach em Londres levantou polémica porque os cartazes da exposição espalhados pelo metro de Londres mostravam algumas pinturas de nus do artista e claro, houve quem se insurgisse! Durante o Renascimento as pinturas de nu tornaram-se relativamente banais, fossem elas retratos de Adão e Eva, de personagens mitológicas ou até, como neste caso, de personagens reais (reais nos dois sentidos). Claro que estas senhoras estavam mais ou menos habituadas a andar nestes trajes, ou com qualquer coisinha em cima apenas, uma vez que, segundo se sabe, Gabrielle era amante do rei Henrique IV, o primeiro monarca da dinastia de Bourbon, conhecido como "O Bom Rei". As duas senhoras estão numa banheira como se estivessem na boca de cena de um teatro: repare-se nas cortinas em vermelho vivo que as emolduram! Ao fundo, a única pessoa vestida do quadro, provavelmente uma serva, encontra-se a trabalhar, debruçada. A sua posição e o seu anonimato mostram-nos o quão longe ela está do contexto: é quase como se a senhora não fosse importante para o quadro ou como se a sua presença viesse colocar em evidência a nudez que grassa o quadro. Algo que corrobora este meu pensamento de que o até o inanimado colabora com a nudez, é a fogueira acesa e sobre ela, um quadro dentro do quadro que mostra as pernas de um homem nu quase como complemento ao tronco nu das senhoras.
Gabrielle e a sua irmã são muito magras, reflectindo em certa medida o ideal de beleza do Maneirismo. A pele também é muito pálida e totalmente uniforme, o que nos pode indicar a presença de algum tipo de cosmético, porque nisto da pintura e da fotografia não há milagres: as pessoas têm poros e sinais e imperfeições. Embora também fique inebriada por um rosto e um corpo imaculado, temos de destrinçar as coisas. A pele pálida, muito branca mesmo era um sinal de beleza e riqueza, uma vez que só ficava moreno quem trabalhava de sol a sol nos campos. Esses eram pobres, tinham a pele curtida pelo Sol. Os ricos não trabalhavam, viam trabalhar. Nota-se aqui que os cosméticos foram aplicados tantos nos mamilos destas duas mulheres (não têm aréola, a parte mais escura e redonda à volta do mamilo) como nos rostos (bocas pequenas e vermelhas, blush nas maçãs do rosto...). Embora segundo os padrões de hoje nada nos indique isso, Gabrielle era considerada uma das mulheres mais bonitas de França, graças à sua pele pálida, às feições delicadas, ao peito em forma de maçã e ao cabelo loiro, provavelmente artificial. Julienne segura o mamilo da irmã Gabrielle apenas com dois dedos: a intenção dela não é agarrar o mamilo, mas mostrá-lo utilizando para isso apenas dois dedos. Isto pode levar-nos a pensar numa relação lésbica e incestuosa entre as duas, mas para a maior parte das mulheres, a mesma cena não é muito estranha, uma vez que é sabido que as mulheres são muito mais físicas umas com as outras do que os homens uns com os outros. Neste caso, não é uma questão erótica nem de amizade: o quadro é uma provocação social! Julienne aperta o mamilo da irmã para ver se deste sai leite, indicando assim que a amante do rei estaria grávida dele. Esta insinuação poderia ficar por aqui, sem qualquer alusão ao rei, não fosse a própria Gabrielle segurar entre os seus dois dedos, num gesto semelhante ao da irmã, o anel de coroação do monarca. O seu ventre escondido nada indica, mas no mesmo ano da pintura, Gabrielle deu à luz e ao rei um filho de seu nome César. Para além de César, deu ao rei mais três filhos, mas morreu apenas com 25 anos.
