sexta-feira, novembro 23, 2012

- ars longa, vita brevis-
hipócrates


antes e depois ou como já não há nada para inventar. estava aqui a ver uns frescos para Santa Maria Novella, do Alberti, quando descobri esta Verónica (aquela que deu a Jesus, quando este estava a caminho do calvário, um pano para ele limpar o rosto. o rosto dele ficou impresso no pano. talvez por isso - acho que já disse isto aqui - Verónica quer dizer "vero ícone", a verdadeira imagem. E santa Verónica é a padroeira dos fotógrafos). o que me chamou a atenção na Verónica foi a posição dela, de joelhos, mas com as pernas afastadas. não está portanto a rezar, mas antes em equilíbrio, como se estivesse a levantar-se, mas também a mostrar ao pessoal (desculpem, é uma maneira de dizer) a imagem de Cristo no pano. Não sei... ela podia fazer isto com o pano frente ao corpo, mas deslocá-lo para o lado como se estivesse a dizer "vejam o que aconteceu", parece ter muito mais impacto. Não tive estas considerações no momento. No momento lembrei-me apenas, como se tivesse acendido um fusível aqui dentro da minha área relacional (é o nome que dou a esta parte do cérebro que estabelece relações entre as coisas, só de olhar. tenho a certeza que tem um nome esquisito, mas por agora, fica assim), lembrei-me então e apenas que esta posição, já eu a tinha visto numa outra pintura. O meu palpite ía para uma cena de Millet com uma camponesa a peneirar cereais. Millet!!! Bem revirei a obra dele de alto a baixo e nada. Então pensei: "pode não ser o Millet, mas é parecido e é um realista". Realistas, realistas... Só me lembrava do Daumier, mas era um realista menos sarcástico. Foi então que cheguei ao Courbet que apesar de ser um realista tem uma obras a puxar para o sentimento: umas banhistas que parecem Vénus, uns retratos idealizados. Mas de facto, a presença na obra dele de vulvas abertas (pelo menos duas, se bem me lembro), se não o tornam um realista, tornam-no quase um ginecologista. Ou um Larry Flint!

Bem, na obra de Courbet que aparece aqui, as raparigas são irmãs do pintor (Zoe e Juliette) e o rapaz é filho dele, Désiré Binet. Uma das raparigas, a que se encontra de costas para nós está exactamente na mesma posição que a Verónica de Pontormo. E apesar de estar de costas, não consigo retirar nada a esta relação pois a posição em que ambas se encontram é rara. Por isso as relaciono. A de Pontormo vibrante e maneirista, a de Courbet trabalhadora e anónima. bem, e foi isto. rendinhas e coisas bonitas.




















Pontormo
Veronica
1515
Santa Maria Novella















Gustave Courbet
The Winnowers
1855
Musée des Beaux-Arts, França

5 Comments:

Blogger AM said...

muito bem (smile xl)

27/11/12 8:25 da tarde  
Blogger Belogue said...

sabe antónio, eu também senti isso, senti que tinha descoberto uma coisa e tanto. claro que isto não é nada de especial, mas sinto uma espécie de alegria quando descubro estas coisas.

28/11/12 12:49 da manhã  
Blogger AM said...

é sim, é uma coisa muito especial
partilho inteiramente da plenitude da alegria dessas nossas "descobertas"
eu fiquei louco d'alegria ao "reconhecer" no pórtico do crematório do Asplund a "influência" da "Flagelação de Cristo" do Pierro della Francesca (e até, em tempo, postei, mal, sobre isso)

28/11/12 8:57 da tarde  
Blogger Belogue said...

Caro António:
não conhecia, mas assim que vi as imagens no google confirmei essa sua ideia. tem muito daquela estrutura arquitetónica do piero della francesca, que coloca em primeiro plano um grupo a conversar e depois lá atrás cristo a ser flagelado como se não fosse nada com ele.

28/11/12 10:48 da tarde  
Blogger AM said...

foi um dia engraçado (a posta é que está uma porcaria):

http://odesproposito.blogspot.pt/2006/02/f-c-uma-ideia-original-ou-no-estou.html

29/11/12 6:47 da tarde  

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