segunda-feira, outubro 16, 2006

- mãe, a maçã tem bicho -
Under construction ou Políticas ao alcance de apenas alguns

É sabido que os museus do nosso país de uma intervenção cuja filosofia "procura-se suster e corrigir o envelhecimento dos edifícios, dotando-os de equipamentos e espaços adequados às suas actuais exigências funcionais, melhorar as condições de conservação e exposição das colecções, bem como as condições de visita e fruição para todos os seus utentes, sobretudo para os visitantes." É também sabido que projectos como estes envolvem muitas instituições e que nada pode – deve – ser deixado ao acaso; ou seja, que todas as possibilidades, todos os imprevistos devem ser previstos. Um dos casos em que as coisas correram menos bem foi o do Museu Nacional Soares do Reis, no Porto, com perda de visitantes, tricas entre gente que se devia dar ao respeito e uma desvalorização do espaço que se tenta colmatar com alguma, e desnecessária, agressividade.

Já tinha falado aqui, ou na Formiga Bargante, não me recordo bem que alguns desses projectos levantam muitas dúvidas até para uma pessoa que como eu quase não sabe distinguir as vogais das consoantes. Lembro-me de ter falado o quanto me parecia estranha a política de revalorização do Museu de Conímbriga, mas como não sou expert, as minhas dúvidas acerca da reversibilidade das intervenções e do uso que o espaço iria ter, ficam comigo.

Foi porém com algum espanto que aqui no Belogue nos chegaram informações acerca de um outro caso também passado neste rectângulo de cultura para “pecebe?”, e que dava conta de como um mau projecto arquitectónico pode arrasar não só o que já existe, como o que está para vir. Algures neste país, atrás de uns taipais muito bem escondido e enquanto se faziam as escavações para fundações de um novo edifício de apoio ao museu já existente e previsto no projecto arquitectónico, foram encontrados vestígios arqueológicos. Com certeza o leitor esperava que a frase ficasse rematada por “vestígios arqueológicos de importância”. É com pena que não podemos afirmar tal coisa uma vez que as instituições que estão responsáveis pelo projecto (o edifício onde se encontra o museu é da responsabilidade do IPAAR, a obra é da responsabilidade do Instituto Português de Museus, e as escavações arqueológicas, do IPA), nunca elaboraram o indispensável relatório onde a importância ou não do achado fosse descrita. Ora, como estas três entidades à qual juntamos o museu que aparece aqui como uma criança que espera que os adultos decidam o presente a dar nesse natal, nunca falavam directamente umas com as outras, excepto em reuniões pontuais, e tendo o responsável pelo museu mostrado não ver interesse em preservar as ruínas encontradas, IPA, IPAAR, IPM e Museu decidiram pôr um ponto final no processo de escavações e arrasar o já encontrado. Até aqui, mal, mas não muito mal, uma vez que nem toda a pedra que se encontra debaixo de terra é digna de referência. Mas o mau mesmo é quando se toma uma decisão destas sem ter sido elaborado um relatório acerca do valor do encontrado, quando todo o processo é escondido da comunicação social e dos trabalhadores do museu, quando, depois de vários avisos acerca da possibilidade de aparecimento de vestígios arqueológicos na zona em questão, o arquitecto – de renome – responsável pelo projecto ignora a história do edifício e prossegue com o mesmo. Mau é também ter uma lei dúbia que diz que apenas devem ser preservados vestígios que se prove serem de interesse nacional, sendo certo de antemão que o que é para uns de interesse nacional, não é para outros. Para estas quatro instituições (IPM, IPA, IPAAR e Museu), importante é não atrasar a obra – que se não for concluída no prazo previsto perde os benefícios de um financiamento europeu -, é importante que o nome dos responsáveis de agora fique ligado ao futuro museu e é importante que ninguém saiba. Segundo a lei, a única coisa que poderia salvar os achados arqueológicos (aqui para nós que ninguém nos leia, de reposicionamento da história do museu, de abertura de portas a nível de turismo, de mais valia para a cidade) era um cadáver. Sim, o aparecimento de um esqueleto no meio dos achados é forma segura de impedir que os lobos famintos por mais 3 minutinhos de glória do que o comum mortal levem a sua avante.
Não há esqueletozinho, não há culturazinha.

2 Comments:

Anonymous Anónimo said...

e se nos juntássemos e tratássemos disso? que dizes? ;)

16/10/06 12:17 da tarde  
Anonymous Anónimo said...

Português, com orgulho, mas em questões de cultura, cada vez gosto mais de Espanha. Não destróiem aquilo que deve ser e é preservado.

16/10/06 7:31 da tarde  

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