Já Miguel Villalobos é um daqueles fotógrafos que consegue que mesmo os mais cépticos e avessos à fotografia, cedam perante o convite dele ou até, peçam para o fotógrafo os imortalizar. Acho que ele faz muito bem aquilo que faz (sigam o link e vejam). Aqui, num conjunto de fotografias para a revista Slurp, foi possível "apanhar" Ugo Rondinone e Maurizio Cattelan a reproduzir num estilo Cindy Sherman (uso dos postiços no corpo) a pintura da escola de Fontainebleau. Os dois artistas são provocadores por natureza. Cattelan cujas obras nos fazem rir, mas não sabemos se esse é o seu único propósito, tem como objectivo fazer-nos rir... de nós próprios. O que ele faz é não endeusar nenhum regime ou área: cultural, social, religiosa, política, e fazer piadas com a nossa capacidade de piedade ou a forma como nos levamos tão a sério (substituindo animais por pessoas). Já Ugo Rondinone trabalha com vários meios: pintura, vídeo, instalação, fotografia, desenho, e em várias direcções; ou seja, tanto pode trabalhar em grande como em pequena escala, a partir da natureza ou da sua imaginação. O que importa no seu trabalho é que tudo o que existe no mundo, quando recontextualizado pode provocar emoções ou sensações físicas em quem observa.
Master of the Fontainebleau School
Gabrielle d'Estrées and one of her Sisters
1595
Musée du Louvre, Paris
Se hoje para ter um filho é necessário haver apenas um espermatozóide e um óvulo, estando implícita a ideia de que tem de existir uma vagina e um pénis e por conseguinte, penetração, quando não havia estas modernices, a geração de uma criança passava obrigatoriamente pelo coito, ou como se dizia, coitu penis et cunni. Existia então a necessidade de contacto físico, de coexistência espacial, enquanto hoje sabemos que basta os fluidos se envolverem, não implicando essa envolvência a presença dos respectivos donos. Ainda hoje porém o nascimento é um mistério: o número de coisas e a variedade delas que pode existir na concepção de uma criança é tão grande que certos médicos dizem que um nascimento é um milagre. Se houve coisa que sempre me intrigou, para além do gira-discos, foi o parto natural. E se hoje associamos o coito à satisfação física de duas pessoas (na melhor das hipóteses) e/ou à fecundação, demorou muito ao Homem relacionar uma coisa com a outra. O Homem tinha relações sexuais porque via outro ser igual a ele, com as costas arqueadas que se encaixavam perfeitamente no seu tronco arqueado, a lavar num rio, acocorado, ou a catar outro ser. Mas o Homem não percebia que o seu acto é que era o responsável pela saída, após nove meses, de uma criança do útero da sua mãe. Atribuía por isso um papel mágico à mulher, pois era esta que transportava dentro de si o pequeno ser, e era dela que ele saía a rastejar.
Assim filósofos, padres, fisiólogos, doutores e sábios apressaram-se a encontrar uma norma que regulamentasse as relações sexuais. Nessa norma estava escrito o tamanho que o pénis deveria ter, o número de vezes em que era aceitável ter relações sexuais (não sei se por semana, se por mês ou por ano), a continência que se devia ter no sexo (sexo, mas pouco), quais as posições amorosas que devem ser banidas e quais as que são mais dignas, quais as consequências do sexo para o marido e para a mulher, qual a estação do ano mais propícia para procriar, qual o momento do dia (se de barriga cheia ou em jejum). De lado, vistas como acessórias e por isso prejudiciais ficaram as carícias, a masturbação a dois, as posições menos dignas, a relação sexual durante a menstruação (razão pela qual nasceriam crianças com lepra ou ruivas) e que já existia no Antigo Testamento, o sexo desenfreado e o desejo ardente. Quem não obedecesse a estas regras, principalmente as mulheres pois eram tidas como incitadoras de tudo o que era negativo, como se o seu útero fosse a casa do Diabo, era ameaçado com o fantasma da esterilidade, o aborto espontâneo e o nascimento de crianças com todos os tipos de deficiências.
O casamento era assim a única forma de ter relações sexuais com o aval divino, desde que não constituísse fonte de prazer para que as praticava e para além disso, fosse a origem de uma nova vida. Por isso, problemas como a frigidez ou a impotência eram, até há pouco tempo, causa de anulação de um casamento. Segundo a Igreja de hoje, um casamento pode ser anulado se o homem for impotente, mas não se for estéril. É que mesmo não podendo ter filhos, o homem estéril consegue ter uma erecção, logo consegue consumar o casamento. Já o homem impotente não consegue ter a erecção, logo não pode consumar. Como vemos, para a Igreja a questão do casamento entre pessoas de sexos diferentes não está na procriação, não é esse o seu propósito, mas na capacidade de ambos os membros poderem ter sexo, dê lá por onde der.
