terça-feira, setembro 30, 2014

detesto o meu corpo. desde os 15 anos, pelo menos, que detesto o meu corpo e desde aí que venho a tentar transformá-lo em algo de que me possa orgulhar. penso sempre que vai melhorar, mas não. cada dia descubro mais uma coisa em que o detesto. cada dia essa coisa fica em evidência quando passo por miúdas mais novas que eu, miúdas que têm as curvas no sítio certo. às vezes quando tomo banho, subo para a beira da banheira para ver o meu reflexo no espelho e com a raiva de ver aquilo que ele me devolve, agarro a carne até ela ficar marcada. talvez seja um sacrilégio (é certamente, e muita gente me irá julgar pela minha futilidade. ou nem tanta gente já que ninguém lê o blog e essa é uma das razões para poder fazer esta catarse) escrever e dizer isto acerca do próprio corpo quando ao mesmo nada falta. nunca sofri nenhuma amputação, não tenho cicatrizes, não tenho deformações. a minha insatisfação com o meu corpo passa pela incapacidade dele - devido à forma e compleição - de me permitir a afirmação quer como mulher quer como pessoa capaz. sinto-me que me julgam por ele: ele infantiliza-me e por consequência, quem me olha de alto a baixo, acha-me menos capaz de pensar, de ter opiniões e desejos, saneia-me a iniciativa, julga-se no direito. Um dia perguntei ao psiquiatra se alguma das pacientes dele, após recuperarem peso, tinha manifestado o seu desagrado com o corpo. ele disse-me que não. mas eu sinto-o todos os dias.

segunda-feira, setembro 29, 2014

- não vai mais vinho para essa mesa -


















terça-feira, setembro 23, 2014

- não vai mais vinho para essa mesa -

amiguinhos, como vos disse um destes dias, estou a trabalhar e tenho um horário que não me permite dedicar-me às leituras, investigações e postagens como desejaria. para terem uma ideia, estou desde 15 de agosto a ler o primeiro volume do "declínio e queda do império romano"! e aquilo não desenvolve... sabem, tenho muito medo disso, disto: trabalhar e não ter tempo para o que me dá realmente prazer que é descobrir coisas através das leituras. mas este ainda é um período de adaptação. 
como vos disse, tenho estado a ler aquele livro (entre sonos no comboio), mas também leio outras coisas. um destes dias, no comboio, cruzei-me com uma senhora bastante tatuada: nas costas, nos ombros, nos tornozelos e no braço. a tatuagem que estava no braço deve ter sido feita por um tatuador que nunca passou dos ditongos na escola primária. dizia o seguinte: "Amor por ti, a cima de tudo".. Dizem que o amor é cego. Com sorte é também analfabeto. 

sábado, setembro 13, 2014

9 anos de belogue

O belogue faz 9 anos. Quer dizer, isto já estava escrito no cabeçalho, não era necessário dizer outra vez. Muita coisa passou de lá para cá e ainda bem que o blog existe para me lembrar das mudanças que foram ocorrendo. Nem sempre produzi conteúdos bons e tenho consciência que com o tempo, fui arriscando menos, mas acho que isso se prende com a descoberta e a responsabilidade que ela acarreta. ou então sou eu que estou a ficar careta. ultimamente a vida tem sido difícil ("please, lá vem ela com essas cenas") por várias razões. Uma delas é o facto de ter começado a trabalhar, o que me deixa menos tempo para investigar. A outra é a minha acídia crónica, umas vezes mais patente que outras, mas sempre latente. 
bom, mas vamos ao que interessa. andamos por aqui há 9 anos a espalhar a "palavra do siiiinhor". obrigada por virem cá e até breve. beijinhos às famílias.  

