quarta-feira, dezembro 31, 2008

- o carteiro -

(por ordem alfabética):
- à ana clément, à ana farias, à ana teresa, aos anónimos, ao am, ao charlie, ao eduardo, aos etcs (aqueles de quem me esqueci), ao Jimi, ao joão barbosa, à ju, à maria, ao orlando, ao pedro, às ritas, desejo do fundinho do coração (ração, ação, ção, ão...) um bom ano de 2009.
- não vai mais vinho para essa mesa -

new year's resolutions:
- ser menos exigente comigo e com os outros
- apaixonar-me
- desemagrecer

quinta-feira, dezembro 25, 2008

poema pobrezinho
prá menina e pró menino
(que é como quem diz, para os leitores do Belogue)

Feliz Natal da Beluga
É o seu voto sincero
Eu que muito vos estimo
E que pós-festas vos espero

Não venham pr’adorar o Menino
Que muito o ama sua Mãe
Mas não caiam em desânimo
Porque eu vos amo também

Aqueles que se sentem sozinhos
Mesmo quando acompanhados
Sabei que o mesmo sinto
No meio de primos, tios, cunhados

Mas aqui mora a esperança
Que um dia de mansinho
Se sinta a felicidade
Sem Prozac e sem Menino

Também cá temos imaginação
Que serve para perceber
Que por não me querer quem desejo
Nada diminui a mulher

O poema é simplório
Não sou o Jorge de Sena
Se fosse não havia Belogue
O que seria uma pena.

segunda-feira, dezembro 22, 2008

- original soundtrack -

Natal que é Natal tem de ter esta música. tudo muito tradicional: boy meets girl, girl gets laid, boy meets strange haircut, girl gets preganant and fat, boy gets gay, boy gets a good place in the charts. é a história da vida de qualquer pessoa.

Last Christmas I gave you my heart
But the very next day you gave it away
This year to save me from tears
I'll give it to someone special

Last Christmas I gave you my heart
But the very next day you gave it away
This year to save me from tears
I'll give it to someone special - special

Once bitten and twice shy
I keep my distance but you still catch my eye
Tell me baby do you recognize me?
Well it's been a year and it doesn't surprise me

Happy Christmas

I wrapped it up and sent it with a note
Saying I love you I meant it
Now I know what a fool I've been
But if you kissed me now I know you'd fool me again

Last Christmas I gave you my heart
But the very next day you gave it away
This yeart to save me from tears
I'll give it to someone special - special

Last Christmas I gave you my heart
But the very next day you gave it away
This yeart to save me from tears
I'll give it to someone special - special

Oooh baby

A crowded room friends with tired eyes
I'm hiding from you and your soul of ice
My god! I thought you were someone to rely on
Me? I guess I was a shoulder to cry on

A face on a lover with a fire in heart
A man uncoverered but you tore me apart
Oooh
Now I've found a real love you'll never fool me again

Last Christmas I gave you my heart
But the very next day you gave it away
This year to save me from tears
I'll give it to someone special - special

Last Christmas I gave you my heart
But the very next day you gave it away
This year to save me from tears
I'll give it to someone special - special

A face on a lover with a fire in heart
A man uncoverered but you tore me apart
Oooh baby next year

I'll give it to someone special
I'll give it to someone special

(Last Christmas, Wham)
- não vai mais vinho para essa mesa –
Conversa verídica que ouvi:
- Boas tardes.
- …Boas tardes. Eh pá, bocê desculpe, estou a reconhecê-lo mas num sei donde.
- É do Alicantina ali no Campo Alegre.
- Ah pois é, pois é. Tá tudo bénhe*. Bocê desculpe, mas num taba a reconhecer.
- Num faz mal. Passear um bocadinho, num é?
- É.
- Eu tou de férias. E bocê?
- Eu tou de folga. Por acaso bi um anúncio onte* no jornal caté* pensei que era para lá, pró Alicantina.
- Queu saiba num bão meter ninguém. Tem a certeza que era para lá.
- A certeza num tenho, mas como pedio* um empregado de mesa e um cozinheiro, pensei que fosse pra lá.
- Náaõ. Debe ser para o outro.
- Para o Oxalá?
- Náão! Esse fechou.
- Pois, bem me queria parecer. Era muita fruta…
- Debe ser para o outro ali perto também.
- Qual outro?
- Aquele quem sobe para ir pró Teatro.
- Carágo, num tou a ber…
- Tá e ber o Oxalá?
- Tou… Ah, já sei.
- Pois é…
- Agora é assim. Eu inda trabalho lá, mas sabe como é: muitas regalias, a gente sai cedo e o camandro, mas a folha ao fim do mês num* é muita e a gente tá no Outono da bida. Tem de se preocupar com isso.
- Pois é.
- Há duas semanas fui fazer um casamento, foi só meter o tacho no forno e num dia fiz 200 euros!
- É dinheiro!
- Intão* num é! 200 euros para meter a comida no forno? Agora amanhã vou falar com a Dona Deolinda do Palácio Hotel.
- Ah, a Dona Deolinda. Conheço. Num é aquela que trabalha para o Hélio… Carágo, falta-me o nome.
- É. Trabalha para o Hélio Loureiro que é o cozinheiro da selecção. Um dia destes bi-o no supermercado e ele disse: “Eh pá, passa por lá ou mánda um mail.” E eu bou lá amanhã.
- Pois.
- É que a gente agora tem de se desenmerdar. Eu num tenho problemas de trabalhar em qualquer dia. Há gaijos que dizem que num querem trabalhar no dia 24 dou no dia 25 de Dezembro. Eu num tenho problemas, é um dia como os outros.
- já trabalhou na noite de cunsuada*?
- Já. Num hotel. E aquilo estaba cheio. De espanhóis, mas taba cheio. Sabe que para eles… eles num ligam porque eles festejam mesmo o Natal na noite de 5 para 6 de Janeiro. Festejo* nos Reis
- Pois é.
- E sabe porquê é que festejo nus Reis?
- Náaõ.
- Porque aquilo é uma Monarquia, carágo!