Na Grécia Antiga e até ao século XVIII a fecundação era explicada segundo os princípios de Hipócrates e de um seguidor seu, Galeno. Para Hipócrates o embrião resultava da união de duas sementes, a semente masculina e a semente feminina, ambas colocadas no interior do útero. Para Galeno havia uma emissão de esperma tanto por parte do homem como por parte da mulher, mas neste encontro de esperma, a semente feminina era mais fria com vista a aquecer a semente masculina. Havia no entanto questões às quais os médicos gregos respondiam com menos clareza no raciocínio. No que diz respeito à produção de esperma, por exemplo, os médicos gregos, Platão e os pitagóricos acreditavam que era feita no cérebro, descia pela espinal-medula e alojava-se nos testículos que serviam apenas de simples reservatórios. Por razões como esta as ramificações auriculares da artéria temporal chamam-se ainda hoje canais espermáticos. Já para outros médicos como Anaxágoras e Demócrito, a semente é produzida um pouco por todo o corpo teoria esta muito útil pois pode explicar a hereditariedade a todos os níveis. Em 1563 continuava a acreditar-se nisto, se tivermos em conta o que o professor italiano Niccolò Massa defende: que todas as partes do corpo contribuem para a produção da semente, sendo que uma delas produz uma parte muito importante do todo, parte essa chamada "licor". Para este professor os licores juntam-se nos testículos sem se misturarem. E esse todo é que constitui a semente. Mas no útero os licores dispersam-se para formarem os diferentes órgãos. Engenhoso, não?
480 and 460 a.C.
Antoine van Leeuwenhoek
hipócrates
[mas isso agora não interessa nada]
Tanto o governo chileno como a ASO (Amaury Sport Organisation) e mesmo os ambientalistas e os arqueólogos estão de acordo num ponto: o rally foi muito lucrativo para o Chile e para a Argentina. E aqueles que defendem a preservação de locais de interesse arqueológico já se mentalizaram que muito provavelmente o rally veio para ficar. No entanto não podem deixar de defender que os danos podem ser minimizados que existir uma cooperação entre o governo, a organização do rally e eles próprios, com vista à alteração da rota. Por mais benevolentes que tentem ser, os arqueólogos fizeram notar que quatro dos locais assinalados como sendo de interesse arqueológico se encontram na região de Atacama e outros dois na região de Coquimbo. E que nesses mesmos locais tinham sido descobertos vestígios importantes de arte pré-columbiana que ficaram destruídos após a passagem da corrida. Os veículos destruíram objectos como facas, fragmentos cerâmicos e conchas, ossos humanos e cabeças de seta, datados de 9000 a.C. e 1500 d.C. No entanto, isto é apenas uma parte dos danos, uma vez que até agora apenas 10% do percurso foi analisado. Do outro lado, a organização e os concorrentes defendem-se dizendo que não obstante as regras apertadas para que os carros não passem perto das áreas assinaladas, as mesmas não estão sinalizadas. O que é certo é que nem para pedras nem plantas os gases emitidos pelos veículos são propriamente um Creme de la Mer.
Durante anos esteve exposto no Met uma pintura atribuída a Velázquez. Era o retrato de um homem de bigode com cerca de trinta anos e datava do século XVII, século de produção do autor. Só que não, quando obtida em 1949, a pintura foi dada como pertencendo à oficina de Velázquez (aquela coisa da produção em série que os pintores utilizavam muito para dar resposta às encomendas). Agora, um curador do Met vem confirmar que a pintura em questão é mesmo um Velázquez-Velázquez.
As razões para os peritos desconfiarem da autoria do quadro baseavam-se na patine deixada pelo tempo sobre a tela, o que fez com que a mesma ficasse sem cor e a palete de cores utilizada parecesse muito mais sombria do que as habitualmente utilizadas pelo pintor espanhol. Recentemente, quando o museu começou a catalogar as obras espanholas que tinha em sua posse, o conservador do museu olhou para a obra novamente e com outros olhos e descobriu que depois de anos de pó e sob camadas sucessivas de verniz e retoques com produtos que hoje não são os mais adequados, se encontrava um verdadeiro Velázquez. O retratado ainda é desconhecido, até porque a pintura é um estudo, não está acabada: a face e traje do homem estão terminados, mas a paisagem em pano de fundo não. Por outro lado, nada há na pintura que possa dizer que é Velázquez, embora exista no pintor uma tradição de pintar este mesmo rosto: vemo-lo n'"As Meninas" a vestir a pele do próprio pintor e no quadro “The Surrender of Breda” que comemora a vitória da Espanha frente à Alemanha, na margem direita da pintura.