quinta-feira, setembro 11, 2014

- o carteiro -

porque eu/nós merecemos
na segunda feira fui ver a ante estreia d'Os Maias. já estava marcado e lá fui eu, "sem poder com uma gata pelo rabo". salvo seja! (tendo em conta as circunstâncias esta expressão não foi muito feliz, reconheço). A propósito d'Os Maias, deixo-vos aqui um apontamento pertinente. Não tenho "Os Maias". É uma daquelas falhas monumentais na nossa biblioteca, mas só passível de ser corrigida quando nada mais urgente surgir. É que quando dizemos "falha monumental", até parece que vai cair o carmo e a trindade. Fui por isso à biblioteca buscar um exemplar para ler umas coisinhas que me interessavam... às vezes uma pessoa tem destas coisas. Só quando cheguei a casa é que vi a boa ***** que tinha trazido. Era uma edição da Book It. A Book It está para a edição de livros como a Ryanair para os transportes aéreos ou a Primark para os trapos: é barato e dá para o gasto. Só que mesmo sendo a coisa barata, há um mínimo de fidelidade, de coerência e de (e isto aqui é que é importante) cultura geral. Quem fez a capa d'Os Maias editada pela Book It colocou duas personagens vestidas com trajes do início do século XIX (ela de vestido com corte estilo império, mangas bufantes, tecido esvoaçante, ele como um dandi, com as golas sobre o rosto e calças justas  na perna. Neste tempo, vigorava o estilo império, ligado ao Neoclassicismo. As roupas parecem de grande ingenuidade como se todos estivessem a entrar ou a sair do Éden onde se deve viver com pouca roupa. isto deve-se ao facto de a europa ter atravessado aí uma vaga de calor ). Ora o romance de Eça passa-se na segunda metade do século XIX, a partir de 1875, se não me engano. Parece insignificante, mas nessa altura a moda era outra, muito diferente. Os vestidos, que antes eram muito armados por causa das crinolinas, tornaram-se menos volumosos graças à substituição destas pelas anquinhas. Ficamos com a sensação que quem fez a capa leu o sub-título "Episódios da Vida Romântica" e vai daí, sem mais nada, toca a colocar um um par romântico à saída de um tempo romântico. 





































Como diria o outro: mas será que eu assei a pomba do Espírito Santo?

domingo, setembro 07, 2014

Carlota
(2000-2014)


Há que lamentar a gente que morre. Gente que morre porque não tem o que comer, que morre porque é morta, gente que morre porque chegou a sua hora, se bem que eu não saiba o que isso quer dizer nem porque é que se diz assim. Outras vidas, como as vidas dos animais, face a essas, de pouco valem. No entanto a Carlota, que era uma gata, merece este post, independentemente de quão desproporcionado possam achar.

A Carlota foi deixada aqui à porta de casa. Um dia a Cláudia tocou à campainha e mostrou-nos uma coisa espalmada e peluda na mão dela. Perguntou se era nossa. Não era, mas passou a ser. A Carlota não tinha os olhos abertos. Era tão pequena que tivemos de lhe fazer clisteres com talos de couve, e de massajar-lhe a barriga como as mães fazem com as patas. Dávamos-lhe leite magro com água, receita de uma veterinária iluminada. A Carlota começou a definhar antes mesmo de começar a crescer. Um dia estava tão fraca que o termómetro não disparou. Mas com uma botija de água quente por baixo e uma seringa de leite de 3 em 3 horas, arrebitou. Dormia no meu ombro, pois o cabelo comprido tapava-a. No Inverno dormia em cima dos meus pés. Quando me levantava ela entrava para debaixo dos cobertores e ficava lá o dia todo até alguém voltar e acender o fogão de sala. Alternava sonos frente ao lume com sonos na tijoleira, para arrefecer. Quando fazia cócó, corria pela casa toda, com o pelo eriçado e o corpo arqueado. Era muito peluda e quando lhe dizíamos "a vassourinha", era abanava a cauda. Não posso dizer que fosse como se falasse connosco. Mas entendíamo-nos e tínhamos as nossas rotinas. Miava junto à cozinha, depois de jantar, para lhe darmos atenção. Sentava-se no teclado do computador, punha-se em frente a ele e, como todos os gatos, sentava-se em cima de nós nas situações mais inconvenientes. Tinha o nariz e as patas cor de rosa. Tirou o útero e há 4 meses, um tumor na mamoca. Há um mês apareceu-lhe outro e começou a deixar de pedir comida. Refugiou-se debaixo da cadeira e começou a recusar alimento pela seringa. Quando bebia água engasgava-se e tossia até ficar sem forças. A veterinária, que a salvou de morrer da primeira vez, não protelou a morte sob o pretexto de mais uns exames ou uma intervenção, mas não deixou de lhe tentar dar qualidade de vida até ao fim, se é que isso é possível. Não estava lá e penitencio-me por isso: a Carlota morreu hoje. Vou sentir saudades dela. Daquelas saudades de que falava o Chico Buarque