*bénhe - bem
*onte - ontem
*cate – que até
*pedio- pediam
*num - não
*intão - então
*cunsuada - consoada
*Festejo - festejam
- ars longa, vita brevis –
hipócrates

Antes e depois ou como quando Henri Rousseau viu pela primeira vez os trabalhos de Modigliani disse qualquer coisa como isto “percebo que vocês esteja a tentar transformar o que é antigo em algo moderno”. E esta frase, que parece ter ficado para os anais (não conhecia. Conhecia antes a história de um pintor da corte que pediu ao seu soberano, quando este um dia o foi visitar e acompanhar a obra que tinha patrocinado, no atelier do artista teve que ouvir um “por favor Sua majestade apanhe-me esse pincel que caiu”. Mas isto é mais uma lenda). Estávamos no início – sem ainda ter começado – da Primeira Guerra Mundial e é sabido que a escultura, principalmente a clássica, tinha muita influência naquela época. Não porque servisse de fonte de inspiração para a maior parte dos artistas, mas porque a elite artística pensava que com o rumo que a arte estava a tomar, com todo o progresso, a necessidade constante de progresso, a adulação da máquina (Marinetti dizia que um carro de corrida era mais belo que a Vitória de Samotrácia), iria levar à obnubilação das raízes da arte e do seu compromisso para com um passado que foi tão rico e educativo. O exemplo de Marinetti não anula os outros artistas pois Picasso e Modigliani, entre muitos outros, procuraram sempre a naturalidade e a simplicidade que eram conferidas pelas esculturas dedicadas à Natureza (até Gauguin experimentara os prazeres de uma civilização diferente com uma arte própria, a do Pacífico). As esculturas da Antiguidade clássica (que pretendiam dizer que o interior se encontrava já dentro do bloco em bruto, que a escultura era uma arte de subtracção enquanto a pintura era uma arte de adição) e as máscaras africanas, bem como aquelas esculturas que pareciam estar revestidas de algum misticismo como as deusas da fertilidade influenciaram e muito Modigliani. A partir de 1909 ele passa a dedicar-se mais à escultura em detrimento da pintura, tanto por causa deste saudosismo justificado ante a escultura do passado e a escultura de novos territórios como por causa das esculturas de Brancusi que causavam furor com as linhas depuradas em claro desprezo pelos movimentos que propalavam o ataviamento e o adorno. Modigliani e Brancussi que eram coetâneos acabaram mesmo por a exercer a respectiva actividade artística juntos em Montparnasse. Modigliani começou então a esculpir e assumiu de tal forma essa actividade que a mãe dirigia as cartas a Modigliani escultor. Das suas influências deixa-se levar pelas formas muito simples: os olhos apenas com os contornos (os mesmos das pinturas egípcias). Pescoço longo como as esculturas do Maneirismo, os narizes aduncos e muito simples, sem traços identificativos. Mas vemos que neste antes e depois não há uma tentativa de relacionar a escultura de Modigliani com a escultura antiga, mas de estabelecer a comparação entre a máscara africana e a pintura de Modigliani pós este período de escultura. Antes de enveredar pela escultura, Modigliani pintava com traços identificativos, a sua pintura tinha muito do Expressionismo, mas depois, no período imediatamente a seguir, tornou-se assim:”

Máscara Africana do Congo
Barbier-Mueller, Genebra


Amedeo Modigliani
The Red Bust
1913
Colecção Privada
- o carteiro -

What to wear X (1990-2000):
[Isto hoje não ficou grande coisa. É só para avisar]
A década de 90 foi uma década bipolar em termos de moda. Por um lado temos a queda do Muro de Berlim em 1989 e o desmoronamento do Império Soviético, dois acontecimentos que vieram pôr fim a Guerra-fria e trouxeram o relaxamento geral. Antes destes acontecimentos as pessoas viviam em constante alerta e numa tensão permanente. Isto também contribuiu para que a indústria, até aí muito centrada em novos produtos que pudessem fazer face a uma guerra, na tecnologia mais avançada e em criar produtos desnecessários, tivesse um abrandamento. Por outro lado a ECO-92 no Rio de Janeiro, que não teve em termos práticos grandes efeitos, contribuiu pelo menos para desacelerar o ritmo em que se vivia e para pensar mais na paz interior e no meio ambiente, no consumismo, no gasto excessivo de matérias-primas e ainda a utopia europeísta de uma Europa a uma só voz que combatesse a hegemonia americana. E quando se esperava que o mundo caminhasse em direcção à Paz, eis que a década de 90 ficou marcada por vários conflitos: Guerra no Golfo, Conflitos nos Balcãs, fome em África, o barril de pólvora do Médio Oriente. E todos podiam acompanhar isso da sua televisão, quase em directo. A moda acompanhou essa bipolaridade: ecológica, mas rápida, minimal mas glamorosa. A primeira superou a loucura dos anos 80 e afirmou-se como alternativa à moda espectacular. Todos os estilistas um pouco por todo o mundo praticavam o minimalismo na moda que privilegiava a silhueta natural da mulher, a nudez, os tons escuros e as cores neutras e o preto que acabou por ser a cor de eleição de muitos estilistas, criando assim eles próprios uma moda dentro da moda. Era uma espécie de anti-moda que estava ao alcance de todos e era muito democrática. Com as crises económicas muitas mulheres foram despedidas e tiveram de cortar nos gastos. O vestuário minimal servia esse propósito, mas como sempre, em épocas más a moda tende a recuperar as características das épocas prósperas e por isso assistiu-se a um retorno do vintage: os ombros largos dos anos 40, os acessórios com valor artístico, os vestidos em tom romântico… Por outro lado, a moda espectáculo era feita pelas modelos (Naomi Campbell, Cindy Crawford, Claudia Schiffer, Linda Evangelista, Christy Turlington, Elle McPherson, Carla Bruni e Helena Christensen) e pelos seus gurus: Versace, Karl Lagerfeld, Armani, Gianfranco Ferre, Dior, Lacroix… Foi também nesta altura que se assistiu a uma grande mudança nas casas de moda cujos criadores foram substituídos por pessoas com formação em arte, com interesse pela ilustração e pelo teatro, com actividades paralelas como a decoração e ligadas a museus e galerias, o que veiculou a moda como espectáculo, como forma de arte. Tal como a década de 80, a de 90 iniciou-se com muita elegância, com muito glamour, mas enquanto nos anos 80 eram as mulheres executivas quem propalava esse glamour, nos anos 90 foram as super-modelos que se tornaram mais do que a roupa que vestiam e atingiram o estatuto de estrelas de rock ou vedetas de cinema.


Já antes dos anos 90 as mulheres perceberam as vantagens da emancipação e o trabalho durante as guerras foi só uma confirmação de que eram capazes de executar os mesmos trabalhos que os homens sem necessitarem de um casamento para sobreviverem nem estarem confinadas a trabalhos domésticos para se sustentarem. Com o tempo foram conseguindo lugares que eram dos homens e a sociedade começou a ver nelas um nicho de mercado. Quer dizer, desde os Fashion Plates o mercado viu as mulheres como um alvo, mas era um alvo até ridicularizado. As necessidades femininas eram vistas como caprichos. Depois, e tal como hoje acontece com os homens gays, o mercado apercebeu-se do verdadeiro valor que poderia representar a mulher. O mote da revista Cosmopolitan, desmistificado por Naomi Klein em “O Mito da Beleza”, dizia que “agora as mulheres podem ter tudo: beleza, carreira, um corpo fabuloso, óptimo sexo, um bebé adorável e um marido perfeito. Claro, e como Naomi Klein disse, o chavão “You can have it all” era pernicioso pois embora pudesse ser comprado por todas (a revista tinha um preço acessível e chegava a todas as mulheres), não podia ser vivido por todas: mesmo os sonhos mais inofensivos têm um preço mais elevado do que o de uma revista. Este lema levava as mulheres à frustração pois por mais que tentassem nunca seriam como manequins e o pior de tudo, é que como este tipo de apelos era generalizado, elas sentiam que falhavam por culpa delas que o erro não estava no modelo que tentavam vender-lhes, mas nelas mesmas. Obviamente que a mulher que trabalha 8 horas por dia, que tem filhos, marido, um patrão e família para cuidar, um salário fraco e uma Cosmopolitan não tem condições para estar completa e permanentemente arranjada como uma modelo de forma a ser desejada como as modelos que vê na revista. Mas em vez de questionar o que lhe estão a vender, questiona-se. Um exemplo disto foi o sucesso estrondoso do filme de 1990, Pretty Woman, realizado por Garry Marshall. Dois anos antes Richard Gere era “Um Gigolo Americano” com o seu fato Armani oferecido pela sua servil mulher. Depois transformou-se num homem de negócios que compra à mulher roupa de estilistas famosas naquela que foi apelidada de Cinderela dos tempos modernos. Lembremo-nos também do ícone da moda dos anos 90, a Princesa Diana que no início da década usava roupas que muito faziam lembrar os contos de fadas.


