segunda-feira, dezembro 22, 2008

- o carteiro -

What to wear X (1990-2000):
[Isto hoje não ficou grande coisa. É só para avisar]
A década de 90 foi uma década bipolar em termos de moda. Por um lado temos a queda do Muro de Berlim em 1989 e o desmoronamento do Império Soviético, dois acontecimentos que vieram pôr fim a Guerra-fria e trouxeram o relaxamento geral. Antes destes acontecimentos as pessoas viviam em constante alerta e numa tensão permanente. Isto também contribuiu para que a indústria, até aí muito centrada em novos produtos que pudessem fazer face a uma guerra, na tecnologia mais avançada e em criar produtos desnecessários, tivesse um abrandamento. Por outro lado a ECO-92 no Rio de Janeiro, que não teve em termos práticos grandes efeitos, contribuiu pelo menos para desacelerar o ritmo em que se vivia e para pensar mais na paz interior e no meio ambiente, no consumismo, no gasto excessivo de matérias-primas e ainda a utopia europeísta de uma Europa a uma só voz que combatesse a hegemonia americana. E quando se esperava que o mundo caminhasse em direcção à Paz, eis que a década de 90 ficou marcada por vários conflitos: Guerra no Golfo, Conflitos nos Balcãs, fome em África, o barril de pólvora do Médio Oriente. E todos podiam acompanhar isso da sua televisão, quase em directo. A moda acompanhou essa bipolaridade: ecológica, mas rápida, minimal mas glamorosa. A primeira superou a loucura dos anos 80 e afirmou-se como alternativa à moda espectacular. Todos os estilistas um pouco por todo o mundo praticavam o minimalismo na moda que privilegiava a silhueta natural da mulher, a nudez, os tons escuros e as cores neutras e o preto que acabou por ser a cor de eleição de muitos estilistas, criando assim eles próprios uma moda dentro da moda. Era uma espécie de anti-moda que estava ao alcance de todos e era muito democrática. Com as crises económicas muitas mulheres foram despedidas e tiveram de cortar nos gastos. O vestuário minimal servia esse propósito, mas como sempre, em épocas más a moda tende a recuperar as características das épocas prósperas e por isso assistiu-se a um retorno do vintage: os ombros largos dos anos 40, os acessórios com valor artístico, os vestidos em tom romântico… Por outro lado, a moda espectáculo era feita pelas modelos (Naomi Campbell, Cindy Crawford, Claudia Schiffer, Linda Evangelista, Christy Turlington, Elle McPherson, Carla Bruni e Helena Christensen) e pelos seus gurus: Versace, Karl Lagerfeld, Armani, Gianfranco Ferre, Dior, Lacroix… Foi também nesta altura que se assistiu a uma grande mudança nas casas de moda cujos criadores foram substituídos por pessoas com formação em arte, com interesse pela ilustração e pelo teatro, com actividades paralelas como a decoração e ligadas a museus e galerias, o que veiculou a moda como espectáculo, como forma de arte. Tal como a década de 80, a de 90 iniciou-se com muita elegância, com muito glamour, mas enquanto nos anos 80 eram as mulheres executivas quem propalava esse glamour, nos anos 90 foram as super-modelos que se tornaram mais do que a roupa que vestiam e atingiram o estatuto de estrelas de rock ou vedetas de cinema.


