sábado, janeiro 18, 2014

- o carteiro -

olá. escrevo-vos nos primeiros 18 minutos do dia 3 de Janeiro. Não sei quando é que vou postar porque de cada vez que fico sem escrever no blog, custa sempre muito a retomar e o grau de exigência que tenho para comigo, aumenta. apesar de não me faltar nada, acho que a minha vida vai uma grande confusão, razão pela qual não tenho postado e posto assim este post meio desgarrado. ora acontece que um dia destes fiquei a conhecer algumas obras de arquitectura/escultura que me entusiasmaram. são monumentos públicos semelhantes aos monumentos de celebração de uma batalha, de um feito histórico... aparentemente semelhantes aos que temos nas nossas rotundas (nas nossas muitas rotundas) ou num jardim. Mas só aparentemente. esses monumentos são geralmente figurativos, naturalistas, tradicionais, feitos de mármore ou pedra, alguns de metal...mas estes que vos vou apresentar, são mais do que isso. são até mesmo mais do que os novos monumentos não figurativos e muito polémicos por causa do gosto duvidoso, dos milhares empregues, da proveniência das verbas, etc. o que me interessa aqui é mesmo a questão do gosto. um dos monumentos que vos apresento e que supera as questões do gosto é este de Misha Ullman. Chama-se Bibliotek, foi inaugurado em 1945 na August-Bebel-Platz em Berlim, praça esta onde em 1933 se iniciou a queima de livros por parte das forças nazis. O autor concebeu uma biblioteca invertida, um anti monumento onde já não se pode circular, uma biblioteca invisível como aquilo que aconteceu na segunda guerra mundial: nós sabemos que está lá e vai estar sempre lá mesmo que já não se veja.












O outro caso que queria mostrar-vos - e que é talvez o meu preferido - é o da fonte do Memorial a Aschrottbrunnen em Kassel. sei que fonte, em alemão é brunnen e que portanto esta é a fonte de Aschrott, judeu que encomendou a fonte no início do século XX. a fonte foi de facto construída, mas destruída em 39 pelo partido nazi. parece igual ao monumento anterior, e até tem a mesma ideia subjacente, só que aqui o que acontece é que se sugere o vazio, enquanto no caso anterior a biblioteca existe, mas não está acessível. tal como a fonte verdadeira tinha água, esta também tinha, mas em vez de jorrar para fora, a água jorrava para dentro da própria fonte numa imagem lindíssima (eu às vezes gosto de usar os absolutos sintéticos) que depois, talvez por questões de segurança, taparam. eu acho mal, mas o que eu acho não importa.























o terceiro caso não é muito diferente dos anteriores. o que talvez me impressionou nesta recolha foi o facto de quase todos se desenvolverem debaixo da terra quebrado totalmente a ideia que temos de monumento como algo que se posiciona no espaço; ou melhor, algo que se impõe no espaço, que altera o nosso percurso, que cria tensão com o olhar, que é estranho ao resto porque se eleva face ao resto. geralmente um monumento é isto: em plinto ou sem plinto, um monumento faz isto. Mas e se fossemos a passar e o monumento estivesse debaixo dos nossos pés. não sei, isto traz-me à boca um sabor geológico, arqueológico até. o terceiro monumento começa, como os normais monumentos, a colocar-se no nosso percurso, a fazer-nos interrogar: temos de contorná-lo, temos de olhá-lo... mas depois vai desaparecendo sob os nossos pés. Trata-se do Monument against fascism, de Esther Shalev-Gerz & Jochen Gerz, de 1986, uma coluna de metal de secção quadrada de 12 metros de comprimento. os habitantes da cidade de Hamburgo eram convidados a deixar a sua assinatura contra o fascismo na coluna. os mais baixos assinavam em baixo, os mais altos em cima, mas logo deixou de existir espaço para assinar abaixo dos quê... 2 metros (na hipótese mais exigente, a altura máxima de uma pessoa). sendo assim, essa parte do monumento que já estava preenchida com assinaturas foi rebaixada e durante 10 anos, mais ou menos, o monumento baixou 8 vezes, tendo ficado, em 93 completamente enterrado. e eu achei bonito.































a última vocês devem conhecer. é do pedro cabrita reis e está nos jardins da gulbenkian. um dos meus sonhos é trabalhar no museu de orsay. o outro é trabalhar na gulbenkian. "o que é que isto tem de especial", perguntam vocês. para vocês que passam lá todos os dias, nada. para mim que só vou lá quando o rei faz anos, tem muito. aquilo é um monumento que parece uma casa. uma casa tem paredes, tem porta, janelas... mas aquela casa não tem nada disso. aliás, esta casa é tão curiosa que apesar de ter escadas, não há possibilidade de subi-las.

















8 Comments:

Anonymous alma said...

Interessante post .
Incrível, no outro dia passei no jardim da CG e não reparei nesse mausoléu do P.C.R .
.
Ha já algum tempo que noto a CG descuidada ,
Precisavam com toda a certeza de alguém com o seu rigor ,

18/1/14 10:30 da manhã  
Anonymous ana said...

adorei.

18/1/14 6:02 da tarde  
Blogger Belogue said...

olá alma:
há muito tempo que não falávamos, não é? culpa minha, eu sei.
alma, eu até já aceitava ir para o museu das aparições em fátima...

19/1/14 1:22 da manhã  
Blogger Belogue said...

oi anita:
havia mais, mas não os achei tão bons. o meu preferido é o da fonte invertida. sem o vidro por cima. e o teu?

19/1/14 1:23 da manhã  
Blogger Tânia Cadima said...

Belo post. ;)

31/1/14 11:05 da manhã  
Blogger Belogue said...

Olá Tânia:
Obrigada, faz-se o que se pode. E mesmo assim, tem dias

1/2/14 4:04 da tarde  
Anonymous pedro bessa said...

olá Ju,
Há algum tempo que não venho ao teu blog e, quando venho, nunca escrevo comentários (mas costumo passar por cá com alguma frequência). Achei o post muito interessante. Há uma “gralha” na data da Bibliotek que foi inaugurada em 1995 (e não 1945, claro). Lembrei-me também de um outro exemplo de “anti-monumento - embora desta vez não fique na Europa – mas que tu com certeza já conheces: o Vietnam Veterans Memorial (1982), em Washington D.C., da arquitecta norte-americana Mayan Lin.
De certa forma também é um monumento “enterrado”, desta vez dentro de uma colina. (Na verdade, o nome correcto da obra é “Wall Memorial”, já que por imposição de sectores mais conservadores, dois grupos de estátuas foram depois acrescentados ao conjunto– embora a alguma distância do muro original).

beijos, pedro bessa

2/2/14 11:43 da manhã  
Blogger Belogue said...

Olá professor, tudo bem? Mil desculpas por não ter respondido antes, mas não vi o comentário. Para além disso ando com muito trabalho (e metida em algumas confusões).
Sabe que tem toda a razão quanto ao Wall Memorial, mas apesar de fazer parte do leque, achei que não era um monumento tão rico quanto os outros; achei que não surpreendia tanto.
bem, vou dormir. esteja à vontade para comentar. posso demorar a responder, mas geralmente respondo. Um abraço e até um destes dias.

28/2/14 1:33 da manhã  

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