A acompanhar o estilo minimal desenvolveu-se nos Estados Unidos um estilo de rua, das bandas de garagem, ligado à música e introspectivo que se chamou movimento grunge. Teve origem nas ruas de Seattle em 1992, mas depressa se espalhou a todo o continente americano e através de grupos como Pearl Jam e Nirvana, alcançou sucesso internacional. As roupas usadas pelo estilo grunge eram despreocupadas, feitas de sobreposição de peças sem relação entre elas, usava-se o XL independentemente do tamanho de quem vestia e havia uma certa nostalgia dos anos 60 em determinadas formas dos casacos. As grandes casas conseguiram adaptar-se a este novo estilo. É claro que as consumidoras típicas de alta-costura não comprariam este estilo, era inconcebível, mas as casas de moda adaptaram-se criando sub-marcas que vendiam um estilo de vida semelhante a preços mais convidativos e para todos aqueles que queriam vestir grunge com estilo. As modelos usavam maquilhagem esborratada e eram magras, com traços muito característicos (cabelos rapados, tatuagens na cabeça), andróginas e usavam roupas que pareciam mal cosidas. Estas sugestões surgiram primeiro nas passerelles através de estilistas como Martin Margiela. O estilo foi bem acolhido pela industria da moda, mas não sobreviveu muito devido às críticas de que foi alvo porque não era possível manter um look com muito de étnico até.








As supermodelos que foram um pouco ecilpsadas por esta tendência retornaram por volta de 93, mas desta vez ainda mais magras e com rostos mais estranhos. Procurava-se sobretudo a versatilidade da modelo, a sua capacidade de ser um rosto bonito e estranho e foi um pouco assim que nasceu o Heroín Chic: a roupa era aceitável, mas o look causou grande alarido pois as consumidoras achavam que o estilo enaltecia o uso das drogas e era uma influência negativa nas jovens. Foi nessa altura e graças ao glamour com que o estilo heroín chic era publicitado através de fotografias icónicas captadas por fotógrafos famosos que se começou a falar mais de uma doença que afectava muitas modelos e acabou por afectar muitas jovens também: a anorexia.


Mas após estes tempos em 1994 a moda voltou a privilegiar o look natural estilo “acabada de sair do banho e sempre limpinha”, ou o look “polpuda” que Eva Herzigova e outras modelos protagonizavam muito bem. Para o look natural as roupas do dia-a-dia tornaram-se mais simples e o rosto foi trabalhado no sentido de realçar a beleza natural de todas as mulheres. A maquilhagem era muito simples e natural e os cabelos usavam-se mais ou menos longos e escadeados. O look natural era tão usado que alguns esteticistas e cabeleireiros começaram a lançar a sua linha própria. Os produtos eram super especializados, recorriam a essências estranhas e técnicas novas, mas também havia uma parte deles que tinham uma componente ecológica como os produtos Body Shop ou Kiehl’s. Em vez desta tendência abrandar o gosto consumista, acelerou-o: a apologia da beleza era feita também através da apologia da juventude que podia ser conseguida, não através dos genes, mas do dinheiro e da ciência; ou seja, o dinheiro comprava a ciência que oferecia implantes mamários, aumento de lábios, correcção de rugas e até, mudança de raça.





Em 1997 o estilo gótico, muito pouco natural ocupou grandes páginas graças ao sucesso de grupos musicais como Marilyn Manson ou Nine Inch Nails. Mesmo os mais jovens procuravam vestir-se como os cantores que admiravam e se não adoptavam o look completo, não faltava as unhas de negro, os cabelos longos e igualmente negros, a pele muito clara, os impropérios contra a religião e a ditadura da beleza… No entanto, os mesmos cantores acabaram por cair em contradição (o seu estilo era também uma forma de beleza e eles eram admirados por isso) e até desgraça (vários jovens se suicidaram motivados pelas letras violentas de Manson).


Em 1998 foi o descalabro: Spice Girls. Bem sei que toda a gente aderiu ao Girl Power, mas olhando para trás, tanta Lycra, tanta lantejoula e tanta carne à mostra enjoaram. Mas lembro-me das as mulheres andarem muito produzidas, pintadas, com roupas sempre justas, cores ácidas e curtas, os umbigos à mostra, mini saias e botas em alguns casos. Os costureiros lançaram os hotpants de cetim e as calças pretas de cetim para a noite. Quando não era preto, era cor-de-rosa ou então cor de cobre na versão pijama da Sharon Stone. Também vingou o estilo militar essencialmente através das calças (dos seus acessórios e corte) dos khakis que saltou das ruas para a passerelle. E no final dos anos 90 surge o girlie-look, que como nome indica aconselha meias pelo joelho, sapatos rasos da mesma cor das meias, mini saia e blazer em estilo colegial, um pouco como se fosse um regresso às origens ao romantismo do início da década. Também estavam na moda os jeans brancos que combinavam com qualquer coisa. Em 2000 ficou mais visível o trabalho de Marc Jacobs na casa Louis Vuitton e os grandes ícones da moda passaram a ser os cantores rap e hip-hop; ou seja, a moda voltou à indústria da música.


- ars longa, vita brevis -
hipócrates
A Bolsa por Daumier:

Honoré Daumier
Caricaturana "Les Robert- Macaire"
1839
"Uma vez fiz um bom truque... criei uma sociedade com um capital de 10 milhões para a exploração de formas em cartão para botas... tinha arranjado 8 acções representando 1200 pobres francos... juntei os meus 8 accionistas!
E falei-lhes da seguinte forma:
Eh! Bom-dia, Senhores papalvos
Vocês são bonitos, parecem-me belos!
- Eu prometo-lhes mais queijo do que pão, distribuo-lhes dividendos de 50%, aqueço-os um pouco e deixo em lume brando... na manhã seguinte disputavam as minhas acções, eu coloquei-as todas e na reunião seguinte disse:
... Na última distribuição de dividendos, enganei-me, esqueci-me do preço do cartão e da mão-de-obra, vocês devem-me o dividendo distribuído, vou retê-lo... deixei o zero e foi-se o resto.
- Ah! ah! ah! ah! (faz Bertrand) - Hi! hi! hi! hi! (faz Wormspire)"
- o carteiro -



No Médio Oriente, no muro que separa a Palestina da Cisjordânia existe um graffiti, poderemos chamar assim com os dizeres que vemos na imagem: “Ctrl+Alt+Delete”. Para quem não sabe, estes são os comandos de um computador, que quando activados simultaneamente, permitem desligar a máquina e todas as acções (como o computador gosta de dizer) que até ali estavam a decorrer. Mas há que ver a questão de outra forma: talvez não esteja na altura de apagar o muro, apagar Israel (isso seria o sonho do Irão) ou apagar a Palestina, mas sim de reiniciar as conversações de Paz. Com a Jihad islâmica, irmã caçula do Hamas, mas muito poderosa graças ao mecenato iraniano, fica mais difícil iniciar um cessar-fogo, quanto mais um processo de Paz. Mas já há movimentações.

