- o carteiro -
Van Gogh
Fifteen sunflowers in a vase
1888
National Gallery, Londres
quando a minha idade era outra que não esta a relação verbal que mantinha com o meu pai era tudo menos ortodoxa. isto porque a nossa conversa começava ou terminava em... cócó. Tudo começou quando ele me disse certo dia para acrescentar o que desejasse à lista de compras do supermercado. No fim, depois de acrescentar "esparguete", escrevi "embalagem de cócó fresco para o papá". Já de esparguete no cesto e perante o seguinte item da lista, o meu pai gargalhou enquanto voltava para a caixa e arquitetava uma vingança que se não era deliciosa, era pelo menos mal cheirosa. A partir daí instalou-se entre nós um terrorismo escatológico. Dizia-lhe que o cócó dele era como as farturas: saía em contínuo e depois não passava na sanita. em compensação, os meus cocós eram bonitas alheiras, já plastificados (e por isso não era necessário recorrer ao piaçaba) só faltando mesmo o fio. Sugeria-lhe brócolos e laranjas para alcançar cocós mais perfeitos, com a medida certa e sem "danos colaterais". Pedia-lhe que aguentasse o cocó só mais um bocadinho antes de abrir a portinha. Até que no Natal lhe ofereci um bonito conjunto de piaçaba e suporte para rolos de papel higiénico, naquilo que eu pensava ser aço inoxidável. Enquanto ele desembrulhava o papel do enorme embrulho cantei, ao som de Mr Sandman o seguinte:
Sr Castanho, por favor tente,
fazer cócó antes no Continente
E que cá em casa fica um pivete
não sei nem com Cif de limonete
Sr Castanho, faça um por ano
Caso contrário entope-se o cano
Vai-se o salário em rolhas pró rabo
E fica o cheiro a sopa de nabo
Sr Castanho, coma sabonetes
e limpe o rabo com toalhetes
Passe roll-on na zona anal
Depois hidrate c'o creme Barral
Sr Castanho, faça direito
para cair no buraco estreito
Leve a tesoura, a do jardim
Para depois cortar no fim
Sr Castanho, e pra acabar
É triste eu sei, estava a gostar
Temos pra si esta prendinha
Que vai manter, vai vai manter
vai sempre manter o seu cócó
na linha
Papai gostou do presente. Não sei se por ter visto nele grande utilidade, se por ver reconhecido o direito ao seu próprio piaçaba uma vez que tinha fama de cócós especiais e difíceis, se por simpatia para com os convidados perplexos. O piaçaba foi então instalado na casa de banho e nele, com duas etiquetas TESA o meu pai escreveu: "guardanapos anais" e "escova dos castanhos". Afinal não era de aço inoxidável, mas fica bem com os tons amarelos do azulejo modelo Príncipe de Gales. O modelo não é mesmo Príncipe de Gales, mas lembrei-me que quando ele esteve cá em Portugal disse que as fachadas das casas portuguesas pareciam casas de banho do avesso. E tenho a certeza que se o Príncipe de Gales tivesse passado pela minha casa de banho, sem vestígios do cocó do meu pai, teria ficado bastante impressionado, em parte pela qualidade da nossa verbe. Trato papai por Sr. Castanho e ele, tão lindinho, trata-me por "filha linda", o que prova que fazer cocós bonitos, compensa.
3 Comments:
ana desculpa, mas sem querer apaguei o teu comentário
eh eh eh eh !
beluga,
Texto maravilhoso.
já, que é uma expert talvez me possa ajudar, saberá onde posso comprar cócós a brincar (preciso de oferecer a uma criança, sempre que me vê pergunta pela prenda
cara Alma:
cócós e xixis são comigo! ora bem... acho que encontra cócós a brincar naquelas lojas que vendem adereços para festas de aniversário (chapéus, disfarces, narizes e cabeleiras postiças...). sei que há uma loja dessas no Norteshopping, quase em frente à Fnac (claro, para manter o nível e dar a entender que sou muito culta, tenho de ter uma referência cultural). Também deve haver à venda em lojas com objetos para truques de magia (sim alma, porque o cócó é uma coisa muito séria. só a magia o pode fazer a brincar) ou até, em lojas com adereços para palhaços. Não me pergunte onde, mas sei que há pelo menos uma em Lisboa
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