sexta-feira, março 30, 2007
- ars longa, vita brevis -
hipócrates
antes e depois ou "ó Dürer, emprestas-me o teu cão?", "Para quê?", "Para levá-lo a ver o Menino Jesus.", "Leva a trela.", ou "faço um crop, aplico um CMYK, um cut e um past inside e cá está o teu cão é o meu cão:
Albrecht Dürer
Saint Eustace
1500-1501
The Metropolitan Museum of Art
Jan Gossaert
The Adoration of the Kings
1500-1515
National Gallery, Londres
The Adoration of the Kings
1500-1515
National Gallery, Londres
(o cão dentro do rectângulo rosa é o mesmo)
- o carteiro -
diferenças que fazem toda a diferença:
Enquanto por cá se discute a questão bizantina da necessidade de contratação de pessoal para vigiar os nossos museus (é quase como discutir se devemos deixar o elefante entrar na loja de cristais), lá por fora (Espanha mais concretamente) essa fase está ultrapassada. A exposição Sargent e Sorolla que no final de 2006 esteve patente no Thyssen Bornemisza começou a sua itinerância no Petit Palais ("Peintres de la lumiére: Sargent et Sorolla", até 13 de Maio).
Em Nova Iorque, duas galerias recebem exposições de artistas espanhóis. Não se trata apenas da qualidade dos artistas espanhóis (substantivo bastante discutível), mas da forma despudorada (adjectivo nada discutível embora dúbio, o que exige uma explicação - "despudorada", sem vergonha de assumir o valor que tem, seja ele qual for), como a Espanha desde sempre identificou o valor da cultura e dos seus artistas (cujo reconhecimento e divulgação fora de portas muito deve às variadas instituições).
O Metropolitan Museum of Art ("Barcelona and Modernity. Gaudí to Dali", até 3 de Junho), o Solomon R. Guggenheim Museum ("Spanish Painting from El Greco to Picasso: Time, Truth and History", até 28 de Maio), o National Museum of Art em Osaka ("Pablo Picasso: The prints and ceramics"), a Suntory Gallery em Osaka ("Dalí Multefaceted", até 6 de Maio), o Hangaram Art Museum na Coreia do Sul ("Van Gogh to Picasso: The impressionists and modern masterworks from Cleveland Museum of Art", até 28 de Março), o Thyssen Bornemisza e a Fundación Caja Madrid ("El Espejo y la Máscara: El retrato en el siglo de Picasso" até 20 de Maio), todos apresentam exposições relacionadas, de uma forma ou de outra com os artistas espanhóis.
- ars longa, vita brevis -
hipocrates
Aniversário do nascimento de Vincent Van Gogh (30 de Março de 1853 – 29 de Julho de 1890):
Van Gogh
Self Portrait with bandaged ear
1889
Courtauld Institute Galleries, Londres
"Gostaria de ter sido um girassol. Um girassol hirto no seu caule, de longas folhas verdes desajeitadas e uma enorme corola doirada, seguindo cegamente o sol.
Estou só e a minha cabeça explode em milhões de girassóis."
(Van Gogh por Van Gogh, Jorge de Sousa Braga)
“Na vida de um artista a morte talvez não seja a coisa mais difícil.”
(Van Gogh em carta escrita a Theo)
quinta-feira, março 29, 2007
sexta-feira, março 23, 2007
- original soundtrack -
não faço ideia como arranjo estas coisas. ouçam através do link:
Je vais vous raconter
Ce qui m'est arrivé
Sous un ciel où l'été
S'attarde
Histoire d'amoureux
Voyage aventureux
Que pour les jours heureux
Je garde
Un grand navire à quai,
La foule débarquait
Deux yeux sous des bouquets
Regardent
L'amour devait rôder
Puisqu'on s'est regardés
Et que mon cœur s'est mis à chanter ...
Avril au Portugal,
A deux c'est idéal,
Là-bas si l'on est fou,
Le ciel l'est plus que vous,
Pour un sentimental
L'amour existe t-il
Ailleurs qu'au Portugal
En Avril.
Le soir sous mes yeux clos
Glissant au fil de l'eau
Je vois par le hublot
La rive
Des voiles de couleur
De lourds parfums de fleurs
Des chants de bateleurs
M'arrivent...
Tout ça berce mon cœur
D'un rêve de bonheur
Dont les regrets ailleurs
Me suivent,
L'amour devait savoir
En nous suivant le soir
Que j'aimerais un jour la revoir...
(...)