Esta descoberta parece ser de extrema importância para quem se interessa por isto (eu!), uma vez que a produção artística do pintor, pelo menos aquela que se conhece e que pode ainda ser recuperada é muito pequena: só se conhecem cerca de 110 a 120 quadros de Velázquez. Esta descoberta – não a descoberta em si, mas o facto de se falar nela – é relevante para qualquer visitante. Por mim falo: se visitasse o Met e visse a tela ao lado de outras de Velázquez (talvez eu nunca fosse ver a sala dedicada ao Velázquez), nunca pensaria que poderia não ser da sua autoria. Isto é um abre-olhos. Quantas telas e bustos e livros e peças e peças estão mal atribuídas ou não têm valor, ou tal como as relíquias, são produzidas industrialmente. Não há possibilidade para o visitante questionar. Tal como no livro "Todos os Nomes" de Saramago, um morto não fala. Como posso eu saber que por baixo daquela lápide rezo ao meu morto e não ao morto de outra pessoa. Segundo a ética cristã, deveria ser a mesma coisa pois o bem que fazemos a um é como se fizéssemos ao Pai e "what goes around, comes around", mas segundo a nossa ética, mesmo após a morte, o morto continua a ser nosso.
O arquitecto Jean Nouvel recebeu um puxão de orelhas, que nunca é uma coisa boa de receber, mas no caso dele, é pior que mau. É que o "puxão de orelhas" foi dado pela Câmara de Nova Iorque, cidade para a qual o arquitecto tinha projectado uma torre um pouco maior do que aquilo seu seria desejado. Estamos a falar de cerca de 61 metros numa torre perto do Museu de Arte Moderna. Inicialmente o projecto de Nouvel dizia que a torre deveria ter o tamanho do Empire State Building (381 metros), sendo que este edifício é, após o 11 de Setembro de 2001 o mais alto da cidade de Nova Iorque. Na semana passada o Departamento de Planeamento urbano da cidade decidiu cortar os tais 61 metros pois, segundo Amanda Burden do mesmo departamento, a forma do edifício, que acaba em três picos não estava de acordo com a estética do edifício com o qual iria competir em altura. Para além disso, a torre de Nouvel eclipsava o Museu por completo. Mas há quem defenda a Torre de Nouvel tal como está uma vez que acompanha o espírito da Midtown para onde está projectada. O facto de Nouvel, assim como outros, desejar a sua torre tal como está, lembra a necessidade dos arquitectos deixarem a sua marca. E se há uma cidade propícia a isso é Nova Iorque. Se há uma zona propícia a isso, essa zona é a Midtown.
Eu estava no departamento a fazer um trabalho. Lembro-me de alguém ter dito que o WTC tinha sido atacado por dois aviões e que as torres tinham desabado. Pensei: "claro que desabaram! a construção na América é do pior, fazem tudo em pré-fabricado!". Isto não deixa de ser verdade hoje, mas já ninguém passará pela vida como se o mundo fosse o mesmo. Mesmo para aqueles para quem essa realidade parece longínqua, ela afectou toda a nossa vida. Tenho para mim que o fenómeno 11 de Setembro se tornou mais do que uma questão de justiça. É sem dúvida uma questão de dimensão da notícia. A forma como nos identificamos com a data, não tem só a ver com o facto de a termos vivido, de estarmos vivos no dia 11 de Setembro de 2001, mas por aquilo que nos foi mostrado. Porque é que é condenável o que alguns terroristas fizeram e não é condenável o que Kissinger fez ao ordenar o bombardeamento do Cambodja originando assim a morte de milhares de pessoas? Simone Weil dizia: "Há sempre um sentido ilimitado do desejo e estes, ao contrário dos limitados, não estão em harmonia com o mundo; pior, o nosso contacto com o bem, ao contrário das atitudes anti-éticas egoístas, sendo impulsionado por desejos de infinitude, visa o absoluto. A origem do bem tem um poder destrutivo tal que, para a nossa estabilidade pessoal, tem de parecer como mal. Por isso Cristo teve de morrer." O nosso desejo de encontrar a culpa apenas nos outros colide com a nossa culpa, pois embora nada possa justificar os ataques, eles tiveram uma dimensão mais simbólica do que numérica. Milhares de pessoas morreram, num só dia. E quantos milhares morreram num só dia na Europa ocupada? E quantos milhares morreram num só dia de conflito nos balcãs? E quantos milhares morreram num só dia na luta israelo-árabe? Quando um dia, ao ver Guernica um oficial alemão disse a Picasso: "Meu Deus, foi você que fez isto?", ele respondeu "Não, foram vocês que fizeram isto".
