segunda-feira, dezembro 22, 2008

- o carteiro -



No Médio Oriente, no muro que separa a Palestina da Cisjordânia existe um graffiti, poderemos chamar assim com os dizeres que vemos na imagem: “Ctrl+Alt+Delete”. Para quem não sabe, estes são os comandos de um computador, que quando activados simultaneamente, permitem desligar a máquina e todas as acções (como o computador gosta de dizer) que até ali estavam a decorrer. Mas há que ver a questão de outra forma: talvez não esteja na altura de apagar o muro, apagar Israel (isso seria o sonho do Irão) ou apagar a Palestina, mas sim de reiniciar as conversações de Paz. Com a Jihad islâmica, irmã caçula do Hamas, mas muito poderosa graças ao mecenato iraniano, fica mais difícil iniciar um cessar-fogo, quanto mais um processo de Paz. Mas já há movimentações.

Na sua primeira conferência em Portugal, como orador convidado, Henrique Cymermann explica o que se passa no Médio Oriente através de uma frase de rabi “Demasiada metafísica para pouca física”, ou através das palavras do fundador do Estado de Israel: “Tanta História para tão pouca geografia”. Quer isto dizer que estamos a falar de um território diminuto (Cisjordânia – 5.800 km2, Palestina – 20.700 km2 e Gaza – 360 km2), mais pequeno que o Estado do Massachussets, mas que recebe mais atenção mediática do que qualquer outro território no mundo. Ali estão permanentemente 500 jornalistas, aqueles que de certa forma fazem as coisas avançar pois são os únicos que têm o privilégio de poder avançar as linhas de segurança de um território para outro, territórios esses que muitas vezes, a uma distância de 15 minutos uns dos outros mostram uma distância maior: a distância entre o Primeiro Mundo e o Terceiro Mundo. Mas todos os anos visitam a região cerca de 3000 jornalistas e há sempre notícias para dar.

Mas o que nos prende à televisão a ouvir novas do Médio Oriente e pensar que “aquilo é que é desgraça” se, desde 1948 morreram na região cerca de 68 mil árabes e 23 mil israelitas. Claro que uma vida que se perde é como se se perdesse um milhão de vidas, mas em comparação com outros conflitos, podemos dizer que são poucas vidas. Não se compara ao que aconteceu no Sudão, não se compara com os conflitos em África, não se compara com algumas catástrofes naturais nem com a Guerra na ex-Jugoslávia. No entanto, achamos que a verdadeira guerra, o verdadeiro e único conflito se encontra lá devido à subdivisão de conflitos: moderados vs radicais, política integracionista vs política de negação, árabes vs israelitas… Mas também porque quando ouvimos na televisão falar daquela geografia (Belém, Palestina, o rio Jordão, Nazaré), identificamos, interiormente esses locais. Não são memórias visuais de um mapa, mas memórias mais ou menos afectivas pois todos nós ouvimos falar desses locais no âmbito dos ensinamentos do Catolicismo.

Estas diferenças bíblicas que motivam o conflito, aguçadas pelo fim da Segunda Guerra Mundial e pela criação do Estado de Israel à revelia das populações já aí existentes não são assim tantas. Vimos no filme “Intervenção Divina”, como a existência entre as duas religiões e culturas não é impossível. No filme fica bem explícito que as divergências não atingem as proporções que pensamos; são como divergências entre vizinhos: “ai o teu muro tira-me a vista? Então vou passar a estacionar a minha carrinha de caixa alta em frente a tua janela.”, “Ai o teu cão ladra toda a noite, então vou atirar o lixo para o teu quintal”. As diferenças entre os povos, que tem visto uma glorificação tão grande principalmente através da glorificação do indivíduo (o que está certo pois até muito tarde na nossa civilização o indivíduo não teve individualidade), só servem para a consciencialização dessa individualidade. Por maiores que sejam as diferenças, o que une as pessoas são as suas semelhanças, tal como nas tribos. Na sua essência, os seres humanos sentem todos o mesmo: se alguém sente fome, sabemos como é porque já sentimos fome. Ou frio, ou medo, ou sono, ou angústia. Mas seja qual for a nação, seja qual for a raça ou a religião, há um grupo, uma forma de sobrevivência que marginalizamos sempre: a pobreza. A pobreza é o primeiro passo para o conflito. O segundo é a ignorância.

Claro que o conflito atinge por vezes proporções desmesuradas, mas no essencial muçulmanos e judeus procuram perceber-se, procuram novidades uns dos outros e fartos de um conflito que dura há décadas e que está a minar o desenvolvimento, principalmente o desenvolvimento de Israel, procuram acima de tudo fazer “Ctrl+Alt+Delete”, não para apagar, mas para reiniciar.

catarse mental no seguimento da conferência “Diálogos entre Culturas” com o Ministro Rui Pereira, o jornalista Henrique Cymermann e o escritor Fernando Savater.

1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Bonita catarse nas vesperas de Natal !

22/12/08 11:02 da manhã  

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