terça-feira, setembro 26, 2017

- o carteiro -
 
dizem que por trás de um grande homem há sempre uma grande mulher. eu acrescento, porque serve o propósito deste post, que por cima de uma dessas grandes mulheres que está atrás de um desses grandes homens, está sempre um vestido irrepreensível. Já sei que estão a pensar: "mas que fútil que ela é!". Pois sou. Mas mesmo assim resolvi-me a escrever sobre a diplomacia e o vestir. Porque a roupa fala e não é ouvida somente por quem se move no meio da moda. E porque mesmo quem tenta tapar os ouvidos, não fecha os olhos.
 
Um dos melhores exemplos de como uma peça de roupa pode aproximar culturas diferentes e elevar a outro patamar os seus intervenientes, é o vestido às bolas que a ida Princesa Diana usou na viagem oficial ao Japão em 1986. Vocês podem pensar que o vestido não tem nada de especial, mas posso dizer-vos que tem. Não estava incluído na lista de indumentárias que a princesa iria usar nessa visita oficial, mas foi adquirido antes mesmo da viagem e foi de facto uma escolha inteligente já que as bolas vermelhas sobre fundo branco, mimetizam a bandeira do Japão. É uma homenagem ao país, à sua cultura e como que um sinal de abertura do Ocidente ao Oriente. Não que o Oriente se preocupasse com isso, mas o vestido mostra uma preocupação em agradar, em integrar, o que nunca foi apanágio da Grã Bretanha.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Outros momentos que revelam a inteligência na escolha do que vestir, foram as visitas oficiais realizadas a países islâmicos como o Egipto e o Paquistão. Tanto nunca caso como no outro a princesa vestiu trajes em tons de verde. Para nós pode não significar nada, mas para o Islão o verde é a cor do profeta, ou pelo menos do seu turbante. E quais as cores da bandeira do Paquistão? Verde e branco. Ora nem de propósito, verde a branco eram as cores da bandeira do Egipto entre 1922 e 1958, sendo que em ambas está presente o crescente e as estrelas, símbolo que para os muçulmanos equivale à cruz nas suas diversas formas, usada na linguagem pictórica do Ocidente.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Paquistão, 1996
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Egipto, 1992
 

 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A roupa passa mensagens, comunica quando as palavras não o podem fazer ou não são suficientes. Um vestido preto num funeral, fala de luto, de dor e de tudo aquilo que as palavras, nestas ocasiões, não conseguem dizer. (Se for numa festa - com um simples vestido preto em nunca me comprometo - assegura uma noite sem vergonha nem tendência para o ridículo. Como diria uma personagem de um livro: é bonito e não ofende). Não terá sido por isso de estranhar que quando, no final do ano passado, Hillary Clinton se dirigiu aos apoiantes após a sua derrota, vestiu um dos seus tradicionais fatos (calças e casaco) em tons roxo e preto, que, mais do que as cores do luto, são as cores de uma união que deve ter sido um sapo difícil de engolir para os democratas. Nessa mesma ocasião, o antigo presidente Bill Clinton apresentou-se com uma gravata roxa sobre fato preto. Há quem diga que o roxo fala de união, enquanto preto fala de dor. Temos de voltar um pouco mais atrás para compreender esta ideia de união. Nos seus três debates televisivos com Trump, Hillary vestiu o mesmo modelo de fato (calças e casaco) em três cores: no primeiro debate vestiu vermelho, no segundo, optou pelo azul escuro e no terceiro o tom foi o branco. Foi dito na altura que Hillary usava o branco em homenagem às sufragistas, que escolheram essa cor para o seu movimento. As outras duas cores, azul e vermelho, representam os dois partidos americanos: vermelho para os republicanos e azul para os democratas. Ora o roxo é não mais que a mistura dessas duas cores e de facto, no seu discurso, a candidata derrotada falou de união:
 
"We have seen that our nation is more deeply divided than we thought…But I still believe in America, and I always will. And if you do, then we must accept this result and then look to the future."
























Quando mostramos preocupação com a roupa, com o vestir - e ainda mais porque falamos de sapatos há pouco tempo - as pessoas tratam-nos por vezes de forma condescendente como se o vestuário e a preocupação com ele devesse ser somente ao nível das satisfação das necessidades básicas (estar quente, estar coberto) e tudo o resto fosse uma futilidade. Pode até ser e os exemplos que trago em seguida mostram o vestuário mais como forma de diversão, do que de comunicação ou interação a um nível tão elevado quanto o uso do verde no Paquistão. Em dois momentos diferentes, as mulheres da família real monegasca mostraram saber vestir com inteligência, humor e, mais importante de tudo (e certamente uma das regras de bem vestir), de acordo com a ocasião. Eis pois a Princesa Charlotte do Mónaco na inauguração de um Clube de Vela em Monte Carlo a usar um vestido com um estampado de guarda sóis abertos e outros fechados e a Princesa Charlene a usar, aquando de uma das edições do Grande Prémio de Monte Carlo, um vestido com um estampado que imita o rasto deixado por um carro em alta velocidade (vêem o carro de corrida a azul/verde do lado direito?). Não sei se isto é diplomacia, mas é sem dúvida divertimento, o que de resto corrobora a ideia subjacente a algumas destas pequenas monarquias: são decorativas. E não há mal nisso. Antes decorativas que aborrecidas.


 

2 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Cara Beluga. É por isto que vale a pena visitar o seu blog.A arte é um assunto muitíssimo importante. Muitos deuses já näo andariam por cá se não tivessem tido pintores,escultores e arquitectos a cuidar da sua sacralidade. Ocorreu-me isto a propósito da bandeira do Egipto que mostra neste post e da sua semelhança com a bandeira do meu país, a República Popular da China. De repente a arte mostra o que é realmente importante. Quem pensa que a China milenar morreu, só tem que olhar para a bandeira da RPC.Não era possível ser mais óbvio. Parece-me que também não se podia ser mais óbvio do que na bandeira do Egipto. Quando o carácter destes povos milenares se formou a astronomia era uma coisa viva,de todos os dias. Um calendário lunar ou solar fazia toda a diferença e moldava um povo diferente.
A Princesa Diana tinha o tipo de beef a que nada ficava bem. Uma concepção enjoativa do belo que fica clara no vestido para o Japão:Sol nascente,logo bolas vermelhas.

Guo Xi, um seu humilde leitor

29/9/17 4:48 da manhã  
Anonymous Anónimo said...

Então? Nenhum comentário ao meu comentário, em defesa
do bom gosto da princesa Diana? Sabe, não há dúvidas que vc. tem conhecimentos mas falta-lhe sabedoria. A arte para si ainda é uma excitação que causa rubores. Como sabe que já não tem idade para isso disfarça-os como editora da faces, uma revista de bom gosto. Já percebi porque é que não consigo aturá-la muito tempo. Falar de assuntos sérios sempre com ligeireza.. O comentário sobre o lábio dos Habsburgos a propósito do Velazquez deixou-me de rastos. Faça o que tem a fazer mas faça-o mesmo com muito bom gosto.
Ora a ver se não me engano.... o meu nick é Guo....

30/9/17 4:03 da manhã  

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