quarta-feira, abril 20, 2016

- o carteiro -
Da última vez falei de São Domingos e de São Francisco, bem como dos Albigenses. No fundo falei (escrevi. quem fala é o Zaratrusta) sobre as correntes, dentro e fora da Igreja que se opunham ao fausto desta. Dentro da Igreja, temos aqueles como São Francisco que formam Ordens quase à margem, que vivem quase na miséria, que os outros até desprezam. Fora da Igreja vivem heréticos como os Albigenses. Lembremo-nos que, numa altura em que a Igreja era tudo, estar à margem da Igreja era estar à margem da sociedade, era não ter a tão desejada Salvação. Isto é ainda mais importante quando percebemos que muitas pessoas viviam vidas tão miseráveis que a morte só podia ser boa.
O Papa Inocente III tenta combater este problema socorrendo-se para isso dos serviços dos dominicanos. Mas os dominicanos eram uma Ordem religiosa pacífica; a sua acção não era pela violência e, obviamente, a missão que lhes foi dada pelo Papa, não teve frutos. O Papa tem então outra ideia: convocar um exército para converter à força esses heréticos (conversão ou morte), mas também isso é infrutífero. Durante 20 anos trava-se uma guerra brutal - a chamada cruzada albigense - que não derrota os heréticos. O problema arrasta-se e em 1231 o papa Gregório IX tem o problema nas mãos. É então que decide por uma outra iniciativa: chamar o clero para ir para as zonas rurais investigar e aí estabelecer pequenos tribunais que vão investigar estas fugas à norma de Roma. É com estes pequenos tribunais que começa a Inquisição. Toda a gente conhece a Inquisição: é apelidado de "período mais negro da história da Igreja", mas para mim, venha o diabo e escolha...Depois de se terem livrado dos bárbaros e dos muçulmanos, os cristãos estavam agora a travar uma batalha no seu seio, contra os heréticos, ao mesmo tempo que a Igreja vivia um período próspero. Este braço de ferro entre a Igreja e os seus críticos era um reflexo de uma Igreja totalitária, uma Igreja que se imiscuía num âmbito que não era o seu, que era o de julgar. Igreja e Estado continuam portanto em permanente conflito. Isto é tão verdade que 15 anos após o início da Inquisição o rei espanhol Filipe de Aragão proclama que os inimigos da cruz, são também seus inimigos, inimigos do reino, o que mostra como a questão era também estatal, política.

A Inquisição espalha a sua sombra pela Europa e os seus tribunais cometem claramente excessos, principalmente em Espanha. O início foi a expulsão de muçulmanos do país. No século XV nada fica na Europa das comunidades muçulmanas que até aí conviviam pacificamente. Os grandes redutos muçulmanos eram Granada e Navarra. Em 1469 o destino de Granada é ameaçado pelo casamento de Fernando de Aragão e Isabel de Castela. Ora a união de um Aragão com uma Castela, resultava naquilo que hoje é conhecido por Espanha, à excepção de Navarra e Granada. Mas era um grande passo: era uma unificação política e que os reis queriam que, claro, fosse também religiosa. Por isso tomaram os destinos desta unificação religiosa nas próprias mãos e levaram a cabo a Inquisição Espanhola. Em 1492 é dado aos judeus um ultimato: converterem-se ao cristianismo ou deixarem Espanha. Milhares de judeus partem, deixando aquela que foi a sua casa por muitas gerações e outros, sob o peso da Inquisição, convertem-se. Também os muçulmanos são confrontados com essa difícil escolha de conversão ou deportação. Aparentemente, a Igreja conseguia assim fazer a "limpeza" necessária para vingar. Não estava era preparada para desafios tão fortes como aquele que se seguiu: a Reforma Protestante.