Já antes dos anos 90 as mulheres perceberam as vantagens da emancipação e o trabalho durante as guerras foi só uma confirmação de que eram capazes de executar os mesmos trabalhos que os homens sem necessitarem de um casamento para sobreviverem nem estarem confinadas a trabalhos domésticos para se sustentarem. Com o tempo foram conseguindo lugares que eram dos homens e a sociedade começou a ver nelas um nicho de mercado. Quer dizer, desde os Fashion Plates o mercado viu as mulheres como um alvo, mas era um alvo até ridicularizado. As necessidades femininas eram vistas como caprichos. Depois, e tal como hoje acontece com os homens gays, o mercado apercebeu-se do verdadeiro valor que poderia representar a mulher. O mote da revista Cosmopolitan, desmistificado por Naomi Klein em “O Mito da Beleza”, dizia que “agora as mulheres podem ter tudo: beleza, carreira, um corpo fabuloso, óptimo sexo, um bebé adorável e um marido perfeito. Claro, e como Naomi Klein disse, o chavão “You can have it all” era pernicioso pois embora pudesse ser comprado por todas (a revista tinha um preço acessível e chegava a todas as mulheres), não podia ser vivido por todas: mesmo os sonhos mais inofensivos têm um preço mais elevado do que o de uma revista. Este lema levava as mulheres à frustração pois por mais que tentassem nunca seriam como manequins e o pior de tudo, é que como este tipo de apelos era generalizado, elas sentiam que falhavam por culpa delas que o erro não estava no modelo que tentavam vender-lhes, mas nelas mesmas. Obviamente que a mulher que trabalha 8 horas por dia, que tem filhos, marido, um patrão e família para cuidar, um salário fraco e uma Cosmopolitan não tem condições para estar completa e permanentemente arranjada como uma modelo de forma a ser desejada como as modelos que vê na revista. Mas em vez de questionar o que lhe estão a vender, questiona-se. Um exemplo disto foi o sucesso estrondoso do filme de 1990, Pretty Woman, realizado por Garry Marshall. Dois anos antes Richard Gere era “Um Gigolo Americano” com o seu fato Armani oferecido pela sua servil mulher. Depois transformou-se num homem de negócios que compra à mulher roupa de estilistas famosas naquela que foi apelidada de Cinderela dos tempos modernos. Lembremo-nos também do ícone da moda dos anos 90, a Princesa Diana que no início da década usava roupas que muito faziam lembrar os contos de fadas.


A acompanhar o estilo minimal desenvolveu-se nos Estados Unidos um estilo de rua, das bandas de garagem, ligado à música e introspectivo que se chamou movimento grunge. Teve origem nas ruas de Seattle em 1992, mas depressa se espalhou a todo o continente americano e através de grupos como Pearl Jam e Nirvana, alcançou sucesso internacional. As roupas usadas pelo estilo grunge eram despreocupadas, feitas de sobreposição de peças sem relação entre elas, usava-se o XL independentemente do tamanho de quem vestia e havia uma certa nostalgia dos anos 60 em determinadas formas dos casacos. As grandes casas conseguiram adaptar-se a este novo estilo. É claro que as consumidoras típicas de alta-costura não comprariam este estilo, era inconcebível, mas as casas de moda adaptaram-se criando sub-marcas que vendiam um estilo de vida semelhante a preços mais convidativos e para todos aqueles que queriam vestir grunge com estilo. As modelos usavam maquilhagem esborratada e eram magras, com traços muito característicos (cabelos rapados, tatuagens na cabeça), andróginas e usavam roupas que pareciam mal cosidas. Estas sugestões surgiram primeiro nas passerelles através de estilistas como Martin Margiela. O estilo foi bem acolhido pela industria da moda, mas não sobreviveu muito devido às críticas de que foi alvo porque não era possível manter um look com muito de étnico até.








As supermodelos que foram um pouco ecilpsadas por esta tendência retornaram por volta de 93, mas desta vez ainda mais magras e com rostos mais estranhos. Procurava-se sobretudo a versatilidade da modelo, a sua capacidade de ser um rosto bonito e estranho e foi um pouco assim que nasceu o Heroín Chic: a roupa era aceitável, mas o look causou grande alarido pois as consumidoras achavam que o estilo enaltecia o uso das drogas e era uma influência negativa nas jovens. Foi nessa altura e graças ao glamour com que o estilo heroín chic era publicitado através de fotografias icónicas captadas por fotógrafos famosos que se começou a falar mais de uma doença que afectava muitas modelos e acabou por afectar muitas jovens também: a anorexia.


Mas após estes tempos em 1994 a moda voltou a privilegiar o look natural estilo “acabada de sair do banho e sempre limpinha”, ou o look “polpuda” que Eva Herzigova e outras modelos protagonizavam muito bem. Para o look natural as roupas do dia-a-dia tornaram-se mais simples e o rosto foi trabalhado no sentido de realçar a beleza natural de todas as mulheres. A maquilhagem era muito simples e natural e os cabelos usavam-se mais ou menos longos e escadeados. O look natural era tão usado que alguns esteticistas e cabeleireiros começaram a lançar a sua linha própria. Os produtos eram super especializados, recorriam a essências estranhas e técnicas novas, mas também havia uma parte deles que tinham uma componente ecológica como os produtos Body Shop ou Kiehl’s. Em vez desta tendência abrandar o gosto consumista, acelerou-o: a apologia da beleza era feita também através da apologia da juventude que podia ser conseguida, não através dos genes, mas do dinheiro e da ciência; ou seja, o dinheiro comprava a ciência que oferecia implantes mamários, aumento de lábios, correcção de rugas e até, mudança de raça.