Na sua primeira conferência em Portugal, como orador convidado, Henrique Cymermann explica o que se passa no Médio Oriente através de uma frase de rabi “Demasiada metafísica para pouca física”, ou através das palavras do fundador do Estado de Israel: “Tanta História para tão pouca geografia”. Quer isto dizer que estamos a falar de um território diminuto (Cisjordânia – 5.800 km2, Palestina – 20.700 km2 e Gaza – 360 km2), mais pequeno que o Estado do Massachussets, mas que recebe mais atenção mediática do que qualquer outro território no mundo. Ali estão permanentemente 500 jornalistas, aqueles que de certa forma fazem as coisas avançar pois são os únicos que têm o privilégio de poder avançar as linhas de segurança de um território para outro, territórios esses que muitas vezes, a uma distância de 15 minutos uns dos outros mostram uma distância maior: a distância entre o Primeiro Mundo e o Terceiro Mundo. Mas todos os anos visitam a região cerca de 3000 jornalistas e há sempre notícias para dar.

Mas o que nos prende à televisão a ouvir novas do Médio Oriente e pensar que “aquilo é que é desgraça” se, desde 1948 morreram na região cerca de 68 mil árabes e 23 mil israelitas. Claro que uma vida que se perde é como se se perdesse um milhão de vidas, mas em comparação com outros conflitos, podemos dizer que são poucas vidas. Não se compara ao que aconteceu no Sudão, não se compara com os conflitos em África, não se compara com algumas catástrofes naturais nem com a Guerra na ex-Jugoslávia. No entanto, achamos que a verdadeira guerra, o verdadeiro e único conflito se encontra lá devido à subdivisão de conflitos: moderados vs radicais, política integracionista vs política de negação, árabes vs israelitas… Mas também porque quando ouvimos na televisão falar daquela geografia (Belém, Palestina, o rio Jordão, Nazaré), identificamos, interiormente esses locais. Não são memórias visuais de um mapa, mas memórias mais ou menos afectivas pois todos nós ouvimos falar desses locais no âmbito dos ensinamentos do Catolicismo.

Estas diferenças bíblicas que motivam o conflito, aguçadas pelo fim da Segunda Guerra Mundial e pela criação do Estado de Israel à revelia das populações já aí existentes não são assim tantas. Vimos no filme “Intervenção Divina”, como a existência entre as duas religiões e culturas não é impossível. No filme fica bem explícito que as divergências não atingem as proporções que pensamos; são como divergências entre vizinhos: “ai o teu muro tira-me a vista? Então vou passar a estacionar a minha carrinha de caixa alta em frente a tua janela.”, “Ai o teu cão ladra toda a noite, então vou atirar o lixo para o teu quintal”. As diferenças entre os povos, que tem visto uma glorificação tão grande principalmente através da glorificação do indivíduo (o que está certo pois até muito tarde na nossa civilização o indivíduo não teve individualidade), só servem para a consciencialização dessa individualidade. Por maiores que sejam as diferenças, o que une as pessoas são as suas semelhanças, tal como nas tribos. Na sua essência, os seres humanos sentem todos o mesmo: se alguém sente fome, sabemos como é porque já sentimos fome. Ou frio, ou medo, ou sono, ou angústia. Mas seja qual for a nação, seja qual for a raça ou a religião, há um grupo, uma forma de sobrevivência que marginalizamos sempre: a pobreza. A pobreza é o primeiro passo para o conflito. O segundo é a ignorância.

Claro que o conflito atinge por vezes proporções desmesuradas, mas no essencial muçulmanos e judeus procuram perceber-se, procuram novidades uns dos outros e fartos de um conflito que dura há décadas e que está a minar o desenvolvimento, principalmente o desenvolvimento de Israel, procuram acima de tudo fazer “Ctrl+Alt+Delete”, não para apagar, mas para reiniciar.

catarse mental no seguimento da conferência “Diálogos entre Culturas” com o Ministro Rui Pereira, o jornalista Henrique Cymermann e o escritor Fernando Savater.

sábado, dezembro 20, 2008

- back to black -

“Art is much less important than life, but what a poor life without it.” - Robert Motherwell

quarta-feira, dezembro 17, 2008

- original soundtrack -

feliz natal (for all the naughty mommy out there):

I saw Mommy kissing Santa Claus
Underneath the mistletoe last night.
She didn't see me creep
Down the stairs to have a peep;
She thought that I was tucked up
in my bedroom fast asleep.

Then, I saw Mommy tickle Santa Claus
Underneath his snowy beard so white;
Oh, what a laugh it would have been
If Daddy had only seen
Mommy kissing Santa Claus last night.

(I saw mommy kissing Santa Klaus, Amy Winehouse)
- não vai mais vinho para essa mesa -
[1]
A todos os leitores do Belogue (meia dúzia de gatos pingados que eu enxaguo, não se preocupem tarecos!) queria dizer que às vezes, quando dou uma vista de olhos nos posts antigos apercebo-me de duas coisas. A primeira é que não tenho a mínina piada e os meus posts, valha-nos Santiago a bater aos Mouros, são de fugir! A segunda, não menos importante, é que quando faço isso, quando leio os posts antigos dou-me conta de comentários recentes aos quais não respondi. Não levem a mal, sou só eu que não tenho aquele esquema de receber uma mensagem ou um mail sempre que há comentários. Por isso, o melhor é deixar os comentários no posts do dia ou no dia anterior, ou deixá-los no primeiro post, ou deixar no mail que está mesmo aqui por cima de nós. (Senhor mail por favor tire as cuecas que está calor/se chocar não faz mal, vamos todos para o hospital/o hospital cheira mal, vamos todos para o pinhal/ o pinhal cheira… /ok, desculpem, deixei-me levar)
[2]
Às vezes tenho receio em postar sobre determinados assuntos:
Mortes (porque não sei quem é que desse lado está a passar por uma má experiência e pode precisar de ajuda em vez de precisar de piadas)
Doenças (porque também não sei quem está a ler e não está para aí virado)
Sexo (porque sim)
Assuntos privados (porque sim)
Opiniões assertivas acerca de tudo e de nada (porque muitas vezes não tenho opinião sobre certos assuntos e porque me acho permeável à mudança de pensamento. Afinal, só não muda de ideias quem não as tem – "F. Providência dixit?", "Não, revista Caras dixit")
[3]
O Belogue não faz amigos pela Internet. Também não faz inimigos, mas trocar "palmadinhas nas costas" com quem não conhecemos… humm, não soa bem. Acho que é síndrome de primeira classe da escola primária: "Belogue, quando acabarem as aulas vens para baixo sozinho, não falas com ninguém, não aceitas nada de ninguém, atravessas a rua só quando o sinal estiver verde e ao atravessar a linha da CP, só quando a senhora que guarda a passagem de nível o permitir. Compreendido?", "Sim", "como é que se diz?", "Sim senhora", "Muito bem".
- ars longa, vita brevis -
hipócrates

