- o carteiro -
e o Homem criou Deus... (XV)
um pouco antes da quarta cruzada, no século XII, surge em França um novo movimento: o movimento Albigense que deve o nome à cidade onde surge: Albi. Os Albigenses, ou Cátaros, opunham-se ao fausto da Igreja, isto em termos gerais, já que é muito difícil falar a fundo deste movimento pois a Igreja procurou exterminar todos os seus membros, bem como os seus escritos. Defendiam a simplicidade e a pobreza e acreditavam que existiam duas forças no mundo: uma boa e uma má. A força boa havia criado o mundo espiritual, enquanto a má, o mundo material. De acordo com os albigenses, a Terra era um lugar de castigo e o único inferno que existia para a alma humana. Para a Igreja de Roma isto era uma heresia. Entra em cena S. Domingos de Gusmão, fundador da Ordem Dominicana. Como católico que era, S. Domingos opunha-se à heresia e procurava combate-la. Mas um dia, ao visitar França fica profundamente tocado por uma cena a que assiste: partidários da Igreja Católica procuravam converter um homem, à força. Ao regressar ao seu país, Espanha, organiza e prepara um grupo de homens com o objectivo de saírem pelo mundo fora a pregarem e salvarem as almas dos homens perdidos. Este grupo vivia na pobreza, com o mínimo, e procurava combater as falsas doutrinas através dos argumentos e não pelo uso da força. Ficaram assim conhecidos por Ordem dos Pregadores ou Ordem Dominicana.
[uma petite histoire: um dia São Domingos encontra-se em Roma com o Papa Honório III. esse encontro tinha como objectivo levar à legalização da Ordem Dominicana. O Papa empreende então, com São Domingos, uma visita pelos tesouros do Vaticano e durante essa visita guiada cita-lhe o Acto dos Apóstolos, capítulo 3, versículo 6 ("Mas Pedro disse-lhe: «Não tenho ouro nem prata, mas o que tenho, isto te dou: Em nome de Jesus Cristo Nazareno, levanta-te e anda!»"), acrescentando que agora Pedro já não podia dizer que não tinha ouro nem prata, pois a prova que tinha, estava à vista! São Domingos responde-lhe que não, não podia dizer que não tinha ouro nem prata, mas também não podia dizer "levanta-te e anda".]
Falo de São Domingos para introduzir aqui outra pessoa. Sim, São Domingos levava uma vida austera, mas tinha uma natureza gentil e generosa. Numa ocasião vende os seus livros, anotados por si, para ajudar os pobres. Numa outra tenta vender-se para libertar cristãos feitos reféns por muçulmanos. Um dia vê um pedinte e diz-lhe "tu és meu companheiro, deves caminhar comigo. Nenhum poder terreno pode separar-nos." Esse pedinte era São Francisco de Assis. São Francisco era filho de uma família rica, mas preferiu viver na pobreza. Isto para nós pode parecer mais ou menos normal... pensamos só que essas pessoas são hippies... mas numa altura em que a riqueza era sinónimo de proximidade de Deus, negar essa riqueza era revolucionário. Diz a história que São Francisco foi um dia ter com o Papa Inocêncio III, o Papa mais poderoso que alguma vez existiu, solicitando-lhe autorização para fundar uma nova Ordem. O Papa responde-lhe "cheiras como um porco. cheiras tão mal que pareces um porco. vai viver com os porcos". E foi isso que S. Francisco fez. S. Francisco rolou no esterco de uma pocilga e voltou à presença do Papa dizendo: "Santo Padre, fiz o que pediu. Agora atenda o meu pedido". O Papa, tocado por aquele acto, concede-lhe autorização para criar uma Ordem religiosa.
Ao contrário dos monges que os precederam, os franciscanos e os dominicanos levam a palavra de Deus directamente às pessoas e não as recriminam pelo seu estado de pobreza. Aliás, louvam-no. Até as mulheres, tão reprimidas quando a Igreja adquire a mesma estrutura das instituições políticas, descobrem novas formas de expressar a sua Fé. Entre elas formam-se grupos tão informais que nem sequer podem ser considerados uma nova Ordem. Às vezes são apenas umas quantas mulheres que partilham casa numa cidade ou vila e dedicam o seu tempo à oração, à devoção e a trabalhos de caridade quando até aí as mulheres podiam apenas servir a Igreja tornando-se freiras ou permanecendo virgens (nas palavras de um dos pais da Igreja - São Jerónimo - só pela virgindade é que as mulheres se tornavam "homens honorários".)
Para a próxima, exploro a questão dos albigenses.
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