(Avril au Portugal, Yvette Giraud)
- o carteiro -
Mulheres bonitas
Não é novidade. Alma Mahler foi uma grande mulher, pelo menos para mim. Casou com o compositor Gustav Mahler, com o arquitecto Walter Gropius e mais tarde com o escritor Franz Werfel. Depois e para desenjoar, teve um caso com Oskar Kokoschka. Ela descreveu os anos da relação dizendo que “foram uma única e violenta batalha amorosa”. Kokoschka imortalizou a sua perspectiva da relação no quadro “A Noiva do Vento” (que desde já devo dizer que detesto, até me dá vómitos, pelo simples facto de ter sido inspirado num quadro de El Greco). No quadro há uma tensão óbvia entre eros e tanatos. Não foi uma grande mulher por ter casado com eles, mas por ter sido amada por eles. Obviamente a beleza ajuda e Alma Mahler tinha sido bafejada pela mesma à nascença. Por vezes a beleza também desajuda. Dou três exemplos: Chan Marshall (aka Cat Power), Fiona Apple e Artemisia Gentileschi. Todas elas bonitas e talentosas (as duas primeiras são cantoras, a segunda era filha do pintor Orazio Gentilleschi, numa altura em que ser pintora era prerrogativa de senhoras ricas e com maridos liberais, ou de filhas de pintoras. Sofonisba Anguissola é um exemplo do primeiro caso, Artemisia, do segundo) e todas elas violadas. Artemisia passou por um processo em tribunal de contornos kafkianos: o suposto culpado acusou o pai da rapariga e a culpa acabou por morrer na pintora; aparentemente ela teria provocado e nunca se deixa um prato de leite na soleira da porta se sabemos que está lá um gato esfomeado. O quadro “Susana e os velhos”, um tema recorrente que geralmente é retratado de uma forma mais ligeira (apenas dois velhos a olhar para uma rapariga nua que toma banho), assume com Artemisia a forma de ameaça, de coacção. As outras senhoras continuam a cantar e com uma alegria (Cat Power. Será das ervinhas?) e uma doçura desafiadora (Fiona Apple) que nos deixam de cara à banda.
- não vai mais vinho para essa mesa -
- Então também tens um blog?
- Quem eu?
- Sim. Tens um blog ou não?
- Não.
- Mas toda a gente tem.
- Mas eu não tenho.
- Porquê?
- Sobre o quê é que eu iria escrever?
Srª Formiga, a "resposta" está na caixinha.
quarta-feira, março 21, 2007
- original soundtrack -
já não chorava a ver uma série de televisão desde que a televisão não existia e o que existia era um homem que no cinema estava debaixo do palco a pedalar para a fita sair assim. (eu acreditava que estava alguém lá em baixo). O último episódio do Dr. House tem aqui, portanto, uma merecida homenagem:
I saw her today at a reception
A glass of wine in her hand
I knew she would meet her connection
At her feet was her footloose man
No, you can't always get what you want
You can't always get what you want
You can't always get what you want
And if you try sometime you find
You get what you need
(…)
(You can’t always get what you want, Rolling Stones)
Acho que estou na Formiga...
terça-feira, março 20, 2007
- original soundtrack -
A culpa não, não é do sol
Se o meu corpo se queimar
A culpa não, não é do sol
Se o meu corpo se queimar
A culpa é da vontade
Que eu tenho de te abraçar
A culpa não, não é da praia
Se o meu corpo se ferir
A culpa não, não é da praia
Se o meu corpo se ferir
A culpa é da vontade
Que eu tenho de te sentir
A culpa é da vontade
Que vive dentro de mim
E só morre com a idade
Com a idade do meu fim
A culpa é da vontade
(...)
(A culpa é da vontade, António Variações)
- não vai mais vinho para essa mesa -
[na piscina]
- Ouve lá minha, qual é o teu segredo? Tu não páras minha!
- Eu?!
- Sim pá!
- Tenho pilhas.
- Então tem cuidado "quéssa" cena dá choque.
[no mail]
"I think u re wery nice and wery sexy"
(amigo, ou aprendes a escrever inglês ou vais voltar para casa muitas vezes sozinho. É que o "very" com "w", anula tudo o resto)
[na livraria]
- Ah yah, mas eles não andam.
- Yah, mas comem-se, assim de vez em quando, tás a ver?
- Yah, é naquela.
- Do tipo, estamos e não estamos, percebes?
- Yah. Isso é fixe.
- Isso é himalaias de fixe. Não há aquela obrigação percebes.
