- o carteiro -
Van Gogh
Fifteen Sunflowers in a vase, 1888
National Gallery, Londres
quando a minha idade era outra que não esta, tive uma paixão platónica pelo Paulo Sousa.
Vamos por partes (e há muitas para dissecar!):
- deveria ter cerca de 16 anos. localizo tudo da minha adolescência nos 16 anos, não sei porquê. Os gregos dizem que é a idade em que a beleza feminina está no auge, mas eu não era nada bonita aos 16. Nem aos 17. nem antes disso. fui sempre normal. Mas sim, teria 16 anos. Foi antes de começar a emagrecer, o que aconteceu a partir dos 17, e por isso é natural que tenha sido entre os 15 e os 16 anos.
- mais platónica não podia ter sido… Platónica e assolapada, embora unilateral como convém às paixões assolapadas.
- O Paulo Sousa era um jogador de futebol, agora treinador de um clube qualquer.
Tudo começou porque a Vera gostava do Capucho, do Sporting. O pai dela comprava os desportivos e a gente lambuzava aquilo de beijos. Depois recortávamos as fotografias e os artigos e guardávamos entre as páginas dos livros de História. Abríamos os livros e discorríamos sobre o futuro: casas com piscina, crianças negras adoptadas e luas-de-mel em Bora Bora (nem sabíamos onde ficava Bora Bora, mas como o Norton de Matos havia casado na praia em Bora Bora, parecia ser uma tendência a seguir.)
Um dia o Paulo Sousa foi jogar para a Juventus, Turim, Itália. Para mim, o outro lado do mundo. Quando é que ele me podia ver? Como poderia a nossa relação arrancar se ele estava tão longe? Ah... as cabras das italianas! As minhas esperanças de me revelar a mulher da vida dele - ele não sabia que eu era, mas eu estava certa ser - ficavam assim muito reduzidas. Eu chorei. Como chorei!... Sou dada a um bom drama: mulher que chora baba e ranho enquanto desce pela parede com o cabelo desgrenhado é a imagem que melhor ilustra um coração despedaçado. Pelo menos nos anos 80. E nos 90 também. E depois, os homens mais velhos... Desde sempre tive tendência para os homens mais velhos. E alguns deles, por mim. Talvez porque me vejam como uma espécie de Lolita que vai fazê-los sentirem-se mais jovens. Para panaceia de crise de meia-idade, sempre fica mais barato que comprar um descapotável. Só que no meu caso a "meia-idade" é sempre uma "idade-inteira" ou noutra versão, uma "idade para ter juízo". Já o meu interesse por eles escapa à minha compreensão: é como um crime que se repete sempre da mesma forma. Pecado com castigo, mas sem lição.
Bom, um dia disseram-me que o Paulo Sousa - que era de Viseu - tinha casa de família "naquela saída depois do cruzamento, assim-assim e assado". Obviamente, a família dele era, seria, a minha família e por isso tinha de ir lá ver como era, se me agradava, se no futuro mandaria arrancar aqueles anões de barro do jardim, mais a charrua enferrujada com uma samambaia a pender do pseudo cesto, ou arrancar as correntes à lá Alpes suíços. Da casa não vi grande coisa: havia um gradeamento branco, alto e cerrado que não permitia vislumbrar nem a samambaia. Mas eu vaticinei que ele iria ser meu. O problema era a distância. E as italianas. E a minha falta de sorte crónica. Obrigada pelas circunstâncias a seguir em frente, curei as mágoas ao som de Led Zeppelin. Os livros ficaram obsoletos no ano seguinte, seguiram-se outros destinos para luas-de-mel, a Vera mudou de turma, acabaram-se as boas-novas do futebol. Surgiram paixões platónicas em latitudes mais propícias, mas todas tão distantes como Turim está, ou mais até. Entra-se no circuito de vários Humberts Humbert, faz-se de Dolores,... mas Turim continua a ser o outro lado do mundo.
7 Comments:
É dotadíssima mas isto é inverosímel
Mil perdões pelo erro ortográfico: inverosímil.
Pois..., porém verdadeiro. E com testemunhas.
Muito bom, e não está sozinha, Beluga. Diria que é algo natural. Alguns de nós realmente passaram por lá, pela paixão platónica. Outros talvez não, ou simplesmente não se lembrem.
Ao ler este post veio-me à memória a minha professora de Inglês do 6º ano. Culta, pois falava inglês; sofisticada, pois foi a 1ª mulher que vi a usar óculos de sol; e bonita, estilo Charlie's Angels, a cara chapada da Jaclyn Smith. Certa vez, numa aula de desenho em que podíamos escolher um tema no exterior do edifício, optei por ir a correr ao estacionamento da escola desenhar o seu magnífico Renault 5 creme. Enfim... Acho que não fui tão stalker como a Beluga, mas ainda hoje me lembro do raio da matrícula do carro. :-D
Estas coisas são engraçadas… Há pessoas que passam pela nossa vida e nem sabem o impacto que têm nela. (o contrário também se aplica, é verdade)
Também tive uma paixão por um professor que era fisicamente parecido com o Siza Vieira e contei-lhe que tinha uma grande paixoneta por ele, já no fim do semestre (estava na faculdade). Ele olhou para mim e disse-me:
- "isso deixa-me…"
- "de ego cheio?", respondi eu
- "preocupado", disse ele
- "não fique. eu tenho papá e mamã. e como anorética em recuperação, o SNS providencia-me um médico caso eu me vá abaixo." (porque o ataque é a melhor defesa)
Quase 20 anos depois vi-o na rua, mas ele não me reconheceu.
um presente:
https://www.refinery29.com/en-us/you-can-now-ogle-farrah-fawcetts-iconic-red-swimsuit-at-the-smithsonian
Ehehe... Obrigado, Beluga. Realmente, um dos pontos na minha bucket list é visitar o Smithsonian. Ficarei atento à localização do item indicado. ;-)
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