sexta-feira, janeiro 25, 2008

- o carteiro -


Van Gogh
Fifteen Sunflowers in a Vase
1888
National Gallery, Londres

"Gostava de todas as mulheres com quem estava e não duvidava, agora que se dava ao luxo de poder fazer considerações positivas sobre a sua vida, que iria gostar de todas as futuras pois não ficava com nenhuma que não lhe agradasse sobremaneira. Andava de bem com a vida e com as mulheres há cerca de 5 anos, com relações com elas que duravam entre 7 meses a um ano. Quando ultrapassava os sete meses, era sinal de avançar com o anelzinho que quase todas recusavam por falta de gosto dizendo a saloia deixa “ai amor, não posso aceitar. Deve ter sido muito caro!”. Depois ele insistia, punha-lhes o anel no dedo, dizia: “vê como te fica bem”, “mas não posso. E é muito cedo para isto”


[mas tu achas que eu vou andar a vida toda neste namorico?]

“cedo como? Quando se gosta nunca é cedo.”, “Nisso tens razão. Vamos marcar a data”. Mas nunca chegavam a marcar pois mal elas colocavam o anel no dedo assumiam um poder sobrenatural capaz de destronar a liberdade que ele tanto prezava. Davam-se ares de donas de casa, no dia seguinte levantavam-se da liliputiana cama dele mais cedo e começavam a cheirar os detergentes, prometiam limpezas e uma nova ordem mundial. Quando isso não acontecia, queriam invadir-lhe a vida, espiolhar-lhe o cérebro, andavam sempre por perto com medo de serem esquecidas, faziam-se indispensáveis. Era o poder do anel, encarnação do mal supremo que se manifestava quando elas lá cruzavam os braços a segurar os seios num nó de espartilho, castrador e cego, com o anel sempre na mão que ficava de fora, como um instrumento de tortura na posse do carcereiro.

(in, "O Simétrico")