antes e depois ou como "esta é um bocadinho chatinha, mas tem de ser. é a comparação entre a história de Cadmo e da sua mulher Harmonia, ele herói da mitologia grega, ela... casada com um herói da mitologia grega (o que também é um belo emprego, isto sem contar com as ajudas de custo), que são transformados em serpentes, e a história de Adão e Eva que são obrigados a rastejar até ao fim dos tempos, como serpentes, depois de terem sido tentados pela serpente. Apesar de este não ser um episódio típico da mitologia comparada (que descobri há pouco tempo e me está a deixar uma grande azia), foi um episódio que resolvi recuperar, até porque não encontrei a comparação em lugar nenhum; fi-la quando li a história de Cadmo. Pois então foi assim que tudo se passou:

Cadmo fundou Tebas, mas fê-lo num terreno, que embora indicado pelo oráculo, pertencia a um senhor que tinha um dragão numa caverna no meio da floresta (isto está a ficar muito Harry Potter, mas é mesmo assim). Depois do dragão ter morto todos os servos do senhor, chegou a vez de Cadmo que matou o dragão fazendo jorrar o sangue negro dele na terra. A pedido de Atena, Cadmo plantou os dentes do dragão no sangue e dalí nasceram guerreiros que, não sabendo ao que vinham, começaram a pelejar entre si. No fim do dia só ficaram cinco, os cinco que se colocaram ao serviço de Cadmo para erguer a cidade. A cidade prosperou, mas Cadmo nunca foi feliz: na sua família os acidentes e as tragédias sucediam-se e o pobre rei foi destronado pelo próprio neto. Abandonou Tebas com a sua mulher, enquanto vagueava doente pelas florestas. Cansado disse qualquer coisa como "se uma serpente é tão amada pelos deuses, quem me dera ser serpente. E os deuses transformaram Cadmo e Harmonia em serpentes. Em relação a Adão e Eva, a história é semelhante embora visualmente não se retrate Eva ou Adão a rastejar como serpentes. No caso de Cadmo ele tinha tudo, era o fundador de uma cidade próspera; no caso de Adão e Eva, estavam os dois no paraíso, concebidos da vontade de Deus, sem qualquer encargo. Cadmo cometeu o erro de matar um dragão (não que tivesse sido advertido para não o fazer), mas essa foi a causa dos seus problemas; já Eva deu retirou a maçã da árvore e deu-a a comer a Adão (a pedido da serpente). Como castigo, Cadmo nunca foi feliz; como castigo, Deus expulsou Adão e Eva do paraíso. Cadmo e a mulher transformaram-se em serpentes; Deus diz a Eva que ela terá de rastejar o resto dos seus dias, como uma serpente."

[Metamorfoses, Ovídio, página 155]
"Nos curtidos trabalhos, Cadmo exclama: "Ah! Sagrada talvez era a serpente / Que no bosque matei quando expelido / De Sidônia me vi por lei paterna! / Sacro seria o monstro, em cujos dentes / Pela terra espalhei semente infensa! / Pois se dos Numes o furor se apura / Tanto, e tanto em vingá-lo, imploro aos numes / Que em comprida serpente me transformem." / Disse, e como serpente eis que se alonga, / Eis na cútis vê nascer dura escama, / Cerúleas nódoas variar-lhe o corpo: / Na terra cai de peitos: manso, e manso / Os membros se confundem, que o sustinham, / E em buliçosa cauda se afeiçoam. / Restam-lhe braços; braços que lhe restam / Estende o malfadado, e diz, banhando / De lágrimas a face, ainda humana: / "Vem, doce, vem, misérrima consorte, / Enquanto ainda em mim de mim vês parte; / A mão, enquanto é mão, recebe, aperta, / E enquanto não sou todo enorme serpe." / Queira prosseguir, mas de improviso / A língua se lhe fende, ei-lo com duas: "Falecem-lhe as palavras: quantas vezes / Se intenta deplorar, tantas sibila: / Só lhe deixa esta voz a Natureza. / Coa mão ferindo o peito, a esposa clama: / "Cadmo, espera; infeliz, despe esse monstro! / Que é isto! Que é dos ombros, que é dos braços! / As mãos, os pés, e a cor, e o resto, e tudo! / Por que, poder do Céu, porque, Destinos, / Me não mudais também de forma horrenda?"