Em 1997 o estilo gótico, muito pouco natural ocupou grandes páginas graças ao sucesso de grupos musicais como Marilyn Manson ou Nine Inch Nails. Mesmo os mais jovens procuravam vestir-se como os cantores que admiravam e se não adoptavam o look completo, não faltava as unhas de negro, os cabelos longos e igualmente negros, a pele muito clara, os impropérios contra a religião e a ditadura da beleza… No entanto, os mesmos cantores acabaram por cair em contradição (o seu estilo era também uma forma de beleza e eles eram admirados por isso) e até desgraça (vários jovens se suicidaram motivados pelas letras violentas de Manson).


Em 1998 foi o descalabro: Spice Girls. Bem sei que toda a gente aderiu ao Girl Power, mas olhando para trás, tanta Lycra, tanta lantejoula e tanta carne à mostra enjoaram. Mas lembro-me das as mulheres andarem muito produzidas, pintadas, com roupas sempre justas, cores ácidas e curtas, os umbigos à mostra, mini saias e botas em alguns casos. Os costureiros lançaram os hotpants de cetim e as calças pretas de cetim para a noite. Quando não era preto, era cor-de-rosa ou então cor de cobre na versão pijama da Sharon Stone. Também vingou o estilo militar essencialmente através das calças (dos seus acessórios e corte) dos khakis que saltou das ruas para a passerelle. E no final dos anos 90 surge o girlie-look, que como nome indica aconselha meias pelo joelho, sapatos rasos da mesma cor das meias, mini saia e blazer em estilo colegial, um pouco como se fosse um regresso às origens ao romantismo do início da década. Também estavam na moda os jeans brancos que combinavam com qualquer coisa. Em 2000 ficou mais visível o trabalho de Marc Jacobs na casa Louis Vuitton e os grandes ícones da moda passaram a ser os cantores rap e hip-hop; ou seja, a moda voltou à indústria da música.


5 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Está bastante bom ! a década de 90foi uma época tão intensa e na verdade já nem me lembrava de metade do que escreveu ! ai... só depois do filme do woody allen "vigaristas de bairro" é que compreendi o encanto do versace !
vuittons adoro para dar um arzinho ordinarote !
qt à lady Di sempre achei completamente irrelevante a forma dela se vestir
não falou da miucia prada penso que essa camponesa comunista tem muito que se lhe diga mais o Tom ford na gucci !
mas de quem eu gosto é do Lacroix ... e tenho muitas saudades do seu perfume "c´est la vie" devo ter sido mesmo a única a usar tal perfume...

22/12/08 12:38 da manhã  
Blogger João Barbosa said...

na verdade, reconheço, também gostei dos 80, mas olhando para trás, os 90 foram bem mais elegantes

22/12/08 11:30 da manhã  
Blogger Belogue said...

Cara maria:
Não está não; está muito incompleto. Sempre admirei a forma como o Versace vestia as mulheres como prostitutas finas. A Diana foi um marco: goste-se ou não o que ela usava ditava a moda. Acho que ela era o intermediário entre os costureiros e as senhoras que compravam a Nova Gente. Palmas para Lacroix (eu adorava o barroquismo todo), Galliano, Ferré, Chanel (a fidelidade à marca nos pequenos pormenores)...

Caro João Barbosa:
Os 90 foram a afinação. Os 80 foram a época das liberdades (a SIDA, a homossexualidade, as artes, a droga) e tudo era permitido. Nos 90 a moda voltou para as casas de moda, mas tornou-se também mais acessível.

30/12/08 11:15 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

excelente trabalho é só o que digo!
a nivel de moda é caso para dizer :"temos pano para mangas"... :)

31/12/08 2:22 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

excelente trabalho é só o que digo!
a nivel de moda é caso para dizer :"temos pano para mangas"... :)

31/12/08 2:22 da tarde  

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