- Yah, bué da fixe. Curti.
- mãe, a maçã tem bicho -
Censored:
Ao contrário de nós - “orgulhosamente sós” – a censura (aqui e aqui) está cada vez mais activa e acompanhada. Não concordo que tudo seja relevante no campo da arte e tenho consciência que muito do que se faz é feito de forma a chocar e não a surpreender, cativar, ou espevitar (ou deleitar, pronto). Quando tudo nos é dado, não há o que procurar. À semelhança dos quadros do post aqui em baixo, que tenho a certeza são, para quem os vê individualmente os únicos não tendo sido colocada a possibilidade de variação/cópia do tema, também esta febre censória terá no futuro a responsabilidade de criar visitantes, apreciadores de arte ou curiosos, menos tolerantes e crentes de que a sua verdade é a única. Quanto a quem coloca os paninhos (nome totalmente inspirado no pintor Daniel da Volterra, encarregue de pintar panos a cobrir as partes pudibundas dos frescos da Sistina, realizados por Miguel Ângelo), dessa entidade amorfa, diz que é uma espécie de Sokal da cultura geral.
segunda-feira, março 19, 2007
- original soundtrack -
É pau, é pedra, é o fim do caminho
É um resto de toco, é um pouco sozinho
É um caco de vidro, é a vida, é o sol
É a noite, é a morte, é um laço, é o anzol
É peroba do campo, o nó da madeira
Caingá, candeia, é o Matita Pereira
É madeira de vento, tombo da ribanceira
É o mistério profundo, é o queira ou não queira
É o vento ventando, é o fim da ladeira
É a viga, é o vão, festa da cumeeira
É a chuva chovendo, é conversa ribeira
Das águas de março, é o fim da canseira
É o pé, é o chão, é a marcha estradeira
Passarinho na mão, pedra de atiradeira
É uma ave no céu, é uma ave no chão
É um regato, é uma fonte, é um pedaço de pão
É o fundo do poço, é o fim do caminho
No rosto o desgosto, é um pouco sozinho
(...)
(Águas de Março, Tom Jobim)
- ars longa, vita brevis -
hipócrates
antes e depois ou "um bom slogan para a De Beers: podemos imitar quadros, que este só não foi para a fogueira do Savonarola porque não calhou tamanho foi o arrependimento de Botticelli por ter andado a pintar gente nua, mas não falsificamos jóias. Ah isso é que não. E que venha Deus do Céu à Terra e nos enrole a linguazinha e nos deixe roxos se estamos a falar a mentira. Mas não traga o Savonarolla que esse tipo de nariz adunco era irascível. E devia cheirar mal."
Sandro Botticelli
The birth of Venus (pormenor)
1485
Uffizi, Florença
(Botticelli deixou-se seduzir pela forma inflamada - literalmente - com que Savonarola pregava o fogo do Inferno para aqueles que viviam uma vida boémia, para os que compravam indulgências e favores à Igreja. Também para os que aceitavam. Chegou a queimar alguns trabalhos nas célebres fogueiras.)
- mãe, a maçã tem bicho -
[Revista Exame, Março de 2007]
"Arte de Investir (...) O mercado mundial de arte cresceu a dois dígitos em 2005 e 2006. Esta é uma boa forma de aliar elevadio potencial de retorno, com muito prazer. (...) A directora do conselho de investimento em arte do BNP Paribas Private Bank dá um exemplo: o pintor espanhol Oscar Dominguez. 'Em três anos o preço das suas obras disparou', sintetiza"
(expliquem só: há alguma solução para os problemas económicos do país? Alguém? Aí atrás? Ninguém? Pois.)
domingo, março 18, 2007
- ars longa, vita brevis -
hipócrates
"The truisms were, or at least were as close as I could make them to, genuine clichés... They were uniquivocal individually, but as a series, because they came from a zillion different points of view, you had a sort things out for yourself and figura out what it meant." (Jennifer Holzer)
- the sum of your actions determines what you are
- the unattainable is invariable attractive
- the world operates according to discoverable laws
- there are too few immutable truths today
- there's nothing except what you sense
- there's nothing redeeming in toil
- thinking too much can only cause problems
- threatening someone sexually is a horrible act
- timidity is laughable
- to disagree presupposes moral integrity
- the unattainable is invariable attractive
- the world operates according to discoverable laws
- there are too few immutable truths today
- there's nothing except what you sense
- there's nothing redeeming in toil
- thinking too much can only cause problems
- threatening someone sexually is a horrible act
- timidity is laughable
- to disagree presupposes moral integrity
quarta-feira, março 07, 2007
terça-feira, março 06, 2007
- original soundtrack -
Ive been a bad bad girl,
Ive been careless with a delicate man.