[Génesis, capítulo 2, versículos 15-25]
"E tomou o Senhor Deus o homem, e o pôs no jardim do Éden para o lavrar e o guardar. E ordenou o Senhor Deus ao homem, dizendo: De toda a árvore do jardim comerás livremente, Mas da árvore do conhecimento do bem e do mal, dela não comerás; porque no dia em que dela comeres, certamente morrerás. E disse o Senhor Deus: Não é bom que o homem esteja só; far-lhe-ei uma ajudadora idônea para ele. Havendo, pois, o Senhor Deus formado da terra todo o animal do campo, e toda a ave dos céus, os trouxe a Adão, para este ver como lhes chamaria; e tudo o que Adão chamou a toda a alma vivente, isso foi o seu nome. E Adão pôs os nomes a todo o gado, e às aves dos céus, e a todo o animal do campo; mas para o homem não se achava ajudadora idônea. Então o Senhor Deus fez cair um sono pesado sobre Adão, e este adormeceu; e tomou uma das suas costelas, e cerrou a carne em seu lugar; E da costela que o Senhor Deus tomou do homem, formou uma mulher, e trouxe-a a Adão. E disse Adão: Esta é agora osso dos meus ossos, e carne da minha carne; esta será chamada mulher, porquanto do homem foi tomada. Portanto deixará o homem o seu pai e a sua mãe, e apegar-se-á à sua mulher, e serão ambos uma carne. E ambos estavam nus, o homem e a sua mulher; e não se envergonhavam."
[Génesis, capítulo 3, versículos 1-19]
"Ora, a serpente era mais astuta que todas as alimárias do campo que o Senhor Deus tinha feito. E esta disse à mulher: É assim que Deus disse: Não comereis de toda a árvore do jardim? E disse a mulher à serpente: Do fruto das árvores do jardim comeremos, Mas do fruto da árvore que está no meio do jardim, disse Deus: Não comereis dele, nem nele tocareis para que não morrais. Então a serpente disse à mulher: Certamente não morrereis. Porque Deus sabe que no dia em que dele comerdes se abrirão os vossos olhos, e sereis como Deus, sabendo o bem e o mal. E viu a mulher que aquela árvore era boa para se comer, e agradável aos olhos, e árvore desejável para dar entendimento; tomou do seu fruto, e comeu, e deu também a seu marido, e ele comeu com ela. Então foram abertos os olhos de ambos, e conheceram que estavam nus; e coseram folhas de figueira, e fizeram para si aventais. E ouviram a voz do Senhor Deus, que passeava no jardim pela viração do dia; e esconderam-se Adão e sua mulher da presença do Senhor Deus, entre as árvores do jardim. E chamou o Senhor Deus a Adão, e disse-lhe: Onde estás? E ele disse: Ouvi a tua voz soar no jardim, e temi, porque estava nu, e escondi-me. E Deus disse: Quem te mostrou que estavas nu? Comeste tu da árvore de que te ordenei que não comesses? Então disse Adão: A mulher que me deste por companheira, ela me deu da árvore, e comi. E disse o Senhor Deus à mulher: Por que fizeste isto? E disse a mulher: A serpente me enganou, e eu comi. Então o Senhor Deus disse à serpente: Porquanto fizeste isto, maldita serás mais que toda a fera, e mais que todos os animais do campo; sobre o teu ventre andarás, e pó comerás todos os dias da tua vida. E porei inimizade entre ti e a mulher, e entre a tua semente e a sua semente; esta te ferirá a cabeça, e tu lhe ferirás o calcanhar. E à mulher disse: Multiplicarei grandemente a tua dor, e a tua conceição; com dor darás à luz filhos; e o teu desejo será para o teu marido, e ele te dominará. E a Adão disse: Porquanto deste ouvidos à voz de tua mulher, e comeste da árvore de que te ordenei, dizendo: Não comerás dela, maldita é a terra por causa de ti; com dor comerás dela todos os dias da tua vida. Espinhos, e cardos também, te produzirá; e comerás a erva do campo. No suor do teu rosto comerás o teu pão, até que te tornes à terra; porque dela foste tomado; porquanto és pó e em pó te tornarás."
- o carteiro -

What to wear IX (1940-1980):
No início da década de 40 a Europa ainda não tinha percebido bem o que se aproximava. Na Primavera de 1940 as casas de moda de Paris lançaram as suas colecções, mas em 22 de Junho desse mesmo ano, Paris rendeu-se. A custo, e graças à perseverança das mulheres e das casas de moda, a moda sobreviveu ao problema do racionamento dos tecidos, embora nunca mais tenha sido a mesma quanto à submissão a um estilo. A moda do pós-guerra reflecte a sociedade do pós-guerra que por sua vez mostra uma oposição total a qualquer forma de proibição, intolerância ou totalitarismo. É da Segunda Guerra Mundial que o prêt-à-porter nasce por contraposição às grandes marcas de roupa que tendiam a impor um estilo, algo que os jovens não desejavam.

A moda durante a Segunda Guerra Mundial reflectiu a falta de materiais e a necessidade de usar os mesmos de forma mais equilibrada, mas reflectiu igualmente a atmosfera sombria que se vivia. Nos Estados Unidos, que não sofreu as consequências da guerra, a moda prosseguiu o seu curso onde tinha ficado antes da guerra; ou seja, nas saias abertas, cinturas finas e blusas justas, chapéu e luvas. Tudo acompanhado de saltos altos. Na Europa esse era o modelo a seguir, uma vez que não se podia fazer muito com as restrições impostas. Em Inglaterra, por exemplo, o crescimento e evolução da moda foi mais difícil. Havia mesmo medidas de tecido que cada modelo podia ter para que não fosse ultrapassada a quantidade de tecido determinada. Isto acontecia não só com a roupa do dia-a-dia, mas também e especialmente, com os vestidos de noite.

Apesar de todos os problemas e restrições, a moda continuava empenhada em mudar algo no "uniforme" feminino e no tom enfadonho da roupa. Se não era possível mudar tudo, faziam-se pequenas alterações nos pormenores como os bolsos, os debruns, os ombros rectos e masculinos (talvez devido ao período austero que se vivia). Por uma questão de facilitação de movimentos, as saias voltaram a ficar mais curtas (pelo meio da canela) e era comum as mulheres, principalmente as que tinham cargos que isso exigiam, usarem calças compridas com corte masculino. À falta de possibilidade para ter mais adornos (que também eram racionados), as mulheres usavam lenços na cabeça ou ao pescoço, adereços muito simples e a maquilhagem que era possível ter (já se fazia reutilização de embalagens de batom; como não havia aço para fazer as embalagens de batom, as senhoras levavam as suas vazias para estas serem enchidas nas casas especializadas). Os cabelos usavam-se pelo ombro, aos cachos presos com travessões devido à dificuldade em fazer permanentes. Os sapatos, ao contrário daquilo que se passava nos Estados Unidos, tinham um tacão robusto e não eram muito bonitos. Para compensar isso as mulheres usavam as pernas cobertas; ou com meias mais grossas (de nylon). Quem não podia comprá-las arranjava forma de obter um bronzeado artificial e quem não tinha meias com a costura atrás, tratava de pintá-la.






Durante a guerra, Paris ocupada não pôde ser o centro das tendências de moda. É verdade que alguns estilistas permaneceram em Paris, mas os seus clientes eram na maioria alemães e a liberdade criativa estava limitada pela ideologia e gostos dos clientes. Para além disso não havia tecidos considerados nobres e a mão-de-obra para confeccionar as peças estava em falta, ou por extradição para os campos de concentração, ou por morte neles ou por deserção do país. Em 1945, com uma exposição no Musée dês Arts Décoratifs dedicada à moda, o espírito criador dos estilistas franceses renasceu e iniciou-se uma nova era com aquilo que foi apelidado de "The New Look", criado por Dior e seguido por Balmain, Balenciaga e Givenchy. Como vimos anteriormente, sempre que surgia um período de crise a moda recuperava inspiração dos períodos de bonança, bem como o luxo e a nostalgia. O New Look foi recuperar os modelos de 1860 quando se usavam as cinturas muito apertadas e as saias bastante pregueadas, blusas muito justas (e às vezes com uma "ajuda" das espumas para um busto maior), sapatos de tacão alto e chapéus largos. A toilette ficava completa com luvas. A diferença é que estas saias eram um pouco mais subidas que as da década referida. Mas o New Look mudava de ano para ano: sempre no mesmo espírito, mas podia passar das cinturas muito finas e saias rodadas para as linhas em "A" que sempre eram mais joviais. Países como a Inglaterra que estavam a criar a sua própria linha dentro da moda devido à ausência de Paris no panorama do estilo, não ficaram satisfeitos com a nova tendência que obrigava a um gasto excessivo de materiais. A Inglaterra vivia com mais dificuldades e não se libertou facilmente da influência da guerra no vestuário feminino e graças à produção em massa vinda dos Estados Unidos que democratizava o vestuário produzia as suas roupas como se de fardas se tratassem. Costureiros como Falaise e Balmain, ainda na década de 50 tentaram fazer vingar este estilo militar em Paris, mas mesmo a tendência da produção em massa só influenciou a Europa nos anos 70.