Há uns tempos, nuns subúrbios de Paris, um grupo de jovens emigrantes insurgiu-se, queimou carros e contentores do lixo, partir lojas e confrontou-se com a polícia após terem sido apelidados de escumalha pelo presidente francês Sarkozy. Mas porquê esta violência? E ainda por cima, porquê esta violência cujo alvo não é o governo francês, não é o presidente da república, não são as instituições, mas os bens de outros emigrantes. Porquê a violência terrorista oriental contra alvos ocidentais? Bom, facciosa a pergunta! A ser possível responder primeiro à questão bizantina de quem nasceu primeiro, se o ovo, se a galinha, podemos dizer que até quando os turcos ocuparam a Terra Santa, a violência dos Templários foi tal (respondendo a um apelo do Papa) que os próprios ficaram escandalizados e envergonhados com o que foi feito. Talvez durante séculos, as nações muçulmanas tenham aguentado, tal como os povos judeus, para exercerem a sua vingança. Quanto mais esperam, mais ostracizados eram e maior se tornava a sua raiva. Podemos também dizer que o caso não pode remontar até os primórdios, mas a verdade é que as relações entre o Oriente e o Ocidente eram relativamente pacíficas até aí. A pergunta continua a ser dúbia porque fala de orientais e ocidentais. Foi sempre possível dizer que alguém (um ocidental) era um "orientalista", sem qualquer dano para o mesmo. Os ocidentais aceitam como uma excentricidade o que vem do Oriente e a denominação continuava a ser uma forma de subjugar o Oriente. Não é possível porém a um oriental dizer que é um Ocidentalista. Isso seria ir contra as suas regras: quem não é pelo Oriente, é contra o Oriente. Porém, quando olhamos para as manifestações de rua acerca do caso das caricaturas de Maomé publicadas pelo jornal dinamarquês Jyllands-Posten notamos que esta civilização que supostamente traz a alteridade ao nosso quotidiano, é profundamente liberal e global. Passo a explicar. A maior parte dos muçulmanos que se manifestaram não tinham visto as caricaturas. O que isto quer dizer é que um fenómeno que acontece na Dinamarca une sob o mesmo pretexto nações tão díspares como a Dinamarca, o Líbano, a Indonésia, o Paquistão, etc. Todos eles estiveram juntos, ainda que de lados opostos da barricada, por causa de uma caricatura. Note-se também que quando os muçulmanos pedem, exigem respeito pela sua diferença, estão a protestar, a exigir direitos iguais na diferença, estão a pedir, no fundo e sem se darem conta, para serem tratados segundo os princípios básicos ocidentais. Acho que o desprezo a que os povos orientais votam os ocidentais é uma camuflagem, uma vez que é absolutamente normal que duas culturas se olhem de forma curiosa. Não há um fundamentalismo autêntico porque não há um desprezo autêntico, não há a ausência de ressentimento ou de inveja. O fundamentalismo islâmico está preocupado e intrigado com a vida, os usos e modos dos não-crentes. Não estão, de forma nenhuma afastados do outro que dizem desprezar.
Mas a vida não é fácil para eles. Quando as caricaturas saíram, a via do diálogo não foi facilitada isto porque o ocidente continua a sacralizar o Holocausto nazi e a não permitir que nenhum tipo de violência tenha uma importância superior a esse período histórico. O fenómeno contra o Oriente é de tal forma global e atinge as nações de forma tão encadeada que França, que se opôs à entrada dos EUA no Iraque viu as suas batatas fritas (french fries) simbolicamente sancionadas. O nome mudou para freedom fries. Ora os apoiantes da França e da sua decisão que se encontravam nos Estados Unidos tinham de trabalhar duplamente para encontrar uma solução que agradasse a "gregos e a troianos". E um ocidental que entrasse num restaurante ou pastelaria iraniana em qualquer parte do mundo saberia que os outrora bolinhos conhecidos por "bolos dinamarqueses" tinham sido substituídos, no nome e como sinal de protesto pela publicação das caricaturas por "rosas de Maomé". Os extremos tocam-se!