And its a sad sad world,
When a girl can break a boy
Just because she can.
Dont you tell me to deny it,
Ive done wrong and I want to
Suffer for my sins.
Ive come to you cause I need
Guidance to be true
And I just dont know where I can begin.
What I need is a good defense
cause Im feelin like a criminal.
And I need to be redeemed
To the one I sinned against
Because he was all I ever knew of love.
(…)
(Criminal, Fiona Apple)
- mãe, a maça tem bicho -
"Aqui há talento":
O coleccionador Charles Staachi criou um site com o objectivo de descobrir um novo talento no mundo da arte que tem como prémio, o direito a expor durante três meses na sua galeria em Londres, e mais de mil euros. O eleito é escolhido pelo público que vota através do site. É uma iniciativa que vem na conntinuidade do que já andava a ser feito com o site Your Gallery, promovido por Staachi e que permite que artistas de todo o mundo mostrem um pouco do seu trabalho.
O site para escolher o vencedor já recebeu 35 milhões de visitantes. Visto assim, não parece importante, mas se juntarmos a isto o facto de a nova galeria de Staachi abrir até ao final do ano em Chelsea e de cada visitante que vai votar ser um potencial visitante da galeria, Staachi tem publicidade a nível internacional de uma forma muito simpática
- não vai mais vinho para essa mesa -
Teoria da Gestalt (o todo é feito pelas partes) através do estudo destas duas ancas
- não vai mais vinho para essa mesa -
Eu não vos tinha visto, estava para não parar, não fizeram sinal de alto, e eu não parava, depois é que comecei a olhar…
- Mas nós estávamos na paragem. Ali era a paragem, não era?
- Era, quer dizer, não é. A gente só para lá para ir buscar passageiros se os houver. Ora como vocês não faziam alto, eu não parava. Até nem paro ali, ali não é o meu sítio. Eu paro mesmo perto da saída do metro ou do centro comercial. Sabe como é. São sítios mais movimentados.
- Dão mais.
- Pois! Eu até nem era para parar. Pois vocês vão para onde?
- Vamos para X.
- X onde está o museu?
- Sim.
- Pois ora vamos lá. Cá estamos. È assim, é assim a vida. É preciso respeitar os nossos patrões e os nossos pais. Não há nada mais bonito que o respeitinho por quem nos alimenta e por quem nos educa.
-Mas isso é um hino muito antigo, é da Mocidade Portuguesa.
- Conhece?
- Sim.
- Mas você não é desse tempo. Mas olhe que é bem verdade. É por isso que o país está como está, porque a gente não respeita nem os nossos patrões nem os nossos pais, não é verdade menina. Pois está claro…. E é isto assim, e era uma canção antiga, mas coiso… A voz sossegava e esvaía-se em murmúrios irreproduzíveis que descansavam na papada, no cansaço de um dia de trabalho hipnotizante devido ao movimento do limpa pára brisas. A cidade não oferecia muita resistência aquela hora. Todos pareciam ter ficado aborrecidos com o tempo que fazia e por castigo às instituições culturais da cidade, controlada em parte pela edilidade, os habitantes tinham-se refugiado em casa a ver a Paula Moura Pinheiro a agitar aspas no ar e o Delfim Sardo a dizer que o fotojornalismo se assemelhava ao trabalho de paparazzi. (cuidado que a paris hilton está em black out). A conversa, o monólogo, voltava quando a proximidade das traseiras de um autocarro trazia o táxi aos solilóquios que acordavam logo um morto. Recomeçava:
- Pois isto cá está uma vergonha. Este sacana que está à nossa frente não nos deixa passar. E a gente vai ter que ficar aqui porque… porque ele tem razão. Até foi um tipo porreiro. Fez aquela manobra e coiso, a gente veio para aqui. Ora não é verdade? Ora pois então vocês são jornalistas? São da comunicação social? Então o que vão lá fazer. Há alguma coisa agora à noite?
- Há um concerto.
- E então vocês coiso, vão sozinhas. Pois isto é perigoso. Isto não é como em França. Em França, sabe como é?
- Sei – a olhar para o vidro para conter o riso – de um lado mete-se a moeda, do outro sai a criança.
- Pois muito bem, sim senhora. Está bem. Mas não sabe como é na Suiça, pois não?
