terça-feira, abril 20, 2010

- ars longa, vita brevis -
hipócrates

Talvez não devesse falar disto enquanto a peça está em cena, mas a altura é esta; ou seja, a falar que seja agora e não quando Antígona já não subir ao palco do TNSJ. Talvez também não devesse falar disto com a minha experiência de "apenas espectadora", mas é uma opinião e não é filiada.

Nuno Carinhas encenou o texto de Sófocles, uma tragédia grega cuja qualidade a minha tenra idade e parca experiência não podem colocar em causa. Há no entanto que acrescentar que não obstante a riqueza do texto, um clássico que conta a morte de Antígona às mãos das leis injustas feitas por uma sociedade patriarcal, morte essa que originou a queda da casa de Creonte, a encenação e a representação desta Antígona não podia receber, da minha parte (que não conta para nada, bem sei) nota mais negativa.

Logo nos instantes iniciais o espectador apercebe-se que tudo, ou muito do importante acontece no lado direito do palco (direito para a audiência), o que é, e foi uma pena para quem como eu está mais para petinga do que para carapau graúdo. Junta-se a isto a forma como o texto é dito, ou para fazer justiça a tantas peças de teatro, a forma como o texto é debitado. As frases são disparadas e automáticas, expelidas todas com o mesmo tom como se o facto de estarem inseridas numa tragédia grega não permitisse a interpretação ou variação tonal. A dicção dos actores é perfeita, mas isto de pouco serve quando as frases são ditas sem expressão, sem sentimento; os movimentos corporais presos ou quando soltos, suspensos num exagero à la mode. A interpretação das personagens é pouco credível: é impossível acreditar no amor entre Antígona e Hemon e, não fosse um bom Creonte e ninguém poderia salvar a peça. Bom Tirésias devo acrescentar que com os espasmos próprios de adivinho cria a excepção que no fundo deveria pautar a peça para que as diferentes personagens não agissem tanto como iguais. Má Antígona que estagiou durante toda a peça e que mostrou ter ganas de, a qualquer instante, levar a mão à testa num gesto típico. Muito triste a visão de Eurídice, mãe de Hemon e esposa de Creonte mesmo no final. Uma aparição rápida, mas que não passou, pelo menos a mim, despercebida. Seria mesmo necessário fazer a actriz deslocar-se nuns sapatos de cerca de 10 a 20 cm de plataforma, mal disfarçados pelo andar e pelas vestes? Cenografia já vista em D. João de Juan Molina, com o mesmo tipo de abertura e do mesmo lado do palco. E desculpem dizer, mas aquele calçado de Isménia não lembra a ninguém.

Por fim, a banalização do aplauso de pé. Não sei se é apanágio do público português, mas a ovação dedica-se ao "excepcional" que é diferente do "bom" ou do "bonzinho". O facto de nos entreter não me parece motivo para aplaudir de pé, ainda por cima se entre entrada e saída do palco, o grupo de actores agradecido não deixe passar o último deles para agradecer novamente em palco. [esta última parte é só mesmo porque eu sou um bocadinho exigente. eh pá, mas o blog é meu]

4 Comments:

Blogger João Barbosa said...

em absoluto de acordo, actualmente um aplauso de pé é tão banal que está esvaziado o seu significado.

20/4/10 1:12 da manhã  
Blogger AM said...

fez muito bem em falar
o teatro é uma arte anacrónica, não é?

20/4/10 10:50 da tarde  
Blogger Belogue said...

Caro João Barbosa:
ainda bem que concorda porque às vezes penso que sou eu que sou picuinhas. De facto não me custa nada levantar e bater palmas, mas o espectáculo não me arrebatou, não posso fazer isso. A crítica para os actores não pode vir apenas das revistas e dos jornais, tem de vir do público também. E o público tem de ser exigente. Não pode esperar passar apenas um bom bocado sem pensar na vidinha.

Caro AM:
a condição do artista é anacrónica: como o reconhecimento é na hora, o público sente obrigação de mostrar esse reconhecimento. No cinema é diferente. Acho que se criou um compromisso: o artista de teatro que tem um estatuto superior ao de televisão sente merecer da parte do público um reconhecimento maior. E o público sente-se na obrigação de reconhecer o trabalho sendo que às vezes o trabalho nem é assim tão bom. Pelo menos neste caso o resultado final foi um produto mau. Lá porque dá trabalho, há pouco público e não há apoios, não quer dizer que tenhamos de ser condescendentes.

21/4/10 11:41 da tarde  
Blogger alma said...

Beluga,
100% de acordo!

23/4/10 12:38 da manhã  

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