era só para dizer, no caso de me esquecer e esta tipa ganhar, que se apanho a Lady Gaga arranco-lhe os olhos com uma colher, compro-lhe um espartilho para a boca, jogo ao burro em pé com a cara de poker dela e aplico-lhe um clister de canto gregoriano. razão tinha a Roisin Murphy!
antes e depois
Roisin Murphy
You know me better
2007
Lady Gaga
Eh, Eh (Nothing Else I Can Say)
2009
Moloko
Sing it back
1999
Lady Gaga
Poker Face
2009
quarta-feira, setembro 09, 2009
sexta-feira, setembro 04, 2009
Entre por essa porta agora
E diga que me adora
Você tem meia hora
Prá mudar a minha vida
Vem, vambora
Que o que você demora
É o que o tempo leva...
Ainda tem o seu perfume
Pela casa
Ainda tem você na sala
Porque meu coração dispara?
Quando tem o seu cheiro
Dentro de um livro
Dentro da noite veloz...
(Vambora, Adriana Calcanhoto)
- Gira!!!
- Que gira que quê? Bem feita. Pelo menos no que dá para ver da saia. Para cima, não sei.
- Lá estás tu a desdenhar. É boa!
- Do que se vê! Do que se vê é boa, mas não é gira. Tira-lhe a maquiagem, o cabelo pintado e os acessórios e é uma pessoa como as outras! Sabes que mais, tu emprenhas pelos olhos!
- E tu, as mulheres todas, pelos ouvidos!
- Hã? Não ouvi.
a mulher de bigode ninguém o... *
Hairy Harry, Mad Peter and Tiny Amon
1598-1600
Museo Nazionale di Capodimonte, Nápoles
Anónimo
Petrus Gosalvus Hirsute Man
1580
Em 1585 Lavinia Fontana pintou o retrato de Tognina, filha de Petrus e irmã de Arrigo. Não a pintou como uma aberração pois há no retrato algo de muito solene, pelo menos na minha opinião. O rosto coberto de pelo é o que salta à vista, mas os olhos da rapariga são de um negro profundo, os lábios e o nariz apresentam-se muito delicados, bem como as mãos que não mostram qualquer sinal de hirsutismo. A cabeça tem também um ornamento sumptuoso e o vestido está detalhadamente pintado indicando algum luxo. Tognina Gonsalvus nasceu em 1572 e herdou do pai a doença de que temos vindo a falar. Ela era, à semelhança do seu pai e do irmão, requisitada como espécime para aulas em alguns gabinetes de curiosidades de nobres e monarcas em vários países da Europa. Eram também exibidos em festas promovidas pela corte como exemplos de algo negativo; ou seja, não eram tidos como excepções, mas como fruto, a face visível e corpórea de uma natureza intrinsecamente má. A prova de que há esperança neste mundo (ou que há gente com pouquíssima sorte, depende da perspectiva), é que Tognina se casou e deu à luz um filho peludo. Não nos enganemos: em muitos casos os homens que casavam com mulheres hirsutas faziam-no a troco de algo muito desejado como um título ou dinheiro ou fama. Em 1592 o caso de Tognina foi estudado pelo professor Ulisses Aldrovandi da Universidade de Bolonha que juntou o caso dos Gansalvus a muitos outros que tinha conhecido. Compilou estas histórias em livros ilustradas com desenhos e xilogravuras e, não obstante tratar-se de um médico deu ao livro o título de "História dos Monstros". Eu estou para aqui a falar, mas não sei como reagiria se visse um hirsuto. Hoje esta doença é muito frequente em países como a Índia, o Paquistão ou o México, onde o número de casos tem vindo a crescer.
Lavinia Fontana
Tognina Gonsalvus
1590
José de Ribera
La mujer barbuda
1631
Museo Tavera, Toledo
Juan Sánchez Cotán
Brígida del Río, la Barbuda de Peñaranda
1590
Museo del Prado, Madrid
Juan Carreño de Miranda
Eugenia Martinez Valleji, La Monstrua
Museo del Prado, Madrid
* por favor não completar