- Não, mas tenho a certeza que me vai contar.
- Ora na Suíça é que perigoso, de um lado mete-se a moeda e sai “um das caldas”.
- “Um das caldas?” Isso é de facto perigoso.
- É, não é, menina? Ora pois bem, estamos quase a chegar. É rapidinho. É que a gente já está habituado, é um percurso pequeno.
- Preferia um maior?
- Preferir preferia. Mas assim também está bem. Eu não sou esquisito. Não gosto é de certos clientes que fazem confusão e coiso… São 430.
- Como?
- Era a brincar, isso era antigamente. São 4 euros e 30. E mesmo assim olhe lá que são sempre 800 escudos. A vida está cara, está tudo caro.
- As coisas não estão caras, a gente é que ganha pouco.
- Mas goza muito. Aproveitem meninas.
- Adeus, boa noite.
- E desculpem lá a minha conversa, mas a gente tem de dizer alguma coisa, não é? Para animar e coiso…
- Mas nós estávamos na paragem. Ali era a paragem, não era?
- Era, quer dizer, não é. A gente só para lá para ir buscar passageiros se os houver. Ora como vocês não faziam alto, eu não parava. Até nem paro ali, ali não é o meu sítio. Eu paro mesmo perto da saída do metro ou do centro comercial. Sabe como é. São sítios mais movimentados.
- Dão mais.
- Pois! Eu até nem era para parar. Pois vocês vão para onde?
- Vamos para X.
- X onde está o museu?
- Sim.
- Pois ora vamos lá. Cá estamos. È assim, é assim a vida. É preciso respeitar os nossos patrões e os nossos pais. Não há nada mais bonito que o respeitinho por quem nos alimenta e por quem nos educa.
-Mas isso é um hino muito antigo, é da Mocidade Portuguesa.
- Conhece?
- Sim.
- Mas você não é desse tempo. Mas olhe que é bem verdade. É por isso que o país está como está, porque a gente não respeita nem os nossos patrões nem os nossos pais, não é verdade menina. Pois está claro…. E é isto assim, e era uma canção antiga, mas coiso… A voz sossegava e esvaía-se em murmúrios irreproduzíveis que descansavam na papada, no cansaço de um dia de trabalho hipnotizante devido ao movimento do limpa pára brisas. A cidade não oferecia muita resistência aquela hora. Todos pareciam ter ficado aborrecidos com o tempo que fazia e por castigo às instituições culturais da cidade, controlada em parte pela edilidade, os habitantes tinham-se refugiado em casa a ver a Paula Moura Pinheiro a agitar aspas no ar e o Delfim Sardo a dizer que o fotojornalismo se assemelhava ao trabalho de paparazzi. (cuidado que a paris hilton está em black out). A conversa, o monólogo, voltava quando a proximidade das traseiras de um autocarro trazia o táxi aos solilóquios que acordavam logo um morto. Recomeçava:
- Pois isto cá está uma vergonha. Este sacana que está à nossa frente não nos deixa passar. E a gente vai ter que ficar aqui porque… porque ele tem razão. Até foi um tipo porreiro. Fez aquela manobra e coiso, a gente veio para aqui. Ora não é verdade? Ora pois então vocês são jornalistas? São da comunicação social? Então o que vão lá fazer. Há alguma coisa agora à noite?
- Há um concerto.
- E então vocês coiso, vão sozinhas. Pois isto é perigoso. Isto não é como em França. Em França, sabe como é?
- Sei – a olhar para o vidro para conter o riso – de um lado mete-se a moeda, do outro sai a criança.
- Pois muito bem, sim senhora. Está bem. Mas não sabe como é na Suiça, pois não?
- Não, mas tenho a certeza que me vai contar.
- Ora na Suíça é que perigoso, de um lado mete-se a moeda e sai “um das caldas”.
- “Um das caldas?” Isso é de facto perigoso.
- É, não é, menina? Ora pois bem, estamos quase a chegar. É rapidinho. É que a gente já está habituado, é um percurso pequeno.
- Preferia um maior?
- Preferir preferia. Mas assim também está bem. Eu não sou esquisito. Não gosto é de certos clientes que fazem confusão e coiso… São 430.
- Como?
- Era a brincar, isso era antigamente. São 4 euros e 30. E mesmo assim olhe lá que são sempre 800 escudos. A vida está cara, está tudo caro.
- As coisas não estão caras, a gente é que ganha pouco.
- Mas goza muito. Aproveitem meninas.