O look masculino também sofreu transformações e passou por essa etapa de recuperação de tempos antigos. Recuperou-se então o estilo eduardiano: os casacos mais compridos e justos abotoados até cima, assim como as calças que eram mais apertadas. Usava-se chapéu de coco com as abas viradas para fora. Enquanto a roupa feminina reinventava uma época com alegria e inovação, a roupa masculina viveu com saudosismo a época eduardiana. No fim da guerra muitos homens não queriam usar, enquanto civis, qualquer roupa que fizesse lembrar um traje militar ou muito apertada e com regras. O look masculino do pós-guerra oscilava entre o formal e o desportivo, mas a influência militar na roupa nunca foi esquecida. Mais tarde, nos anos 70 o estilo militar foi recuperado no vestuário feminino

Paris dos anos 50 parecia que não tinha acabado de sair de uma Guerra Mundial pois o ambiente que se vivia era de grande sofisticação e todas as forças, todos os assuntos eram dirigidos para a beleza, para a necessidade de tê-la e cultivá-la. Após o fim das restrições aos produtos de beleza, as mulheres voltaram a arranjar-se: as sobrancelhas eram muito arqueadas e pintadas, as sombras de todas as cores, mas sempre aplicadas com precisão e o batom obedecia à rígida linha dos lábios. Os chapéus eram soignée e o luxo imperava não só no uso de jóias vistosas, mas também no que diz respeito aos tecidos que eram essencialmente peles, caxemira e mohairs. Dior liderou as tendências durante toda a década de 50 embora os outros estilistas (já referidos) apresentassem alternativas às bainhas e comprimentos de saias e em relação às cinturas, o que era bom sinal. Era sinal que havia consumidores em número suficiente para consumir todo o tipo de produtos, era sinal que havia liberdade criativa e era sinal que a economia estava em recuperação. Mas nem tudo em Paris era bem sucedido: no Outono de 1959, Yves Saint Laurent que nessa altura desenhava para a Dior apresentou uma colecção onde aboliu a cintura fazendo com que a saia afunilasse nos joelhos, colecção essa que não foi bem aceite pelas mulheres. No entanto, as jovens dos anos 50 não queriam vestir-se como as suas mães. Se até aí não tinham grandes opções, depois da guerra que tantas famílias separou, as mulheres tornaram-se um pouco mais emancipadas e as raparigas mais novas rejeitaram o estilo formal que lhes era imposto pelas casas de alta-costura e pela sociedade em geral uma vez que não havia alternativas. Esta tendência teve inspiração na América e no look desportivo americano embora depois tenha sido adoptada pelos novos estilistas. Lembram-se de filmes como "Rebel Without a Cause" ou "Cry Baby"? As raparigas usavam jeans e calças cigarrete, cabelos apanhados num rabo-de-cavalo, ou saias bastante rodadas com um casaco de malha justo por cima. Era a época da Coca-Cola e do Drive In. As casas de alta-costura também tiveram de se adaptar e apesar de não terem ficado, inicialmente, muito satisfeitas com esta mudança no nicho de consumo, destacam-se os cardigans justos e debruados de Mainbocher ou as camisas Chanel em estilo masculino. O look Beatnick que subiu às passerelles veio da rua invertendo assim a tendência: já não era o estilista, o génio criador quem ditava a moda, mas sim a rua que lhe dava indicações para ele desenhar para "a rua". (Hoje é um jogo de interesses mútuos pois a indústria da moda é influenciada pela rua, mas quando chega à rua já está muito deturpada e já satisfez as exigências da política, da indústria tintureira, da indústria da música, and so on… Por outro lado a rua devolve à moda, mas não é satisfeita totalmente. Basta ver que os acontecimentos sociais não têm repercussão nas semanas de moda. Um Hussein Chalayan aqui e nada mais.) Em Londres sucedeu algo muito estranho para a época. Não foi um estilista de renome que ditou uma moda, não foi a rua que a foi impondo, mas sim uma estilista normal, atenta aos fenómenos sociais e às mudanças do gosto feminino que propôs novas silhuetas. Em 1958 Mary Quant arrasou com a sua loja na King’s Road.







Nos anos 60 a moda passou a ter em atenção o público jovem por várias razões: porque era inconstante e frenético e por isso as tendências mudavam com muita rapidez (o que é bom para o mercado), porque era criativo e por isso ajudava na agitada mudança de look e porque não tinha preconceitos e por isso estava predisposto para toda a inovação. O prêt-à-porter dos anos 60 não enfatizou nenhum ponto da figura feminina. Enfatizou pelo contrário, a sua androginia, tal como tinha acontecido no início do século. A roupa dos anos 60 era paradoxal: desnudou as pernas até ao limite ginecológico (a roupa interior feminina também teve de se tornar mais pequena pois era impossível vestir saias tão curtas com cuecas que pareciam calções), mas não era feminina no sentido que essa palavra tinha até aí, pois as linhas geométricas eram duras, com decotes muito pronunciados ou mesmo transparentes e as meias eram uma medida, pois as saias batiam na costura superior da meia. Isto era um claro "grito do Ipiranga" feminino que na minha opinião pecou por ser excessivo – excepto na parte da redução de tecido da roupa interior. Também não se deixem levar pela teoria de que as mulheres queimaram os soutiens (mulher que é mulher gosta de ter o seu soutien). Não houve muitas mulheres a aderir ao protesto dessa forma tão entusiástica. Houve sim uma actualização da roupa interior para que se tornasse mais confortável e prática.




Mas nem tudo estava perdido para as grandes casas de moda de Paris. Nos anos 60, Yves Saint Laurent, por exemplo revitalizou o beatnik de 50 na sua colecção da Rive Gauche. Outros estilistas foram Courrèges que encantou com o look futurista graças aos seus fatos de plástico e materiais e formas alternativas, Emmanuelle Khanh que criou o look colegial e Paco Rabanne que espantou ao usar materiais como os plásticos e os metais em roupas com formas futuristas, mas impraticáveis. Para acompanhar tudo isto cabeleireiros sugeriam cortes rectos com franja ou sem ela, mas sempre lisos e estruturados.







Na América quem vingava era Óscar de la Renta, Anne Klein e Bill Blass e tal como se verifica ainda hoje, o estilo americano não era linear; ou seja, as casas de moda apresentavam sugestões muito diferentes. O look americano tanto podia ser retro, como psicadélico, romântico ou oriental: tudo era permitido. O mesmo acontecia com os tecidos. Não estava na moda usar só sedas ou apenas linho, mas a mistura de fibras naturais com tecidos sintéticos e até o papel lavável (que não vingou). A vantagem destes tecidos é que eram fáceis de engomar e eram também baratos.
Os acessórios e os penteados entraram no sistema de moda, tanto que as casas de moda e pronto-a-vestir que nessa altura proliferavam vendiam também os acessórios e permitiam uma mudança completa de visual num só espaço. Esta tendência teve mais importância em Londres do que em Paris ou nos Estados Unidos onde geralmente o pronto-a-vestir adaptava marcas de Paris dando a essas marcas de criadores um ar mais acessível.

