- ars longa, vita brevis -
hipócrates
antes de depois ou como não sabia nada de Francis Bacon. É verdade. Não fosse esta exposição e nem sequer sabia que o homem não teve uma vida fácil. Daquilo que sei, e que é pouco, Francis Bacon cedo foi expulso de casa pelo pai, quando este o apanhou a experimentar roupa interior da mãe (da Srª. Bacon que devia ser perigosa para o colesterol – eu sei, esta foi terrível). Ora quando foi expulso o rapaz com 16 ou 17 anos foi viver para um cubículo que pagava com a ajuda da mãe que à socapa do pai lhe enviava dinheiro. Conheceu e viveu com o seu primeiro amante e este – o ingrato – passado algum tempo trocou-o por uma mulher. Ah pois é!. Depois andou por aí, por Berlim e por Paris onde entrou em contacto com a obra de Picasso. Era aliás muito influenciado pela pintura de Picasso e pela de Velazquez. Como é sabido, Francis Bacon pintou um antes e depois baseado no retrato do Papa Inocêncio, que tinha sido anteriormente pintado, em pose semelhante, mas com a boca fechada, por Velazquez. As influências de Bacon podem ser vistas na sua obra: gosto pelo visceral, pelo belo-feio (aquilo que não consideramos propriamente belo, que ninguém considera belo, mas que não deixa de nos atrair)… A obra de Bacon é como um Tsunami: não é bonito de ver, mas ninguém resiste. Notamos também a presença constante das cordas e claro, das bocarras abertas, sempre em agonia, mais do que em revolta. No retrato do Papa, por exemplo, este parece estar sentado com os punhos presos à cadeira (a mim lembra-me uma cadeira eléctrica, embora nunca tenha visto nenhuma ao vivo) e além disso rodeado por uma fita vermelha que o prende ainda mais. A boca abre-se num grito surdo, mas perturbador (Chica, pareço a Margarida Rebelo Pinto!) porque sabe-se que é um grito. Como é que se sabe que é um grito? Pois então aqui fica uma curiosidade: Bacon adorava fluidos corporais e um dos seus filmes preferidos era “O Couraçado de Potemkin”. Nele podemos ver a cena em que a senhora é alvejada e fica a gritar com a boca aberta, num pequeno instante imortalizado, instante esse que leva da entrada da bala até à morte da senhora. A imagem é esta:
Eisenstein
O Couraçado de Potemkin
1925
Podemos ver como este grito apareceu tantas vezes nas suas obras. Mas era também um devoto da fotografia pois segundo ele era melhor que o retrato e a convivência com o modelo. Bacon acreditava que a fotografia; ou melhor, as fotografias captavam várias perspectivas interiores porque eram imateriais. Já o sujeito modelo escudava-se no próprio corpo com o propósito de não se revelar. Nisso penso que ele tem muito em comum com Picasso, pois tal como o pintor espanhol Bacon procurava várias perspectivas numa só superfície. A diferença é que estas perspectivas eram interiores.Vemos o antes, uma fotografia do próprio bacon junto a dois pedaços de um animal retalhado e esfolado, imagem esta que só por si se aproxima muito do boi esquartejado pintado por Rembrandt. Depois da fotografia bacon pintou o quadro. E não me sai da cabeça aquela cena do “Mercador de Veneza” do Shakespeare (Shakes para os amigos) em que o mercador hipoteca meio quilo da sua carne ao judeu veneziano:
Francis Bacon
Figure with meat
1954
The Art Institute of Chicago
4 Comments:
Puxa!
admirável!
gostei muito desta posta
vi um bacon (o quadro, não o pedaço) numa exposição colectiva no CCB e foi das experiências mais intensas (desculpe a vulgaridade da linguagem) da minha vida
quando o CCB "passava" pintura, claro
Cara Alma:
olá. desculpe a ausência. obrigada pelo comentário. Envio-lhe um mail para lhe dar conta da continuidade da minha disponibilidade de vontade para mais um serão "coltural", se o convite ainda estiver de pé.
Caro AM:
As expressões vulgares só o são quando as pessoas são vulgares, o que não é o caso. Claro que esta frase, escrita assim também é muito vulgar, porque parece lei, o que em Portugal é muito... vulgar. Não fui ver Bacon. Aliás, acho que o trabalho corrompe as pessoas e afasta-as do seu verdadeiro caminho.
Caro João Barbosa:
Ainda bem que foi do seu agrado.
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