- Adeus, boa noite.
- E desculpem lá a minha conversa, mas a gente tem de dizer alguma coisa, não é? Para animar e coiso…
sexta-feira, março 02, 2007
- original soundtrack -
Your own personal jesus
Someone to hear your prayers
Someone who cares
Your own personal jesus
Someone to hear your prayers
Someone whos there
Feeling unknown
And youre all alone
Flesh and bone
By the telephone
Lift up the receiver
Ill make you a believer
Take second best
Put me to the test
Things on your chest
You need to confess
I will deliver
You know Im a forgiver
Reach out and touch faith
Reach out and touch faith
(Personal Jesus, Depeche Mode)
- não vai mais vinho para essa mesa -
monólogo:
- Em 1982 a Cindy Sherman participou na Documenta 7 em Kassel
- Também o Mário Merz.
- O comerciante?
- Não, o do Kommerzbank. Foi assim que ficou Mário Merz. Era o tipo da Arte Povera.
- Povera como o Flavin e o Nauman?
- Bruce?
- Lee Harper.
- E o Johnson. Nomeou-a para o National Council of Arts.
- Não, lembrei-me de outro Lee.
- Qual, o Bruce?
- Não, o Spike.
- Malcom X?
- E tu, Good Night and Good Luck?
- Sabes como eu sou: dado a um bom vice-presidente e a um bom crime.
- Crime e Castigo?
- Não sou muito de Dostoievski. Aliás, não aprecio os russos. Mas aceito o castigo.
- Dás ou levas?
- Dou.
- Sádico, portanto.
- Nada como uma boa parafilia para Freud se entreter.
- Nada como um bom Pasolini e 120 dias de Sodoma.
- Morreu como o Caravaggio.
- Desapareceu na praia, não foi?
- Sim, nunca chegou a nenhuma Documenta.
- Também o Mário Merz.
- O comerciante?
- Não, o do Kommerzbank. Foi assim que ficou Mário Merz. Era o tipo da Arte Povera.
- Povera como o Flavin e o Nauman?
- Bruce?
- Lee Harper.
- E o Johnson. Nomeou-a para o National Council of Arts.
- Não, lembrei-me de outro Lee.
- Qual, o Bruce?
- Não, o Spike.
- Malcom X?
- E tu, Good Night and Good Luck?
- Sabes como eu sou: dado a um bom vice-presidente e a um bom crime.
- Crime e Castigo?
- Não sou muito de Dostoievski. Aliás, não aprecio os russos. Mas aceito o castigo.
- Dás ou levas?
- Dou.
- Sádico, portanto.
- Nada como uma boa parafilia para Freud se entreter.
- Nada como um bom Pasolini e 120 dias de Sodoma.
- Morreu como o Caravaggio.
- Desapareceu na praia, não foi?
- Sim, nunca chegou a nenhuma Documenta.
quinta-feira, março 01, 2007
the statement
Há duas coisas que não suporto (isto sem contar com a preparação do pequeno-almoço): que me tomem como um dado adquirido e que me subestimem. Da primeira, podemos acrescentar que nunca uma pessoa é só aquilo que parece ser e da segunda, que é insuportável limitarem-nos, só porque assim, daquele ponto de vista, a pessoa se encaixa na caixa de sapatos número 1 e não na número 2.
Há duas coisas que não suporto (isto sem contar com a preparação do pequeno-almoço): que me tomem como um dado adquirido e que me subestimem. Da primeira, podemos acrescentar que nunca uma pessoa é só aquilo que parece ser e da segunda, que é insuportável limitarem-nos, só porque assim, daquele ponto de vista, a pessoa se encaixa na caixa de sapatos número 1 e não na número 2.
- original soundtrack -
Una furtiva lagrima
Negli occhi suoi spunto:
Quelle festosee giovani
Invidiar sembro.
Che piu cercando io vo?
M'ama, lo vedo.
Un solo instante i palpiti
Del suo bel cor sentir!
I miei sospir, confondere
Per poco a' suoi sospir!
Cielo, si puo morir!
Di piu non chiedo.
(Una lagrima furtiva, Donizetti)
- ars longa, vita brevis -
hipócrates
antes e depois, ou como há uma boa probabilidade deste blog se tornar uma homenagem a Paul Delaroche (lagarto, lagarto, lagarto):
Modelo para The bather
1885
Museum of Modern Art, Nova Iorque
Paul Cézanne
The Bather
1885-1887
Museum of Modern Art, Nova Iorque