Quando a década de 70 começou, o movimento rebelde dos anos 60 já tinha perdido parte da força e isso manifestou-se de uma forma muito curiosa. Parecia que depois dos discos metálicos de Paço Rabanne e das roupas transparentes o céu era o limite e que muito provavelmente a roupa iria tornar-se ainda mais estranha. Mas não se deu uma evolução neste sentido; deu-se uma involução. A moda da década de 70 foi tão estranha quanto a da década de 60, mas porque se tornou estranhamente romântica com o uso de tecidos como o algodão estampados com flores como se fossem um dia de Primavera. Voltaram os chapéus (desta vez de palha), mas adornados com flores, as anáguas (minha Nossa Senhora, onde isso já ía) e os cabelos usavam-se ondulados ou com cachos. Se o estilo não era o estranhamente romântico era o estilo indiano em parte devido à viagem que os Beatles fizeram à Índia, em parte por ser a complementaridade do estilo hippie e do flower-power. O centro da moda hippie era São Francisco ("If you’re going to San Francisco/ááBe sure to wear some flowers in your hair") e toda a gente a já conhece: calças à boca-de-sino, muitos bordados, missangas, coletes e camisas de colarinho muito grande e nas senhoras – que também usavam calças – saias compridas de inspiração indiana e cabelos muito compridos com flores a adornar. O look romântico fez com que valorizasse a moda dos anos 20 e 30, como forma de retornar a um período da história que fosse seguro e anterior à Segunda Guerra Mundial. Os estilistas que mais se destacaram foram Karl Lagerfeld para a casa Chloé, Missoni e Jean Muir. O estilo incluía saias de corte masculino que eram usadas com chapéu e jumpers, calças largas com camisas de corte masculino, blazers e quanto aos vestidos de noite, eram cingidos, mas realizados com tecidos que permitiam alguma fluidez. Talvez por influência do estilo hippie a malha que já era aplicada no bordado saltou para a ribalta e era aplicada em tudo o que permitiu ao corpo revelar as suas formas novamente. Apesar das saias serem compridas a malha permitia que tudo fosse mais justo e isto fez com que as pessoas se preocupassem mais com o corpo e com o desporto também. Os fabricantes de roupa interior começaram a investir em roupa desportiva e em soutiens com o mínimo de costuras para quando usados revelarem as formas do peito e não os seus defeitos. No seguimento do uso das malhas, os collants e as calças muito justas também se revelaram e revelaram o novo ponto erógeno: as nádegas que estiveram muito em evidência durante a Disco Fever.




Na década de 70 outras tendências também viram a luz do dia. Como se vivia uma época de incertezas, a sociedade voltou-se para outras tendências seguras como o regresso a um estilo de vida simples e o encontro com a Natureza. Muitas pessoas começaram mesmo a estabelecer-se como agricultores biológicos e outras adoptaram estilos de vida mais saudáveis. Isso tudo se reflectiu na forma de vestir que era um pouco diferente do estilo romântico: saias de lã, blusas grossas, botas e meias grossas. Outra tendência dominante deveu-se à emancipação feminina e ao movimento feminista que levou a que muitas mulheres adoptassem, curiosamente, um estilo masculino com fatos de corte recto e cores sóbrias que denunciavam a falta de tempo de algumas mulheres para se dedicarem à escolha de roupas e modelos elaborados. Esta foi uma tendência que se manteve durante o final dos anos 70 até ao início dos anos 80 e que no fundo reflectia a vontade de igualar homens e mulheres. Daí a importância das roupas unissexo.

Nos anos 80 as mulheres tiram dos homens as calças com corte recto e vestem-nas com suspensórios e camisas sem colarinhos, que eles também usavam pois o colarinho estava demodé. Como já tínhamos visto as roupas masculinas foram gradualmente tornando-se menos formais, embora mais pausadamente que a revolução feminina que foi célere. Desde a Segunda Guerra Mundial os homens deixaram de usar colete e aboliram todo o tipo de roupa que se parecesse com um uniforme militar, embora saibamos que tanto homens como mulheres voltaram a adoptar o estilo mais ou menos nesta altura. Os homens usavam jeans ou calças em veludo cotelê para o dia-a-dia e complementavam o traje com camisas sem colarinho e relativamente justas a acompanhar o gosto feminino. Terminava-se usando um bomber ou casaco de couro tipo aviador que estava muito em voga. Enquanto até aí homens e mulheres vestiam a roupa que mais os pudesse diferenciar – excepto no que diz respeito às calças que vieram facilitar o acesso das mulheres ao desporto e a outros postos de trabalho – agora procuravam sobretudo estar ao mesmo nível e a moda feminina confundia-se com a masculina. Veja-se o caso do movimento punk e do rock and roll: tanto no punk quanto no rock, homens e mulheres usavam o mesmo tipo de roupa e acessórios e tanto num caso como no outro a moda partiu das ruas para a alta-costura. Só quando o punk era já uma raridade é que os penteados desgrenhados, as cristas e as cores fortes chegaram à moda de atelier. Mas os anos 80 são marcados por uma visão de prosperidade vinda da América através das séries de televisão como Dallas ou Dinastia. Para além da música, a moda era influenciada pela televisão.






Foi também na América que se começou a respirar um ar diferente (afastado da incerteza do Antigo Continente perante a crise económica e o desemprego) e parte devido a estilistas como Perry Ellis, Ralph Lauren e Calvin Klein. Estes criaram roupas em linhas mais depuradas, mas mesmo assim com todo o estilo, com todos os factores que fazem com que uma peça valha a pena e o dinheiro. O estilo americano mais não era que a depuração e estruturação escolhida dos conjuntos masculinos usados pelas mulheres. Para além disso eram feitos em tecidos muito confortáveis com capacidades que até aí não existiam e que, não fazendo da prenda um regalo para o olhar, tornavam-na muito confortável e onerosa, numa época em que não estava na moda ser simples.


Na Europa, por exemplo, os anos 80 também permitiram a tendência country ou pelo menos a revitalização dos vestidos de baile eduardianos e a recuperação do estilo lolita através dos bordados, das rendas e das roupas em cor branca. Foi o chamado "Novo Romantismo" que felizmente não vingou, nem podia ter vingado porque fazia parte da tendência de inversão que a moda sofre sempre que avança. Na década de 80 o misticismo associado à alta-costura desvaneceu-se graças à democratização da moda, aos conhecimentos das mulheres relativamente a tecidos e cortes, e a incompatibilidade entre aquilo que era vendido e a utilidade da roupa perante dos novos desafios profissionais e a mudança da ordem social.

(Estes posts só foram possíveis graças ao livro de James Laver, "A moda e a roupa – Uma História concisa", publicada em Portugal pela Companhia das Letras)